Frequência de perícias médicas administrativas em auxílios-doença: Impactos econômicos, jurídicos e sociais

AutorCarlos Adriano Miranda Bandeira
Páginas45-81
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CAPÍTULO 2
Frequência de perícias
médicas administrativas
em auxílios-doença
Impactos econômicos, jurídicos e sociais
Carlos Adriano Miranda Bandeira
1.PANORAMA METODOLÓGICO
Prognose médica é uma previsão baseada em saber técnico acerca da evolu-
ção dos sintomas de um paciente acometido por uma doença. Ela é estatis-
ticamente mais precisa quando feita com base nos dados relativos a maiores
e mais representativas séries de históricos médicos reais. A estim ativa será
mais conf‌i ável em uma doença frequente e a margem de erro será maior em
doenças raras. O desvio padrão é ínsito à prognose e a mais sen sata dessas
doenças pode não se concretizar.
Isso cria um dilema para quem estr utura e executa um programa público
de benefícios por incapacidade. Considerando a atuação do INSS na con-
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REFLEXÕES SOBRE DIREITO E ECONOMIA
cessão de auxílios-doença no Regime Geral de Previdência Social (RGPS),
pode-se questionar: se o INSS realiza uma perícia médica única, quando
da concessão do auxílio-doença, isso reduz seus custos necessariamente?
Como def‌inir a melhor frequência de realização de perícias?
Sem dúvida, o critério médico é um limitador. A Lei nº 8.213/1991 pre-
vê, em regra, a realização de perícia médica para def‌inir se h á incapacidade
laboral que justif‌ique a concessão inicial de um auxí lio-doença. Segundo o
art. 60, § 8º, daquela lei, em caso de concessão, uma data f‌inal de pagamen-
to deverá ser provisoriamente def‌inida sempre que possível. Não se mostra
legítima a atribuição de um auxílio-doença a alguém que não está impos-
sibilitado de retomar o trabalho. Por isso, o termo f‌inal do auxílio-doença
não ultrapassará o período da estimativa médica, em regra.
Excepcionalmente, o auxílio-doença se prorroga até depois do f‌im da
estimativa médica. Isso ocorre frequentemente em processos judiciais mo-
vidos para reconhecimento do direito ao benefício. Em juizados especiais
federais, ao laudo favorável de um perito judicial, se segue prazo em que
o INSS pode contestar e conciliar.1 Por vezes, no momento da sentença, já
está ultrapassado o período estimado como de continuação da doença in-
capacitante. Sobre o tema, o Fórum Regional de Juizados Especiais Federais
da 2ª Região aprovou o enunciado 120, com a seguinte redação:
A data de cessação do benefício deve ser f‌ixada conforme a est imativa do
perito judicial, salvo se, quando da sentença, ela já tiver sido superada ou
estiver prestes a sê-lo, devendo ser estipulada em 45 dias da i mplantação
do benefício, de forma a permitir que o segu rado realize o pedido de pror-
rogação se ainda considerar que está inc apaz.
A questão aqui por analisar é outra: havendo lastro técnico para se esti-
mar em período maior a incapacidade futura, deve o INSS realizar perícia s
1. Conforme artigo s 9º e 12 da Lei nº 10.25 9/2001.
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FREQUÊN CIA DE PERÍCIAS MÉDI CAS ADMINISTR AT IVAS EM AUXÍLIOS -DOENÇA
frequentes em período menor, a f‌im de se assegurar de que interrompe os
pagamentos tão logo ocorra uma recuperação antecipada? Na lei, a resposta
é expressamente af‌irmativa para aposentadorias por inval idez, concedidas
em caso de incapacidade permanente.2 Com relação ao auxílio-doença, a
questão é nova: o dever de f‌ixação prévia de termo f‌inal do benefício surgiu
na Medida Provisória nº 739/2016 .
Para redução das variáveis envolvidas, o tema será estudado apenas toman-
do em vista o conjunto de auxílios-doença de duração de 4 meses. Portanto,
a questão por analisar pode assim ser reformulada: sabendo-se que a mais
embasada prognose médica pode não se concretizar, há argumentos econômi-
cos que levem o INSS a, diante de uma incapacidade medicamente estimável
em 120 dias, fazer apenas uma perícia médica ou realizar 4 a cada 30 dias?
Para essa empreitada, será utilizada a AED. A sua def‌inição, seus limites
e as críticas a ela serão objeto da primeira parte do texto, na qual também
será explicado em que consiste a Tomada de Decisão em Risco, ferramenta
utilizada para comparar a s duas situações concebidas acima. Uma exposição
sobre o que afeta a perda de capacidade laboral e a demanda por auxílios-
-doença, bem como sobre as normas jurídicas sobre esse benefício será feita
na segunda parte do texto. O levantamento do número de perícias, das des-
pesas do INSS, da produtividade de peritos administrativos e dos impactos da
alteração do número de perícias por benefício será o objeto da terceira parte.
As proposições e uma síntese conclusiva serão formuladas na quarta parte.
1.1 Escopo da AED
A AED é uma aplicação de saberes da Economia ao estudo de institutos ju-
rídicos. Ela tem uma função descritiva: est uda o f‌luxo de recursos escassos
e desejados associados a esses institutos. À AED se atribuem também duas
2. Conforme art. 101 da Lei nº 8 .213/1991, regulado pelo ar t. 46 do Decreto nº 3.048/1999, o qua l
determina a rea lização de perícias méd icas de revisão de aposentadori as por invalidez a cada
dois anos.

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