Formas 'paralelas' de satisfação do crédito fazendário

AutorPaulo Cesar Conrado
Páginas403-434
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Capítulo 13
FORMAS “PARALELAS” DE SATISFAÇÃO DO
CRÉDITO FAZENDÁRIO
13.1 Introdução
Um dos maiores (senão o maior dos) desafios práticos en-
frentados na dinâmica processual contemporânea relaciona-
-se ao aprimoramento dos instrumentos de cobrança do cré-
dito fazendário, compatibilizando esse propósito às garantias
do administrado.
Esse desafio vem sendo faceado pelas Fazendas por meio
de estratégias que, além do incremento da cobrança em sen-
tido estrito (assim entendida, a que se processa via execução
fiscal), passam pelo emprego de novos instrumentos de “co-
brança indireta” (identificáveis, como explicitaremos mais
adiante, como verdadeiras sanções) e, em complementação,
pelo dilargamento das hipóteses de revisão de créditos pen-
dentes de quitação, além da utilização de instrumentos de
negociação.
O confronto das duas primeiras ideias a que nos referimos
há pouco (incremento da cobrança e preservação das garan-
tias do contribuinte) poderia gerar, em princípio, um quê de
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PAULO CESAR CONRADO
paradoxalidade, à medida que parecem se excluir. Sabemos (ou
devemos saber), porém, que as coisas não são assim: o incremen-
to dos mecanismos de cobrança só tem legitimidade, em termos
sistêmicos, se associado à preservação das franquias conferidas
ao administrado, tanto formal quanto materialmente.
Por isso, devemos reconhecer, entre aquelas duas posi-
ções, um nexo de complementariedade. Eis a razão porque
normativos como a Portaria PGFN n. 33/2018 lançam mão,
num mesmo suporte, de temas tão diversos – assim o PRDI
(instrumento que vem ao encontro dos interesses do admi-
nistrado, oficiando, pois, em abono à ideia de amplificação do
controle de legalidade dos atos estatais), assim, em contrapar-
tida, a averbação pré-executória (instrumento obviamente re-
lacionado ao exacerbamento da eficácia da cobrança).309
13.2 Cobrança em sentido próprio (“direta”) e cobrança
“indireta” (estímulo à voluntariedade)
Cobrança é vocábulo ambíguo, designando, em seu sen-
tido mais estrito (e próprio, portanto), a atividade voltada à
satisfação forçada do crédito tributário pendente, coisa que,
no sistema brasileiro, exige intervenção judicial.
Na prática jurídica, há, a par disso, um segundo sentido
para o mesmo vocábulo, de tom mais amplo e que aponta para
os mecanismos que, previstos no ordenamento, servem para
estimular o cumprimento voluntário da obrigação tributária.
309. Art. 21. A averbação pré-executória é o ato pelo qual se anota nos órgãos de
registros de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora, para o conhecimento de
terceiros, a existência de débito inscrito em dívida ativa da União, visando prevenir
a fraude à execução de que tratam os artigos 185 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro
§ 1º. A notificação de que trata o art. 6º dará ciência ao devedor ou corresponsável
da ocorrência da inscrição em dívida ativa e da possibilidade de efetivação da aver-
bação pré-executória, caso não adotadas as providências descritas nos incisos I e II
do mesmo dispositivo.
§ 2º. A averbação poderá ser impugnada pelo sujeito passivo, inclusive em relação a
seu excesso, observado o procedimento previsto nessa Portaria.
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EXECUÇÃO FISCAL
Para tais mecanismos, é comum a adição, ao vocábulo “co-
brança”, da predicação “indireta”.
Em si mesma, essa forma de “cobrança” (designável de
“indireta”, repita-se) não seria viabilizadora da satisfação do
crédito fazendário. Por essa razão, não deveríamos tratar tais
mecanismos como verdadeira “cobrança”, a não ser por con-
cessão de linguagem.
Fundada em premissas de estratégia e proporcionalidade,
a tomada desses expedientes deriva de uma espécie de grada-
ção – típica dos regimes de ajuizamento seletivo –, em que a co-
brança propriamente dita (a “direta”) representa a última ratio.
Usando outros termos: a busca pelo pagamento forçado (aque-
le que opera a partir da expropriação patrimonial, via execução)
seria circunstancialmente precedida de instrumentos extraproces-
suais (em sua essência, menos onerosos, e que encarnariam a tal
“cobrança indireta”) voltados a estimular o pagamento voluntário.
Essa é a racionalidade inerente a sistemas como o que foi
instituído pela Portaria PGFN n. 396/2016, operativa a partir
da seleção dos casos que devem ser diretamente submetidos à
derradeira alternativa (do pagamento forçado, via expropria-
ção), isolando-os dos que devem ser alvo de prévia atividade
“estimuladora” de voluntariedade.
Exemplo vivo da operação subjacente aos casos por último
mencionados é o protesto: seu emprego, em si, não basta para sa-
tisfazer a Fazenda credora, servindo para criar um incômodo ao
devedor e, com isso, estimulá-lo a pagar voluntariamente, vale
dizer, sem a necessária instalação de processo expropriatório.
Esses estímulos podem ser abstratamente catalogados
como:
(i) positivos ou premiais (verificáveis quando, por exem-
plo, a legislação concede desconto para pagamento
antecipado),
(ii) negativos ou sancionatórios (classe em que situa o
protesto),

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