Estilos de vida e políticas deliberativas

AutorPaulo Krischke - Cíntia SanMartin Fernandes
CargoDoutor em Ciência Política pela Universidade de York (Canadá), Professor Colaborador do Doutorado Interdisciplinar em Ciências Humanas (UFSC) e Pesquisador Sênior do CNPq - Doutora em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina, tendo feito o Doutorado Sanduíche na Université René Descartes-ParisV/Sorbone, onde participou...
Páginas343-362
Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, Volume 44, Número 2, p. 343-362, Outubro de 2010
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* Life-styles and deliberative policies
1 Doutor em Ciência Política pela Universidade de York (Canadá), Professor Colaborador do Douto-
rado Interdisciplinar em Ciências Humanas (UFSC) e Pesquisador Sênior do CNPq
(krischke@cfh.ufsc.br). Versões preliminares deste trabalho foram apresentadas no 33º Encontro
Anual da ANPOCS (Caxambú, Outubro/2009) e no III Seminário Nacional sobre Movimentos
SOCIAIS, Participação e Democracia (Agosto/2010). Agradecemos os comentários dos colegas
Maria Eunice Maciel e Débora Leitão, Carla Rodrigues e Julián Borba.
2 Doutora em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina, tendo feito o Douto-
rado Sanduíche na Université René Descartes-ParisV/Sorbone, onde participou como pesquisadora
no Centre D’etude Sur L’actuel et Le Quotidien (CEAQ), coordenado por Michel Maffesoli.
Atualmente realiza Pós-Doutorado em Comunicação e Semiótica na PUC-SP e compõe o quadro de
pesquisadores do Centro de Pesquisas Sociossemióticas, coordenado por Ana Cláudia M. Oliveira
(PUCSP) e Eric Landowski (CNRS/Paris); também participa do Grupo de Pesquisa Espaço-Visuali-
dade, Comunicação-Cultura (ESPACC), coordenado por Lucrécia D´Alessio Ferrara (PUCSP), e do
Grupo de Pesquisa Cidade e Comunicação (UrbCom). (cintia@lagoadaconceicao.com).
Estilos de vida e políticas deliberativas*
Paulo Krischke1
Universidade Federal de Santa Catarina
Cíntia SanMartin Fernandes2
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
O objetivo deste trabalho é apre-
sentar as reflexões e análise dos deba-
tes de um grupo focal misto, entre mo-
radores de alguns bairros populares do
Morro da Cruz. Dividimos o trabalho
em quatro momentos: o primeiro discu-
te as questões do viver comunitário e o
conceito de estilo de vida; o segundo,
apresenta a discussão sobre o conceito
de comunidade reflexiva; o terceiro pro-
blematiza os conceitos de imagem e
arte; e, finalmente, o quarto descreve a
experiência das comunidades integran-
tes do Morro da Queimada, no contex-
to do Maciço do Morro da Cruz, a par-
tir da análise dos grupos e entrevistas
realizados ao longo da pesquisa.
Palavras-chave: Estilos de vida –
Políticas deliberativas – Aprendizado
– Comunidade
The aim of this article is to anali-
ze the debate of a mixed focus-group
of citizens living in some popular nei-
ghborhoods of Morro da Cruz, in do-
wntown Florianopolis.The article is di-
vided into four moments. The first one
discusses community life and our con-
cept of life-style; the second one dis-
cusses the concept of reflexive com-
munity; the third one questions the con-
cept of imagery and art; and the four-
th one describes the experiences of the
communities organized around the
Morro da Queimada, that participate
in the Maciço do Morro da Cruz,
around the analysis of the research
groups and interviews.
Keywords: Life-styles – Deliberati-
ve policies – Learning – Community
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UMANAS
Revista de Ciências
H
Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, Volume 44, Número 2, p. 343-362, Outubro de 2010
Introdução
Florianópolis é constituída por uma variedade de “redes” de comunicação-
comunhão, agentes das escolhas sócio-políticas dos habitantes dos diferen-
tes lugares da cidade. Esses lugares são representativos de modos e estilos de
vida diversos que, ao se cruzarem com as questões das deliberações políticas
cotidianas das comunidades, utilizam diferentes estratégias de ação política,
entre elas a arte, para mobilizar o desejo (pessoal e comunitário) de se expres-
sar nos âmbitos das decisões locais.
Desejo impulsionado, como bem nos apresentou Goethe no século XIX,
pelas “afinidades eletivas”. Conceito que permeou todo o campo da sociologia
compreensiva passando por Simmel, Schutz e Weber e que ganhou força nos
estudos contemporâneos ao depararmos com os modos, as formas, as configu-
rações sociopolíticas das comunidades atuais demonstrando que existem em
nós – de uma maneira freqüentemente contraditória e inconciliável, escolhas
que transitam entre as singularidades e os laços de pertencimento comunitários.
Os estudos das representações sociais (JODELET, 2001) constatam que as
escolhas deliberativas presentes nas atuais sociedades democráticas expres-
sam cada vez menos etapas de desenvolvimento moral e cognitivo, como as
supostas anteriormente pelas teorias de psicologia e sociologia do aprendizado,
como os de Piaget, Köhlberg e Habermas (mesmo quando relativizadas como
sugeriu CHILTON, 2002).
Diversos estudos, ao contrário, indicam que as formas e mensagens deli-
berativas de diversos grupos parecem emergir, direta ou indiretamente, dos
diferentes estilos de vida e atividades, diversamente priorizados pelos partici-
pantes que, em interação com o seu lugar elegem cada um suas afinidades,
tanto pelas interações sensíveis como cognitivas – ou seja, o sentido presente
nas escolhas emerge das interações ora sensíveis, ora inteligíveis. O sentido
compartilhado nas relações sociais nem sempre tem como base ou fundamento
uma ação racional instrumental. Muitas escolhas emergem da esfera sensível
em que corpo-espírito (razão) não se desvinculam, não se separam. Nesse
sentido, o que emerge é um sentir o sentido da vida em comum.
O objetivo deste trabalho é apresentar as reflexões e análise dos debates
de um grupo focal misto, entre moradores de alguns bairros populares do Mor-
ro da Cruz, selecionados por sua participação em diferentes modalidades de
organização popular, e pela vontade que manifestaram de conhecer e trocar
informações sobre suas respectivas experiências. Para tanto, dividimos o tra-
balho em quatro momentos: o primeiro discute as questões do viver comunitário
e qual o conceito de estilo de vida que utilizamos; o segundo, apresenta a dis-
cussão sobre o conceito de comunidade reflexiva; o terceiro, problematiza os
conceitos de imagem e arte; e, finalmente, o último descreve a experiência da

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