O fato jurídico do inciso III do artigo 135 do Código Tributário Nacional: a delimitação da responsabilidade tributária do administrador

AutorDanyelle Rodrigues de Melo Nunes, Filipe Lôbo Gomes, Natalie Cristyne de Santana Barbosa Farias
Páginas78-96
80
Danyelle Rodrigues de Melo Nunes • Filipe Lôbo Gomes • Natalie Cristyne de Santana Barbosa Farias
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 11, n. 2, p. 78-96, jul./dez. 2020.
the legal relationship, the tax obligation and all the related charges arise. For this reason, it is
necessary to analyze very carefully the legal norm that denes the tax legal fact. Based on these
assumptions, this article aims to apply the Theory of Legal Fact in the analysis of tax liability
to dene its eectiveness. In general terms, the theoretical reference of the research is that of
Pontes de Miranda. On the other hand, the method of study used is the deductive one, starting
from the bibliographical research, based on the Theory of the Legal Fact of Marcos Bernardes
de Mello. In the end, the work came to some quite elucidative conclusions: 1) item III of article
135 of the CTN corresponds to a legal fact in a broad sense, illicit, relative, as a illicit civil act
and compensative; 2) this legal fact has as an eect the legal relationship between the State, the
company and the administrator; and 3) the tax liability of the administrator is of the solidarity
type, since the legal norm establishes a command to guarantee the tax credit under a collection
and sanctioning bias.
Keywords: Legal Fact. Tax Responsibility. Administrator.
1 INTRODUÇÃO
O Fato Jurídico é um dos temas mais importantes da Teoria Geral do Direito, se não o
mais importante. Essa asser tiva se jus tica em ra zão de o fato jurídico ser o elemento basilar,
a viga mestre e o sustentáculo de todas as áreas da Ciência Jurídica. Seja no Direito Civil, no
Direito Penal, no Direito Administrativo, onde houver incidência de norma jurídica haverá
fato jurídico.
Talvez a melhor forma de visualizar essa conexão seja pela concepção ampla do
mundo dos fatos, no qual pessoas nascem, envelhecem, morrem; o dia amanhece, entardece,
anoitece; são realizadas tratativas, negociações, acordos; fatos sociais atingem os interesses
das mais diversas pessoas; o tempo passa; e o mundo do direito está em meio a todos esses
acontecimentos, no qual se encontram os fatos discriminados axiologicamente. O mundo
dos fatos e o mundo do direito se imiscuem, de maneira que os fatos podem ou não ser
qualicados pela alcunha de jurídicos. O fato pode ser biológico, físico, químico, astrológico
e passará a ser também jurídico caso seja objeto de incidência da norma jurídica.
Esquematizando esse raciocínio, o passo inicial da jornada no mundo do direito é
a qualicação do fato como jurídico. Isoladamente, a norma jurídica e o suporte fático são
fontes mediatas do mundo do direito. Por sua vez, o fato jurídico é fonte imediata do mundo
do direito.
O momento em que a norma jurídica incide sobre o suporte fático é pré-jurídico, ele
se dá no mundo dos fatos. Quando a norma jurídica incide sobre o suporte fático é que surge
o fato jurídico, adentrando ao mundo do direito e seguindo um caminho que lhe é próprio.
Uma vez existente, poderá percorrer os planos da validade e da ecácia sob as seguintes
variações: 1) existente, válido e ecaz; 2) existente, válido e inecaz; 3) existente, inválido
e ecaz; 4) existente, inválido e inecaz; 5) existente e ecaz; e 6) existente e inecaz; mas
sempre partindo da premissa de que é existente, pois se for inexistente não há sequer que se
falar em fato jurídico.
Em síntese, pode-se dizer tranquilamente que a norma jurídica dene o fato jurídico.
Lícito ou ilícito; absoluto ou relativo; civil ou penal; só quem produz eficácia jurídica é o fato
jurídico. Sob essas premissas, a Teoria do Fato Jurídico se revela uma Teoria Geral do Direito.
Nesse cenário, sobressai a necessidade de se analisar o fato jurídico do inciso III do
ar tigo 135 do Código Tributá rio Nac iona l a m de se delimita r a respon sabilid ade tr ibutá ria do
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O FATO JURÍDICO DO INCISO III DO ARTIGO 135 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL:
A DELIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO ADMINISTRADOR
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 11, n. 2, p. 78-96, jul./dez. 2020.
administrador. Isso porque esse diploma legal deu ensejo a controvérsias, tanto na doutrina
quanto na jurisprudência. Divergências quanto à interpretação do texto, à identicação do
fato, à aplicação da norma jurídica, à constatação da incidência e aos efeitos do fato jurídico
tributário precisam ser debatidas para aprimorar o instituto e promover segurança jurídica.
Do ponto de vista dogmático, a norma jurídica não é um dever ser, ela é um ser, ela
nunca falha; já do ponto de vista sociológico, a aplicação da norma jurídica está suscetível
a erros. É por isso que norma jurídica não é interpretação, é um preceito socialmente
determinado, um comando pela autoridade competente, que dene o fato jurídico; tal qual a
aplicação da norma jurídica não pode se pautar apenas sob o critério linguístico, ela deve ser
sistemática, utilizando métodos para suprir omissões, obscuridades, ou ambiguidades, pois a
lingua gem norma lmente é falha. Como o redi reciona mento da obr igação tributária da pessoa
jurídica para a pessoa física que a representa tem grande repercussão na esfera patrimonial
do indivíduo, perguntas como quando a imputação dessa responsabilidade pode ocorrer (se
apenas diante da prática de atos ilícitos ou se também é possível diante da prática de atos
lícitos); e como se dará essa responsabilidade (se ela se dará de forma solidária, de forma
subsidiária ou de forma pessoal) precisam ser respondidas, a m de esclarecer a descrição do
suporte fático e especicar os efeitos do fato jurídico.
2 TEORIA DO FATO JURÍDICO: NORMA JURÍDICA, SUPORTE FÁTICO, INCIDÊNCIA,
FATO JURÍDICO E RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA
O direito é um processo de adaptação social, assim como a religião, a moral, a etiqueta,
a moda, dentre tantos outros que impõem valores à personalidade do indivíduo e direcionam
seu comportamento. O diferencial do direito perante esses outros processos de adaptação
social é a sua obrigatoriedade, tendo em vista que nos demais a adesão é espontânea. E essa
obrigatoriedade não se expressa necessariamente pela sanção em caso de descumprimento,
mas sim pela inc idênci a: o fato soci al pas sa a ser também um fato juríd ico; as condut as sociais
passam a se subordinar ao sistema normativo jurídico; a subordinação exige obediência pois
se trata de uma imposição incondicional, cuja aplicação não depende da adesão das pessoas
(MELLO, 2017, pp. 37-40).
Lourival Vilanova explica que os fatos sociais podem ser classicados em eventos ou
em condutas: os eventos são os fatos da natureza, decorrentes de uma condição natural; já as
condutas são os fatos do homem, decorrentes de uma atuação humana. Os fatos sociais que
têm relevância para o relacionamento inter-humano são objetos de normas jurídicas, sejam
eles correspondentes a eventos ou condutas. Daí que os fatos jurídicos podem decorrer tanto
de eve ntos qu anto de conduta s, in seri ndo -se em um si ste ma de nor mas jurí dic as (V IL ANOVA,
1989, p. 23).
Pontes de Miranda descreve o mundo como o conjunto dos fatos que aconteceram, que
acontecem e que ainda irão acontecer. O mundo é a totalidade dos fatos, dentro dessa realidade
há os fatos jurídicos. Assim, os fatos do mundo interessam ou não interessam ao direito: se
interessam, são objeto da incidência das normas jurídicas, tornam-se fatos jurídicos e entram
no subconjunto do mundo a que se chama mundo jurídico; se não interessam, são considerados
irrelevantes e permanecem sem normatização (PONTES DE MIR ANDA, 2012, p. 65).
Marcos Bernardes de Mello assevera que a distinção entre o mundo fáctico e o mundo
jurídico tem uma importância fundamental na análise cientíca do direito. Seria preciso
disc riminar o que entra e o que não entra no mundo jurídico. É a norma jurídica quem define
o fato jurídico; é a incidência que possui eficácia juridicizante, imputando caráter jurídico

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