Fatores excludentes da responsabilidade

AutorCarlos Pinto Del Mar
Páginas263-274

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Teorias sobre o nexo causal

Existem na doutrina várias teorias sobre o nexo causal, sua caracterização e consequências, destacando-se para comentário a teoria da equivalência das condições, a da causalidade adequada e a dos danos diretos e imediatos, que é aquela adotada pelo Código Civil.

16.1. 1 Teoria da equivalência das condições

Quando se verificam várias circunstâncias a motivar o evento, é preciso identificar qual delas é a causa eficiente do prejuízo. Um elemento complicador na comprovação do nexo causal é que nem sempre se tem condições de apontar a causa direta do fato. É difícil indicar, dentre elas, o nexo, para estabelecer onde se situa a causa real ou eficiente do dano, e, assim, definir a responsabilidade ou indigitar o responsável.

Caio Mário, invocando a lição de De Page, Marty e Raynaud e Genéviève Viney, nos remete historicamente aos tribunais belgas, que conceberam a teoria denominada da equivalência das condições. Tal teoria sustenta que, em havendo culpa, todas as “condições” de um dano são “equivalentes”, isto é, todos os elementos que, “de uma certa maneira concorreram para a sua realização, consideram-se como causas”, sem a necessidade de determinar, no encadeamento dos fatos que antecederam o evento danoso, qual deles pode ser apontado como o que de modo imediato provocou a efetivação do prejuízo496. O que prevaleceria, na teoria da equivalência, é a ideia de que toda condição que contribuiu para o resultado constitui causa, de forma que ele não se teria produzido se a condição não houvesse ocorrido (conditio sine qua non). A causa, portanto, insere-se em cada uma das condições, já que, sem o concurso de todas, o resultado não se teria verificado.

Como observa Caio Mário, a teoria da equivalência das condições vem em socorro da vítima, tentando resolver, na prática, o problema da relação causal, pois considera que toda e qualquer condição, não importa qual, constitui causa para o resultado; embora tenha o mérito da simplicidade, essa teoria tem sido afastada por

496 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, cit., 1996, p. 77-79.

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ter levado muito longe as implicações da responsabilidade, ao atribuir a um dano um número infinito de causas; elas tenderiam a tornar cada homem responsável por todos os males que atingem a humanidade.

16.1. 2 Teoria da causalidade adequada

A doutrina francesa desenvolveu a doutrina da causalidade adequada. Segundo essa teoria, em linhas gerais, o problema da relação de causalidade é uma questão científica de probabilidade. Dentre os antecedentes do dano, há que destacar aquele que está em condições de necessariamente tê-lo produzido. Praticamente, em toda ação de indenização o juiz tem de eliminar fatos menos relevantes, que possam figurar entre os antecedentes do dano. São aqueles que seriam indiferentes à sua efetivação. O critério eliminatório consiste em estabelecer que, mesmo na sua ausência, o prejuízo ocorreria. Após esse processo de expurgo, resta algum que, no curso normal das coisas, provocaria um dano dessa natureza.

A doutrina que se constrói nesse processo técnico se diz da causalidade adequada, porque faz salientar, na multiplicidade de fatores causais, aquele que normalmente pode ser o centro do nexo de causalidade, eliminando os demais.

Essa doutrina sofreu vigorosa crítica e entrou em desprestígio, sob o argumento de que o caráter “adequado” da causalidade depende do grau de probabilidade do dano. Mas a probabilidade não é certeza497.

16.1. 3 Teoria dos danos diretos e imediatos

A terceira teoria, a dos chamados danos diretos e imediatos (também denominada teoria da interrupção do nexo causal), é adotada pelo Código Civil e constitui um amálgama das anteriores, com certa amenização no que tange às extremas consequências a que se poderia chegar na aplicação prática das outras teorias. É a mais razoável. Seria aplicável toda vez que o resultado normal de um determinado acontecimento deixasse de ocorrer, em razão de uma outra circunstância, que lhe antecedesse, da qual a situação seria consequência necessária. Tal circunstância se constituiria na chamada causa estranha.

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Fatores excludentes da responsabilidade no código civil

Há certos fatos que interferem nos acontecimentos ilícitos e rompem o nexo causal, excluindo a responsabilidade do agente. As principais excludentes da responsabilidade civil, que implicam a negação do liame de causalidade, são:

• o estado de necessidade;

• a legítima defesa;

• a culpa exclusiva da vítima;

• o fato de terceiro;

• a cláusula de não indenizar;

• o caso fortuito ou força maior.

Comentaremos as quatro últimas, que são aquelas que mais se verificam na matéria em estudo.

16.2. 1 A culpa exclusiva da vítima

Quando o evento danoso acontece por culpa exclusiva da vítima, desaparece a responsabilidade do agente. Nesse caso, deixa de existir a relação de causa e efeito entre o seu ato e o prejuízo experimentado pela vítima.

Como exemplo, temos as modificações feitas (pelos usuários ou proprietários) nas edificações, ou a demolição de paredes em prédios construídos com alvenaria estrutural (que é portante e suporta a carga da edificação, ou seja, não tem o sistema convencional de vigas e pilares que as outras edificações possuem). Nesse caso, se a vítima retira uma parede, pode causar trincas na estrutura da edificação e toda uma sorte de problemas que não poderão ser imputados ao construtor, já que decorrentes da culpa exclusiva da vítima.

São também exemplos de culpa exclusiva da vítima: alterações procedidas pelos usuários nas instalações hidráulicas ou elétricas sem os devidos cuidados; a ligação de aparelhos com carga superior à prevista, causando danos às instalações elétricas; o plantio de árvores cujas raízes afetam tubulações ou sistemas de impermeabilização etc.

Há casos em que a culpa da vítima é apenas parcial, ou concorrente com a do agente causador do dano. Haverá então repartição de responsabilidades, de acordo com o grau de culpa498, como se comentará no item 17.2, do Livro 4.

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16.2. 2 O fato exclusivo de terceiro

Muitas vezes, aquele que atropela alguém ou causa alguma espécie de dano não é o responsável pelo evento499. A verdadeira causa do dano pode ser o ato de um terceiro. Em matéria de responsabilidade civil, entretanto, predomina o princípio da obrigatoriedade do causador direto em reparar o dano, a culpa de terceiro não exonera o autor direto do dano do dever jurídico de indenizar.

Quando, porém, o ato de terceiro é a causa exclusiva do prejuízo, desaparece a relação de causalidade entre a ação ou a omissão do agente e o dano. A exclusão da responsabilidade se dará porque o fato de terceiro se reveste de características semelhantes às do caso fortuito, sendo imprevisível e inevitável500.

Como exemplo de fato exclusivo de terceiro (a excluir a responsabilidade do construtor ou equiparado), tem-se um acidente de trânsito em que um veículo de carga ou um ônibus desgovernado atinge um prédio, comprometendo a sua estrutura; o construtor não deverá ser responsabilizado pelos danos decorrentes do acidente. Outros exemplos podem ser citados, como: a escavação de uma obra vizinha, que venha a causar recalques ou algum dano no prédio já concluído; o rompimento de uma adutora na rua, causando solapamento ou outros danos na fundação do prédio já edificado, e assim por diante.

16.2. 3 A cláusula de não indenizar

A cláusula de não indenizar é aquela estipulação por meio da qual uma das partes contratantes declara, com...

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