A função ambiental da propriedade: caráter conceitual para a modulação de conflitos socioambientais / The environmental function of property: conceptual feature for socio-environmental conflicts modulation

AutorDélton Winter de Carvalho
CargoDoutor em Direito pela UNISINOS - Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Professor do Programa de Pós-Graduação em Direito da UNISINOS, nível Mestrado e Doutorado. E-mail: delton@deltoncarvalho.com.br
Páginas1662-1691
Revista de Direito da Cidade vol. 10, nº 3. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2018.33089
__________________________________________________________________
Revista de Direito da Cidade, vol. 10, nº 3. ISSN 2317-7721 pp. 1662-1691 1662
-
1
O presente trabalho tem por escopo analisar a questão envolvendo a matéria florestal e o
direito de propriedade. Sabe-se que a relação entre a proteção florestal e o direito de
propriedade é extremamente complexa, pois o direito fundamental à propriedade dá ensejo ao
exercício de prerrogativas inerentes ao direito subjetivo, porém este deve ser exercido
respeitando outros direitos fundamentais de mesma hierarquia constitucional, como o direito
ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Nesse sentido, será analisada a estrutura
constitucional do direito de propriedade, em suas faces subjetiva e objetiva. Após, será
verificada como a função ambiental condiciona o exercício do direito de propriedade,
exercendo um caráter modulador dos conflitos entre estas dimensões jusfundamentais, de um
lado os deveres ambientais e de outro o direito à propriedade privada. A análise dos elementos
semânticos e conceituais da função am biental fornece critérios interpretativos para ponderação
dos interesses em jogo, lembrando, sempre, que estes devem respeitar as premissas estruturais
do Estado Constitucional.
-: função ambiental; direito de propriedade; direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado; proteção flor estal.
The present work has the scope of analyze the issue involving forest protection and the
property rights. It is known that the relationship between forest protection and property rights
is extremely complex, since the fundamental right to property gives rise to the exercise of
prerogatives inherent in subjective law, but this must be exercised while respecting other
fundamental rights of the same constitutional hierarchy, such as the right to an ecologically
balanced environment. In this sense, the constitutional structure of the property right, in its
subjective and objective face will be analyzed. After that, the environmental function of the
property will be verified. It conditions the property right to guarantee the modulatory character
of the conflicts between the fundamental dimensions of the right to the ecologically balanced
environment and the right to private property. The analysis of the semantic and conceptual
elements of the environmental function provides interpretative criteria for weighing the
interests at stake, always remembering that they must respect the structural premises of the
Constitutional State.
: environmental function; property rights; ecologically balanced environment; forest
protection.
1 Doutor em Direito pela UNISINOS - Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Professor do Programa de
Pós-Graduação em Direito da UNISINOS, nível Mestrado e Doutorado. E-mail:
delton@deltoncarvalho.com.br
Revista de Direito da Cidade vol. 10, nº 3. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2018.33089
__________________________________________________________________
Revista de Direito da Cidade, vol. 10, nº 3. ISSN 2317-7721 pp. 1662-1691 1663
A matéria florestal apresenta inegável conexão com o exercício do direito de
propriedade, uma vez que propriedades cobertas por vegetação podem sofrer restrições e
limites ao seu uso e gozo, face aos interesses transindividuais2 que permeiam a função
ambiental das florestas. O presente artigo apresenta uma reflexão sobre a importância da
função ambiental como critério de modulação para a solução de conflitos entre as dimensões
jusfundamentais do direito ao meio ambiente e o direito à propriedade privada. Tais análises
dar-se-ão a partir de uma matriz analítica da literatura jurídica, orientada pela Teoria do Estado
de Direito (Rule of Law), empregando a pesquisa o método de abordagem dedutivo e
procedimento histórico e comparativo.
De longa data a matéria florestal vem impondo restrições, no cotidiano econômico e
jurídico brasileiro, ao exercício do direito de propriedade e à atividade econômica de forma
geral. A inegável condição essencial que as florestas exercem para garantia do equilíbr io
ecológico, este assegurado a todos no caput do art. 225 da CF, emana a formação de um
sistema jurídico florestal ao longo de décadas no Direito Ambiental brasileiro, num emaranhado
regulatório composto por leis, decretos, resoluções, portarias e outros atos normativos. Assim
como os demais bens ambientais, a supressão dos recursos florestais pode afetar de diferentes
maneiras o resguardo do interesse transindividual, constitucional e infraconstitucionalmente
protegido. Essa condição de interesse juridicamente tutelado de natureza transindividual, que
os recursos florestais adquirem, decorre diretamente dos benefícios e serviços ecológicos por
estes prestados. As florestas e seus atributos são, portanto, elementos essenciais para o
equilíbrio ecológico que, por seu turno, tem natureza de bem de uso comum do povo, em
virtude de sua essencialidade para a sadia qualidade de vida .
A cobertura vegetal e sua relação com o direito de propriedade pode, portanto,
apresentar uma diversidade de aspectos e relações jurídicas, tais como benfeitorias plantadas
objeto de contratos e negócios jurídicos, obrigações de reflorestamento propter rem, direito a
pagamento por serviços ecossistêmicos, ou mesmo, limitações administrativas ao uso da
2 Os interesses transindividuais, muitas vezes referidos como interesses coletivos lato sensu,
compreendem os interesses coletivos stricto sensu e os difusos. A distinção entre estas duas espécies
(coletivo e difuso) do gênero transindividual consiste na determinação relativa dos titulares (coletivos) o
una indeterminação absoluta (difusos). Em um ponto de vista procesual, para ambos os casos, “há a
impossibilidade de titularidade individual, pois tais direitos são decorrentes de uma circunstância de fato,
no caso dos interesses ou direitos difusos, e uma relação jurídica-base, nos direitos coletivos.”
(CARVALHO, 2011, p. 337).

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT