Execução provisória e definitiva

AutorHumberto theodoro júnior
Ocupação do Autordesembargador aposentado do tribunal de justiça de minas gerais. professor titular aposentado da faculdade de direito da ufmg. doutor em direito
Páginas983-996

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630. Noções introdutórias

Admite o Código que a execução por quantia certa, em cumprimento de sentença, possa ser definitiva ou provisória (NCPC, arts. 520 e 523). Execução definitiva "é aquela em que o credor tem sua situação reconhecida de modo imutável, decorrente da própria natureza do título em que se funda a execução"1. Baseia-se ou em título extrajudicial ou em sentença trânsita em julgado. É a regra geral da execução forçada das decisões judiciais.

Execução provisória, que, em regra, só pode ocorrer em casos de títulos executivos judiciais e que tem caráter excepcional, é a que se passa, nas hipóteses previstas em lei, quando a situação do credor é passível de ulteriores modificações, pela razão de que a sentença que reconheceu seu crédito não se tornou ainda definitiva, dada a inexistência de res judicata. Provisória, em suma, é a execução da sentença impugnada por meio de recurso pendente recebido só no efeito devolutivo (NCPC, art. 520).2

O novo Código manteve a regra de que o cumprimento provisório da sentença se processará do mesmo modo que o cumprimento definitivo (NCPC, art. 520, caput).

A opção de permitir o cumprimento provisório deriva tanto da lei (ope legis) - quando não confere efeito suspensivo a alguns recursos - como por decisão judicial (ope iudicis). Neste último caso, quando o magistrado confirmar, conceder ou revogar tutela provisória na sentença, a apelação não terá efeito suspensivo (art. 1.012, § 1º, V), possibilitando a eficácia imediata da decisão.

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Em relação aos títulos extrajudiciais a execução forçada nasce sempre definitiva. Pode, apenas eventualmente, tornar-se provisória durante seu curso. Essa mutação acontece quando o executado oferece embargos e obtém do juiz suspensão da execução (NCPC, art. 919, § 1º).3Se, estando os atos executivos sob eficácia, os embargos forem julgados improcedentes e o executado apelar, o prosseguimento da execução, na pendência do recurso, se requerida pelo credor, assumirá o feitio de execução provisória (art. 1.012, § 2º) (v. adiante, o item 632).

Embora a regulamentação dos arts. 520 a 522 cuide apenas das sentenças relativas a obrigação de pagar quantia certa, também a sentença que reconheça obrigação de fazer, de não fazer ou de dar coisa sujeita-se ao regimento do cumprimento provisório, com as devidas adaptações (art. 520, § 5º).

631. Fundamentos da execução provisória

Em regra, a execução baseia-se na perfeição do título e no seu caráter definitivo. Se é certo que a sentença "tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida" (NCPC, art. 503),4não é menos exato que é a res judicata que torna o decisório "imutável e indiscutível" (art. 502).5Daí a afirmação geral de que a sentença para ser executada deve ter transitado em julgado, fato que ocorre quando não seja mais admissível a interposição de recurso (art. 502).

A lei, no entanto, abre certas exceções, porque leva em conta a distinção que se pode fazer entre eficácia e imutabilidade da sentença. Assim, em circunstâncias especiais, confere eficácia a determinadas decisões, mesmo antes de se tornarem imutáveis. É o que se passa quando o recurso interposto é recebido apenas no efeito devolutivo6.

São questões de ordem prática que, em nome da efetividade da tutela jurisdicional, levam o legislador a tal orientação, já que, em algumas ocasiões, seria mais prejudicial o retardamento da execução do que o risco de se alterar o conteúdo da sentença com o reflexo sobre a situação de fato decorrente dos atos executivos.

632. Execução de título extrajudicial embargada

A execução do título extrajudicial é definitiva porque o título que a fundamenta não está, de início, pendente de julgamento que o possa alterar ou cassar.

Mas, uma vez interpostos embargos do devedor (NCPC, art. 914 e segs.), o título extrajudicial torna-se litigioso. Mesmo assim, como os embargos, em regra, "não terão efeito suspensivo" (art. 919, caput), os atos executivos não ficarão impedidos.

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No passado, muita divergência se estabeleceu sobre se seriam os atos executivos praticados como definitivos ou provisórios, depois que os embargos fossem rejeitados e a apelação fosse processada sem efeito suspensivo.

A matéria foi palco de grandes polêmicas na jurisprudência, tendo, afinal, se pacificado na interpretação do STF e STJ, que assentou o caráter definitivo da execução de título extrajudicial, ainda que pendente de julgamento a apelação intentada contra a sentença que repeliu os embargos do executado7.

A posição pretoriana, por último, encontrou reforço no art. 475-O, II,8com redação da Lei 11.232, de 22.12.2005, segundo a qual o sistema da execução provisória alterou-se profundamente, de modo a permitir a transferência definitiva do bem penhorado, resolvendo-se, no caso de reforma da sentença no julgamento posterior do recurso, em perdas e danos o direito do executado. A tanto serviria a caução que se prestou para a movimentação da execução provisória (v., adiante, o nº 634). Se até na execução originariamente provisória, não estava mais inibida a alienação judicial dos bens penhorados, de fato não haveria mais razão para insistir no caráter provisório da execução do título extrajudicial, na pendência de apelação sem efeito suspensivo, se ela desde o princípio fora processada como execução definitiva.9Todavia, uma grande inovação no regime da execução provisória foi feita pela Lei nº 11.382, de 06.12.2006, que, em certos casos, a estendeu também aos títulos extrajudiciais (sobre o tema ver, retro, o item 118).

633. Situação do tema no Código novo

Para o novo Código, a execução é definitiva quando fundada em: a) título extrajudicial; ou b) título judicial com autoridade de coisa julgada (art. 523). E é provisória, quando a) baseada em título judicial, impugnado por recurso desprovido de efeito suspensivo (art. 520), ou b) ainda, quando fundada em título extrajudicial, enquanto pendente apelação da sentença de improcedência dos embargos do executado, quando recebidos com efeito suspensivo (art. 1.012, § 1º, III).

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No sistema do novo Código, vários são os recursos que podem ter efeito apenas devolutivo e, por isso, ensejam execução provisória na sua pendência: a) a apelação, nos casos dos incisos do art. 1.012, § 1º; b) o recurso ordinário, em regra; c) o recurso especial e o recurso extraordinário; e d) o agravo de instrumento.10O agravo de instrumento, limitado a questões incidentes solucionadas em decisões interlocutórias, é de natureza especial e não obsta ao andamento do processo (art. 995), nem suspende a execução da medida impugnada, salvo nos casos do art. 1.019, I.

O agravo em recurso especial ou extraordinário (art. 1.042) interposto da decisão que denega seu processamento, impede execução definitiva do acórdão, que só pode basear-se em decisão passada em julgado, caráter de que não se reveste a decisão enquanto houver possibilidade de recurso ordinário ou extraordinário. Todavia, a execução provisória, na espécie, pode ser realizada com dispensa de caução (art. 521, III).

No entanto, todos os recursos que ordinariamente não suspendem a eficácia dos julgados, por eles atingidos, e, por isso não impedem a execução, podem excepcionalmente adquirir força suspensiva, por decisão do relator, no tribunal, nas condições estipuladas pelo parágrafo único do art. 995.11Decretado, por exceção, o efeito suspensivo ao recurso, a decisão impugnada perde a eficácia que antes ensejava a execução provisória.

Os casos de apelação sem efeito suspensivo, que, por isso, permitem a execução provisória, acham-se enumerados no art. 1.012, § 1º e são os que se referem às seguintes sentenças:

  1. de homologação da divisão ou da demarcação de terras;

  2. de condenação a pagar alimentos;

  3. de extinção sem resolução de mérito dos embargos opostos à execução ou de decretação de sua improcedência;

  4. de julgamento de procedência do pedido de instituição de arbitragem;

  5. de confirmação, concessão ou revogação da tutela provisória;

  6. de decretação da interdição.

De conformidade com o art. 1.013, caput, a apelação devolverá ao tribunal apenas "o conhecimento da matéria impugnada", que, por isso mesmo, pode não abranger toda a extensão da condenação.

Lembra, a propósito, Amílcar de Castro, com muita propriedade, que sendo apenas parcial a impugnação do apelante, ainda que recebido o recurso em ambos os efeitos,

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"poderá a parte não-impugnada ser executada, uma vez seja possível separá-la da outra". É que, segundo a lição de Ramalho, "consideram-se no julgado tantas sentenças quanto são os artigos distintos". De modo que a parte não recorrida "não pode deixar de ser tida como sentença transitada em julgado"12. E nesse caso, será definitivo o cumprimento da parte da sentença não recorrida (NCPC, art. 525, § 8º).

Repetindo, outrossim, norma constante do CPC/73, o NCPC dispõe que a possibilidade de cumprimento provisório da sentença não obsta a concretização da hipoteca judiciária (art. 495, § 1º, II).

634. Normas básicas da execução provisória

O procedimento que, basicamente, orienta o cumprimento provisório da sentença é o mesmo do definitivo (NCPC, art. 520, caput), e se sujeita ao seguinte regime específico.

I - A execução provisória corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exequente. Dessa forma, se a sentença vier a ser reformada...

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