Estrutura de governança, conflito de interesses e desenvolvimento sustentável judicial

AutorMagno Federici Gomes e Bráulio Chagas Pighini
Páginas135-160
Direito, Estado e Sociedade n.51 p. 135 a 160 jul/dez 2017
Estrutura de governança,
conito de interesses e desenvolvimento
sustentável judicial
Governance structure, conit of interest, and judicial
sustainable development
Magno Federici Gomes*
Escola Superior Dom Helder Câmara, BH
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte-MG, Brasil
Bráulio Chagas Pighini**
Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo-SP, Brasil
1. Introdução
A ingerência dos Poderes Executivo e Legislativo junto ao Poder Judiciá-
rio, corresponde, segundo alguns, à “coexistência equilibrada [...] e seu
controle representa a essência mesma do regime constitucional”1. Ao se
afastar o atual modelo de separação de poderes daquele def‌inido por
Montesquieu, ao Poder Judiciário não compete mais somente a resolu-
ção das questões de direito privado. Pelo contrário, o Poder Judiciário,
na atual sistemática, vem ampliando o seu campo de inf‌luência ao exer-
cer uma função política. A imparcialidade e a independência, garantias
processuais da Constituição da República de 1988 (CR/1988) e do Có-
digo de Processo Civil (CPC), são prejudicadas em função da existência
de uma natureza política?
Cumpre salientar que a discussão sobre uma matriz de decisão tem
íntima relação com o princípio, atualmente simbólico, do desenvolvi-
* Doutor em Direito pela Universidade de Deusto-Espanha, professor mestrado da Escola Superior Dom
Helder Câmara e professor adjunto da PUC-MG. E-mail: federici@pucminas.br.
** Mestre em Direito Político e Econônico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (MACKENZIE).
Graduado em Direito pela PUC-MG. E-mail: brauliopighini@hotmail.com.
1 CAPPELLETTI, 1999, p. 53.
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Direito, Estado e Sociedade n. 51 jul/dez 2017
Magno Federici Gomes
Bráulio Chagas Pighini
mento sustentável, não aplicável apenas ao direito ambiental2. Portanto, o
desenvolvimento sustentável deve ser interpretado ampliativamente, como
modo de garantir os direitos fundamentais e sociais3, incluídos neles a pró-
pria guarda da Constituição que é assegurada pelas decisões judiciais, a f‌im
de se garantir o bem-estar social4 e a dignidade da pessoa humana.
O objetivo do trabalho consiste em, justamente, apresentar uma ciên-
cia voltada à análise das tomadas de decisão em contraste com as estruturas
de Governança quando do conf‌lito de interesses no setor privado e pú-
blico. Ao apresentar e analisar o instituto do conf‌lito de interesses e parte
relacionada, o estudo busca demonstrar que o atual sistema brasileiro além
de incentivar os possíveis conf‌litos, ainda não possui instrumentos efetivos
2 Af‌irma-se isso com base em Almeida e Araújo (2013, pp. 11-51) que concluíram: “que é possível admitir
o desenvolvimento sustentável como instituto de direito constitucional, classif‌icando-o como princípio fun-
damental de força normativa superior, aplicável para a obtenção de conclusões jurídicas vinculantes de todas
as práticas do Estado e da sociedade, sempre guardando a ideia do poder-dever do primeiro para com a
efetividade das propostas jurídicas e concretização f‌inalística da ideologia social adotada pela carta constitu-
cional vigente. O ordenamento jurídico brasileiro tem acompanhado e absorvido muitas dessas propostas,
prevendo, ainda que implicitamente, o desenvolvimento sustentável como um princípio de natureza fun-
damental (ALMEIDA; ARAÚJO, 2013, p. 46). Isso quer dizer que o desenvolvimento sustentável deve ser
ampliado, não se restringindo mais à compatibilização entre o meio ambiente e as atividades econômicas
da sociedade, para ser compreendido como desenvolvimento socialmente includente, economicamente
sustentado e ambientalmente sustentável, ante as dimensões básicas e essenciais da sociedade. Nesse
sentido: “Verif‌ica-se que o projeto do desenvolvimento sustentável verdadeiramente se presta a harmonizar
os direitos fundamentais constitucionalizados do desenvolvimento econômico, do meio ambiente sadio e,
mais do que isso, resta como princípio constitucional fundamental por conta da perfeita congruência de
seus contornos conceituais com a ideologia constitucional do bem-estar social, cultural e ético” (ALMEIDA;
ARAÚJO, 2013, p. 45).
3 Em sentido equivalente, “a aplicação do Princípio do Desenvolvimento Sustentável não encontra efetivação
na forma como o Judiciário faz a sua aplicação, na medida em que os possíveis signif‌icados do princípio,
encontrados tanto na Constituição brasileira quanto na legislação infraconstitucional, pressupõem uma
sustentação mais ampla, disposta a efetivar não só a dimensão ambiental, mas também os direitos funda-
mentais e sociais” (ALMEIDA; ARAÚJO, 2013, p. 15).
4 “As questões econômicas e ambientais englobam o conjunto de direitos humanos e por isso são tidas
como de cunho social na atual Constituição, não podendo tais dimensões f‌icar excluídas do conjunto de
valores a serem considerados na contemplação do Direito Constitucional. Nessa perspectiva, ao se estudar
o objeto de tutela ambiental, preconizado pelo artigo 225 da Constituição Federal de 1988, o qual anuncia
o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, pode-se af‌irmar que o direito protegido nesta seara
deve ser a síntese havida entre a qualidade do meio ambiente em função da apropriação dos recursos natu-
rais como meio de sobrevivência do homem, representado pela expressão constitucional “desenvolvimento
sustentável”, e portanto a Carta da República de 1988 e toda a legislação infraconstitucional passaram a ser
informadas por esses objetos acolhidos, como forma de garantir sua observância, a f‌im de elevar tais ele-
mentos à categoria de valores, dentro de um sistema integrado. Observa-se ainda que tal compatibilização
deve acontecer tendo em vista a matriz econômica liberal acolhida pelo nosso Estado de Direito, uma vez
que dentro os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil está a livre iniciativa, preconizada
no artigo 1º, inciso IV e reaf‌irmada nos artigos 5º, incisos XIII, XXII e XXIII, 170, incisos I a IX da Carta
Constitucional” (ALMEIDA; ARAÚJO, 2013, pp. 19-20).

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