Exemplo no 3. Análise de parecer técnico divergente em comparação com parecer técnico concordante

AutorJosé Fiker
Ocupação do AutorDoutor em Semiótica e Linguística Geral (com enfâse em Laudos Periciais) pela USP
Páginas94-119

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Se analisarmos o parecer técnico divergente do assistente técnicoque discordoudoperitojudicialnocasodomurodenossa propriedade que ruiu, podemos tirar muitas conclusões sobre o que dissemos no Capítulo V - O DISCURSO JURÍDICO E O DISCURSO CIENTÍFICO: PERCURSOS NARRATIVOS, principal-mente no que tange ao quadrado semiótico.

Notamos que, no parecer técnico divergente, o assistente técnico nãomencionou ofatodeoutro trecho do mesmomurodearrimo se manter intacto, por não ter sido afetado pelas escavações, no item 3 - Apresentação do Laudo Judicial - quando repete o que o perito judicial disse; a parte do outro trecho do mesmo muro se manter intacto ele não repete. Isto porque não lhe interessa expor esse fato, principal argumento da tese contrária. Tanto que aparece expresso no parecer técnico concordante do assistente técnico do autor. Nesse caso, o assistente técnico do réu omite o fato de o outro trecho de muro se manter intacto. Ele trabalha no lado do quadrado semiótico do “ser e não parecer”, que é o lado do segredo.

Por outro lado, afirma, no item 3.3 que “as fotografias do local mostram que as banquetas de proteção ainda lá estão, no fundo e lateralmente”. Para isso ele desenha um segundo pa-

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tamar no terreno, que não existe, o que é facilmente verificável pela fotografia. A fotografia revela que esse segundo degrau foi forjado no desenho e que na realidade não existe. Aqui ele está trabalhando no outro lado do quadrado semiótico que é o do “parecer e não ser”, que é o lado da mentira. E isto é eticamente condenável, pois um engenheiro não pode afirmar que dois e dois são cinco.

Além disso ele afirma, no item 3.4, “examinando os escombros originários do desmoronamento verificamos que os tubos por onde passavam as águas de servidão são feitos de material e espessura inadequados”. E junta uma propaganda de tubos de PVC dizendo que “os finos que não satisfazem foram retirados do mercado”.

Mandamos uma carta consultando essa Associação sobre o que seriam “os finos que não satisfazem” e eles responderam que eram tubos sem especificação. Fotografamos os escombros e vimos que todos os canos tinham especificações com dimensões adequadas. Provou-se mais uma vez que o assistente técnico mentia, isto é, dizia o que “parece mas não é”.

Julgamos que essa análise é bastante exemplificativa de como funcionam na prática, empiricamente, os elementos que expusemos no corpodotrabalhosobreopapel do quadrado semióticonas comunicações entre perito e juiz.

EXEMPLO DE PARECER TÉCNICO DIVERGENTE

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 20a Vara Cível da Capital

Genésio de Arruda Ribeiro, engenheiro civil, assistente técnico indicado por Antônio Vaz da Silva, nos autos da Medida Cautelar contra ele requerida por André Lima, tendo examinado o

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laudo do perito oficial e não podendo concordar com o mesmo, vem apresentar as seguintes

Razões de divergências
1 - Preliminares

O autor é proprietário do imóvel situado na Rua Laerte de Oliveira, 317, onde ocorreu o desabamento do muro de arrimo e de fecho da sua divisa esquerda (observador da rua), o qual, segundo o Requerente, ruiu em consequência de escavações procedidas pelo réu, no terreno vizinho da sua propriedade.

Com a finalidade de preservar as provas e por entender urgente a reparação de seu imóvel, requereu a presente medida com o objetivo de apontar a origem dos danos e o custo das reparações necessárias, bem como o de fixar a situação dos fatos e das consequências do ocorrido.

2 - Apresentação do laudo judicial

O perito judicial relatou o que observou na vistoria e concluiu, por meio do abaixo resumido:

1o - Que, no local, constata-se haver desmoronado, no imóvel do autor, um trecho de muro de arrimo, com quedas de jardim, do piso lateral, de um muro transversal, de um piso de pedra mineira da piscina, rompimento das tubulações serviendas do terreno de fundos, destruição da parte de um quiosque e rompimento do fundo da piscina;

2o - Que o desconfinamento das brocas oriundo das escavações levadas a efeito no terreno do requerido foram a causa do desabamento parcial do muro;

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3o - Que, para as obras de reparo do imóvel do autor, o valor dos orçamentos apresentados atinge a importância de R$ 16.000,00 mais R$ 2.500,00 correspondentes aos reparos da piscina.

3 - Razões da discordância

Não podemos concordar com o laudo judicial pelas seguintes razões:

3.1 - Não foi exibido projeto de cálculo para a construção do muro, razão pela qual não se sabe se o muro foi calculado para resistir à pressão de um jardim com uma piscina.

3.2 - As brocas não tiveram a profundidade suficiente para prever eventual desaterro.

3.3 - As fotografias do local mostram que as banquetas de proteção ainda lá estão, no fundo e lateralmente e apenas a banqueta de terra lateral com o Requerente foi descalçada pela ruptura do tubo das águas de servidão. Ora, se as banquetas serviram para conter os demais taludes, por que só a parte por onde passam os tubos de servidão desmoronou?

3.4 - Examinando os escombros originários do desmoronamento verificamos que os tubos por onde passavam as águas de servidão são feitos de material e espessura inadequados.

3.5 - A ruptura desses canos acarreta um grande aumento de pressão sobre o muro, pelo encharcamento da terra e pode ser apontado como causa suficiente para o desabamento.

3.6 - De acordo com as fotos 6 e 7, as extremidades dos canos junto ao meio-fio encontravam-se totalmente obstruídas por amassamento e entupimento.

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4 - Em vista do exposto, o signatário não pode concordar com as conclusões do laudo judicial, tendo em vista que o muro visivelmente não foi dimensionado para conter a quantidade de terra e a piscina que se encontrava no terreno do Requerente, bem como a canalização de água de servidão não apresentava condições de conter a água transportada. Os vazamentos ocorridos na canalização aumentaram a pressão do aterro, tendo ocorrido por consequência o desabamento do muro, cuja fragilidade não foi suficiente para suportar o esforço.

5 - Vai o presente PARECER TÉCNICO digitado em 3 (três) folhas, todas elas rubricadas, e esta última datada e assinada com mais três anexos.

São Paulo, 01 de julho de 1999.

Genésio de Arruda Ribeiro

Eng. Civil - CREA/SP

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São Paulo, 11 de fevereiro de 1986.

À

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS FABRICANTES DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS PARA SANEAMENTO SETORIAL DE PVC Av. Rio Branco, 185 11o andar GR 1.112 RIO DE JANEIRO - RJ

Prezados Senhores,

A propósito de informe publicitário divulgado pela ASFAMAS em dezembro de 1983 na revista “Dirigente Construtor”, VOL. XIX, no 12, pág. 44, sob o título “O fino que não satisfaz está de saída”, peço a gentileza de informar-me, para fins de perícia judicial, qual a espessura e demais especificações do referido tubo de PVC que foi retirado do mercado.

Agradecendo a atenção dispensada à presente, subscrevo-me

Atenciosamente,

Engo José Fiker - CREA/SP-23978/D

Rua Campos, 331 - Vila Iná - CEP 05620 - São Paulo - SP.

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ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS FABRICANTES DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS PARA SANEAMENTO - ASFAMAS

Rio de Janeiro, 21 de março de 1986.

Ilmo. Sr.

Engo José Fiker Rua Campos, 331 - Vila Iná
05.620 - São Paulo - SP

Prezado Senhor,

Queira desculpar-nos pelo atraso na resposta de sua carta de 11/02/86. Estávamos em férias e não nos foi possível responder a referida carta.

Quanto à sua indagação, devemos informá-lo que os tubos que foram retirados do mercado, não tinham especificação definida. Eram produzidos com paredes mais esbeltas do que as preconizadas pela EB-608 da ABNT, a qual anexamos uma cópia para sua consulta.

Assim sendo, os fabricantes de ASFAMAS se comprometeram a não mais produzir tubos com qualidade inferior à estabelecida na EB-608, a partir daquela data.

Agradecemos o seu interesse e colocamo-nos a disposição para maiores esclarecimentos.

Atenciosamente,

Engo Wilson Passeto

Diretor Grupo Setorial de PVC cc. todos os fabricantes de tubos de PVC.

Av. Rio Branco, 185 - 11o andar - Gr. 1.112 - CEP 20040 - Tel. 252.9680 - Centro - Rio de Janeiro - RJ.

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EXEMPLO DE PARECER TÉCNICO CONCORDANTE

Sérgio de Albuquerque, infra-assinado, engenheiro civil, assistente técnico indicado por André de Lima, nos autos da Medida Cautelar por ele requerida contra Antônio Vaz da Silva, tendo examinado o laudo do ilustre perito oficial e não encontrando motivos para divergir do mesmo, vem apresentar os motivos de sua concordância...

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