Estabilidade e garantias de emprego. indenizações rescisórias ? fgts

AutorMauricio Godinho Delgado
Páginas1507-1555
CAPÍTULO XXXII
ESTABILIDADE E GARANTIAS DE EMPREGO.
INDENIZAÇÕES RESCISÓRIAS — FGTS
I. INTRODUÇÃO
O presente capítulo examinará quatro institutos importantes do Direito
do Trabalho, todos inter-relacionados ao contexto do término do contrato
empregatício.
Há, de um lado, as estabilidades no emprego, cujo mais tradicional
exemplo surgiu nos primórdios da legislação trabalhista no Brasil, ainda
antes de 1930, incorporando-se, em 1943, à Consolidação das Leis do
Trabalho: era a estabilidade adquirida pelo obreiro aos 10 anos de serviço
para o respectivo empregador.
Com a revogação (não recepção) da estabilidade celetista pela Cons-
tituição de 1988, esta despontou responsável pelo estabelecimento de dois
outros importantes exemplos de estabilidade empregatícias no Direito brasi-
leiro: a do art. 19 do ADCT constitucional e a do art. 41 da Constituição.
Neste capítulo será feito o exame também das possibilidades e limites
para a concessão de estabilidades pelo regulamento da própria entidade
empregadora.
De outro lado, há as garantias provisórias de emprego, também cha-
madas estabilidades provisórias ou temporárias. Tais situações especiais
advêm do período anterior à nova Constituição, embora tenham ganhado
maior relevância e diversi cação após seu advento.
O terceiro instituto importante relacionado ao contexto do término do
contrato empregatício são as indenizações por tempo de serviço e demais
indenizações rescisórias.
A mais tradicional de tais guras é a indenização por tempo de serviço,
prevista no antigo texto da CLT: própria aos contratos de duração indeterminada
de mais de um ano de duração, calculada à base de um mês remuneratório
por ano ou fração igual ou superior a seis meses, era paga nas rupturas
que não resultassem de motivos provocados pelo próprio trabalhador. Se o
empregado alcançasse dez anos de serviço, sua proteção jurídica passava
a ser qualitativamente maior, uma vez que conquistava a estabilidade no
emprego, segundo a Consolidação. Contudo, também esta indenização
celetista foi revogada (não recepcionada) pela Constituição de 1988.
1508 M樋弼膝眉備眉疋 G疋尾眉匹琵疋 D微柊毘樋尾疋
Existem, porém, outras indenizações rescisórias a serem examinadas
no Direito do Trabalho brasileiro. Embora sem a magnitude da antiga indeni-
zação celetista, cumprem papel ainda signi cativo nas situações de término
do contrato de trabalho.
Há, por m, o instituto do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.
Criado pela Lei n. 5.107, de 1966, e hoje regulado pela Lei n. 8.036, de
1990, a gura, de certo modo, poderia também ser enquadrada no grupo das
indenizações por tempo de serviço e rescisórias, uma vez que, ao menos
em parte, aproxima-se desses institutos trabalhistas. Contudo, na verdade,
o FGTS é instituto signi cativamente mais complexo, mantendo-se, hoje,
como patrimônio do empregado mesmo em rupturas por justa causa operária
ou pedido de demissão pelo obreiro (embora, nestes casos, o trabalhador
não possa sacar, na rescisão, o Fundo). A par disso, o instituto transborda
as restritas fronteiras do Direito do Trabalho, uma vez que não se limita,
inclusive, a uma natureza estritamente trabalhista. Por tais razões, deve ser
examinado em separado, ao nal do presente capítulo.
Registre-se, por m, que o advento do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço, no Direito brasileiro, na década de 1960, é que iniciou o declínio do
sistema celetista de indenização por tempo de serviço e estabilidade decenal
no emprego. Por essa razão, antes deste capítulo adentrar no exame dos
quatro institutos acima especi cados, analisará, no item II, à frente, esse
processo de eclipse do modelo da CLT e a rmação do modelo do FGTS.
II. AS ANTIGAS ESTABILIDADE E INDENIZAÇÃO
CELETISTAS E O REGIME DO FGTS
O Direito do Trabalho brasileiro, no que toca aos princípios da conti-
nuidade da relação de emprego e da inserção do trabalhador na empresa,
desde sua origem, mesmo na fase denominada de manifestações incipientes
e esparsas, buscou criar mecanismos de a rmação de tais princípios, valori-
zando a permanência do vínculo empregatício e a mais profunda inserção do
obreiro na vida e dinâmica empresariais.
Nesta linha, ainda na década de 1920, por meio da Lei Previdenciária
n. 4.682, de 24.1.1923 (Lei Elói Chaves), que criou as Caixas de Aposenta-
dorias e Pensões dos Ferroviários, foi garantida “estabilidade, depois de 10
anos de serviços, aos empregados daquela categoria pro ssional”(1). Segun-
do Russomano, alguns “anos depois, essa norma foi ampliada, de molde a
atingir aos empregados de todas as empresas ferroviárias (Decreto n. 5.109,
(1) MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. 14. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas,
1987, p. 258.
1509C弼膝菱疋 尾微 D眉膝微眉肘疋 尾疋 T膝樋簸樋柊琵疋
de 20 de dezembro de 1926), e, logo no ano imediato, os portuários, nas
mesmas condições, foram amparados pela estabilidade”(2).
No período pós-1930, denominado de institucionalização do Direito do
Trabalho, o sistema estabilitário ampliou-se e se so sticou. Pela Lei n. 62, de
5.1.1935, a estabilidade deixou de “ligar-se à previdência, passando a constar
de diploma legal relativo ao contrato de trabalho”(3), generalizando-se para o
mercado laborativo urbano. Viria a constar, logo em seguida, da Carta de
1937, do corpo da Consolidação das Leis do Trabalho, de 1943, e, nalmente,
da Constituição de 1946, que a estendeu também aos trabalhadores rurais
(art. 157, XII)(4).
Juntamente com a estabilidade decenal, previu-se a indenização por tempo
de serviço, em seguida ao cômputo do primeiro ano contratual, verba que seria
calculada por ano ou fração igual ou superior a seis meses (antigo art. 477,
caput, e art. 478, caput, Decreto-lei n. 5.452, de 1.5.1943 — CLT). Enquanto a
indenização celetista criava óbice econômico signi cativo e crescente às dispensas
sem justa causa, a estabilidade adquirida aos dez anos aprofundava esse obstáculo,
transmutando-o de seu estrito caráter econômico para outro, essencialmente
jurídico. A partir desse instante, a dispensa do empregado seria possível apenas
por meio de inquérito judicial para apuração de falta grave do obreiro.
1. Antigo Modelo Jurídico Celetista
Como visto, o modelo celetista clássico impunha forte contingenciamento
à vontade empresarial quanto à ruptura desmotivada do contrato de emprego.
Previa esse modelo a combinação de duas sistemáticas: em primeiro lugar,
a presença de indenização crescentes em virtude do tempo de serviço, em
situações de dispensas desmotivadas anteriores a dez anos (antigo art. 477,
caput, e art. 478, caput, da CLT, os quais foram recepcionados pelo art. 7º,
I, c./c. art. 10, caput e inciso I, do ADCT); em segundo lugar, a presença
da estabilidade no emprego, após dez anos de serviço junto ao mesmo
empregador — prazo que fora jurisprudencialmente reduzido para efetivos
nove anos de serviço (art. 492, CLT; antigo Enunciado 26, TST).
É claro que o antigo modelo não impedia, do ponto de vista estritamente
jurídico, o exercício unilateral, pelo empregador, da faculdade de rompimento
(2) RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. v. II, 2.
ed. Rio de Janeiro: José Kon no, 1953, p. 764.
(3) MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. 14. ed. cit., p. 258.
(4) MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. 14. ed. cit., p. 258. A jurisprudência, porém, na
época (décadas de 1940 a 1960), considerou a regra constitucional de 1946, relativamente aos
rurícolas, como “não auto-executável”, conferindo-lhe efetividade apenas a contar da vigência
do Estatuto do Trabalhador Rural (ETR: Lei n. 4.214/63), que entrou em vigor somente em
junho de 1963.

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