Familismo e política social: aproximações com as bases da formação sócio-histórica brasileira

AutorPatricia Maccarini Moraes, Renata Nunes, Claudio Henrique Miranda Horst, Regina Célia Tamaso Mioto
CargoAssistente social, Mestre e Doutoranda em Serviço Social pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina. Assistente Social no Instituto Federal de Santa Catarina - IFSC, Campus Caçador. Pesquisadora integrante do Núcleo de Pesquisa Interdisciplinar Sociedade, Família e Políticas Sociais - NISFAPS, da ...
Páginas802-818
FAMILISMO E POLÍTICA SOCIAL: aproximações com as bases da formação sócio-histórica
brasileira
Patricia Maccarini Moraes1
Renata Nunes2
Claudio Henrique Miranda Horst3
Regina Célia Tamaso Mioto4
Resumo
O artigo problematiza a construção do familismo no Brasil como elemento estruturante da política social na formação sócio-
histórica brasileira. Destaca a necessidade de entender a vinculação orgânica entre política social e família para afrontar
sua naturalização na esfera da proteção social. Ao recorrer à formação sócio-histórica observa repercussões do período
colonial e imperial na configuração da cultura política na fase republicana. Aponta que tais repercussões i ncidem sobre a
proteção social e revelam a posição estratégica da família no desenvolvimento do capitalismo. O recuo histórico é
fundamental para explicar a arquitetura do familismo e demonstrar sua atualidade na estruturação da política social.
Ressalta, ainda, que perdura no país uma concepção de família conectada às bases de sua formação social e econômica e
com papel fundamental na reprodução ideológica da sociedade brasileira.
Palavras Chave: Familismo. Política Social. Formação Sócio-histórica.
FAMILISM AND SOCIAL POLICY: approaches with the bases of Brazilian socio-historical formation
Abstract
The article discusses the construction of familism in Brazil as a structuring element of social policy in Brazil’s socio -historical
formation. It hi ghlights the need to understand the link between social policy and family to confront its naturalization in the
sphere of social protection. By resorting to socio-historical formation, it is observed the repercussions of colonial and imperial
periods in the configuration of political culture in the republican period. Such repercussions affect social protection and reveal
the family's strategic position in the development of capitalism. The historical recap is key to explain the architecture of
familism and to demonstrate its relevance in social policy. It is argued t hat persists in the country a co ncept of family
connected to the basis of its social-economic formation and with a key role in the ideological reproduction of the brazilian
society.
Keywords: Familism. Social Policy. Socio-historical Formation.
Artigo recebido em: 15/04/2020 Aprovado em: 25/10/2020
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v24n2p802-818.
1. Assistente social, Mestre e Doutoranda em Serviço Social pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da
Universidade Federal de Santa Catarina. Assistente Social no Instituto Federal de Santa Catarina - IFSC, Campus Caçador.
Pesquisadora integrante do Núcleo de Pesquisa Interdisciplinar Sociedade, Família e Políticas Sociais - NISFAPS, da
Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: pmaccarinimoraes@gmail.com
2 Assistente Social Mestre e Doutoranda em Serviço Social pela Universidade Federal de Santa Catarina. Assistente Social
da Secretaria de Estado de Assistência Social Trabalho e Habitação...E-mail: renata.net@gmail.com
3 Assistente Social. Mestre em Política Social e Doutor em Serviço Social.Professor do Departamento de Serviço Social da
Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: claudiovasques1@hotmail.com
4 Assistente Social. Doutora em Saúde Mental pela Universidade Estadual de Campinas. Professora do Programa de Pós-
Graduação em Serviço Social da Uni versidade Federal de Santa Catarina, onde integra o Núcleo de Pesquisa
Interdisciplinar Sociedade, Família e Políticas Sociais (NISFAPS).. E-mail: regina.mioto@gmail.com
Patricia Maccarini Moraes, Renata Nunes, Claudio Henrique Miranda Horst e Regina Célia Tamaso Mioto
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1 INTRODUÇÃO
O declínio da era de ouro do Welfare State nos países do capitalismo central e seus
rebatimentos nos países de capitalismo dependente que nunca conseguiram aceder à condição de
Estados de bem-estar trouxeram à baila a questão da família no campo da política social. Temática,
até então descurada no âmbito do debate brasileiro, toma fôlego a partir dos anos de 1990 e ,
particularmente, dos anos 2000, quando aparece incorporada explicitamente na política de assistência
social. O mal-estar causado especialmente no meio acadêmico, por tal incorporação, pode ser
associada a duas chaves. A primeira ao paradoxo que existe entr e família e cidadania, pautada na
ideia de direitos sociais universais, portanto vinculada a todas as pessoas, independente dos
pertencimentos ou do filtro da família. A segunda pela escassa tradição do debate da família no
contexto da política social, uma vez que as análises dos sistemas de proteção social foram
concentradas nos eixos do Estado e do Mercado e suas inter-relações.
A incorporação da família no debate, além de referências clássicas como a de Beveridge
que destaca a presença da família na estruturação da proteção social, particularmente das mulheres
casadas (CAMPOS, 2015), toma força a partir dos anos de 1970 com os estudos feministas de tradição
marxista. Estes vão colocar enfaticamente a família, além do trabalho, como pilar do welfare state. Mais
que isso, vão enfatizar que tal estruturação só foi possível a partir do trabalho não pago das mulheres
realizado dentro de um modelo de família conhecido como male breadwinner model”.
No Brasil, esse debate também se desenvolve a partir do movimento feminista, embora
nem sempre reconhecido. No Serviço Social começa a se estruturar realmente com a incorporação da
matricialidade sociofamiliar na política de assistência social e se espraia para análises em outros
setores da seguridade social brasileira, como a política de saúde, além da previdência social e dos
estatutos do idoso e da criança e do adolescente (CAMPOS; MIOTO, 2003).
Tal debate para a área do Serviço Social brasileiro, que tem uma vinculação orgânica com
a Política Social e a família como instituição presente no trabalho profissional ao longo de sua história,
parece fundamental por dois aspectos. Primeiro, para compreender as relações paradoxais existentes
entre família e cidadania. Segundo, para entender a incorporação da família na política social e a sua
naturalização, enquanto esfera central de proteção social, no contexto da crise atual do capitalismo.
Contexto marcado pelo ideário neoliberal que se acentuou aceleradamente com o golpe parlamentar de
2016. Em relação ao segundo aspecto, torna-se importante buscar chaves explicativas, para além do
escopo da política social, abrangendo os aspectos culturais, políticos, sociais e econômicos da
formação social brasileira.

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