A expansão do universo de sujeitos da recuperação judicial considerando a finalidade e princípios do instituto

AutorHugo Cavalcanti Vaz Mendes
Páginas55-83
A EXPANSÃO DO UNIVERSO DE SUJEITOS DA
RECUPERAÇÃO JUDICIAL CONSIDERANDO A
FINALIDADE E PRINCÍPIOS DO INSTITUTO
Hugo Cavalcanti Vaz Mendes
Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, com LL.M em
Direito Empresarial Internacional pela Central European University, Hungria e mestran-
do em Direito Comercial na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Advogado.
Sumário: 1. Introdução – 2. O modelo norte-americano; 2.1 Breve histórico da evolução legislativa;
2.2 Debates acerca da política pública do Chapter 11 – 3. Objetivos e princípios da recuperação
judicial de acordo com a Lei 11.101/2005 – 4. Agentes abrangidos pela Lei 11.101/2005; 4.1 Conceito
de empresário e sociedade empresária; 4.2 Agentes excluídos da Lei 11.101/2005; 4.2.1 Agentes
excluídos expressamente pela Lei 11.101/2005; 4.2.2 Agentes excluídos por não se enquadrarem no
conceito de empresário ou sociedade empresária do Código Civil – 5. Expansão da acessibilidade
ao instituto da recuperação judicial pelo legislador – 6. Conclusão – 7. Referências
1. INTRODUÇÃO
A Lei 11.101/2005, que, além da falência, regula os institutos da recuperação
judicial e extrajudicial, foi elaborada objetivando-se a instauração de um siste-
ma concursal que possibilitasse a manutenção da atividade de empresas viáveis,
fomentando, assim, o desenvolvimento econômico e social do país. Entretanto,
tal lei, por meio do seu Art. 1º, restringiu o acesso aos benefícios trazidos por ela
apenas ao empresário e sociedade empresária. Dessa forma, diante do atual cenário
econômico, composto por uma grande diversidade de agentes que, independente
de sua natureza jurídica, conduzem atividades econômicas, movimentam recursos,
geram receitas e empregam pessoas, cabe uma análise aprofundada quanto ao rol
de agentes sujeitos à recuperação judicial vis-à-vis os princípios e f‌inalidades da
legislação concursal brasileira.
O presente artigo avaliará os recentes movimentos de expansão do acesso ao
instituto da recuperação judicial brasileira a agentes distintos dos delimitados pelo
Art. 1º da Lei. 11.101/2005, quais sejam: o empresário e a sociedade empresária. No
primeiro momento, analisaremos o modelo norte-americano, que inf‌luenciou outras
legislações no f‌inal do século XX, incluindo a brasileira. Para tanto, será feita uma
breve revisão da evolução do instituto de reorganization nos Estados Unidos, desde
as crises das railroads até a construção do atual Chapter 11. Na sequência, serão le-
vantas as principais correntes f‌ilosóf‌icas, procedimentalista e tradicionalista, deste
país, que buscam orientar a aplicação mais adequada do Chapter 11, considerando
sua f‌inalidade e política pública.
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Superada a análise do sistema norte-americano, bem como de suas correntes
f‌ilosóf‌icas, passaremos ao estudo da legislação nacional. Nesta parte do artigo, me-
diante análise do parecer do senador Ramez Tebet do PLC 71, serão levantados os
princípios norteadores da elaboração da Lei 11.101/2005, buscando-se traçar um
paralelo com as correntes estadunidenses.
Após levantamento dos princípios e objetivos da lei, passa-se à delimitação do
universo de agentes econômicos. Primeiramente, será aprofundado o conceito de
empresário e sociedade empresária que foram adotados pela lei concursal com base
no Código Civil. Em seguida, o rol de agentes excluídos pela lei será analisado con-
siderando-se o disposto em seu Art. 2º e as pessoas não abrangidas pelo conceito de
empresário e sociedade empresária. Neste momento, também será feita uma análise
de recentes julgados e acórdãos que, adotando uma interpretação teleológica da lei,
f‌lexibilizaram o acesso de modo a incluir os agentes no escopo legal. Por f‌im, o estu-
do fará uma breve análise dos principais projetos legais que visam a dirimir debates
legais quanto à expansão do universo de devedores sujeitos à recuperação judicial.
2. O MODELO NORTE-AMERICANO
O sistema concursal norte-americano, regulado pelo Chapter 11, tem suas raízes
no modelo capitalista do país, que fomenta o empreendedorismo e o crédito pessoal.
Tal origem, justif‌ica sua estrutura mais permissiva que possibilita a reestruturação
empresarial a f‌im de suportar o crescimento econômico1. Muitos países buscaram
adotar um sistema concursal similar à do Chapter 11, de modo a possibilitar a ma-
nutenção da atual administração do devedor, e com isso, possibilitar a recuperação
empresarial através da manutenção de suas atividades2. Dentre os países que tomara
o modelo norte-americano como inspiração, temos o Brasil.
Assim, para uma análise mais assertiva dos princípios e objetivos da Lei 11.101
de 2005, vale compreender a construção e princípios da legislação concursal nor-
te-americana3.
2.1 Breve histórico da evolução legislativa
A origem do instituto da recuperação judicial norte-americano remonta ao
século XIX, quando houve a expansão da indústria ferroviária (railroads). Apenas
na década de 1880, a malha ferroviária construída no país correspondeu à 112.000
km4. Em que pese a distinção histórica quanto às políticas públicas de transporte, a
título comparativo, o Brasil, que é um país essencialmente rodoviário, possuía, em
1. MARTIN N., 2005, p. 3.
2. Ibidem, p. 4.
3. BORGES FILHO, 2015, p. 240.
4. BAIRD; RASMUSSEN, 2001, p. 925.
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