A fundamentalidade dos direitos sociais à luz da teoria dos custos dos direitos e do debate entre Fernando Atria e Carlos Pulido

AutorElísio Augusto Velloso Bastos - Heloisa Sami Daou
CargoDoutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP). Professor de Graduação e do Mestrado do Centro Universitário do Pará ? CESUPA. Advogado. Procurador do Estado do Pará. E-mail: elisiobastos@oi.com.br. - Mestra em Direito, Políticas Públicas e Desenvolvimento Regional pelo Centro Universitário do Estado do Pará ? CESUPA. E-mail:...
Páginas75-109
Direito, Estado e Sociedade n.57 p. 75 a 109 jun/set 2020
A fundamentalidade dos direitos sociais à
luz da teoria dos custos dos direitos e do
debate entre Fernando Atria e Carlos Pulido
The fundamentality of social rights according to the cost theory
and the debate between Fernando Atria e Carlos Pulido
Elísio Augusto Velloso Bastos*
Centro Universitário do Pará, Belém – PA, Brasil.
Heloisa Sami Daou**
Centro Universitário do Pará, Belém – PA, Brasil.
1. Introdução
A concretização de direitos sociais fundamentais continua suscitando inú-
meros debates na doutrina e na jurisprudência. Os direitos sociais, também
chamados de direitos de igualdade, formam, juntamente com os direitos
culturais e econômicos, os denominados direitos de segunda geração, isso
porque, em que pese sua previsão já em algumas Constituições france-
sas do período revolucionário, apenas posteriormente é que passaram a
integrar os textos constitucionais ocidentais com certa habitualidade, es-
tabelecendo, assim, um tipo diferente de Estado ou um tipo diferente de
ideologia estatal.
* Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP). Professor de Graduação e do Mes-
trado do Centro Universitário do Pará – CESUPA. Advogado. Procurador do Estado do Pará. E-mail: eli-
siobastos@oi.com.br.
** Mestra em Direito, Políticas Públicas e Desenvolvimento Regional pelo Centro Universitário do Estado do
Pará – CESUPA. E-mail: helo_daou@yahoo.com.br.
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Sabe-se, também, que a história dos direitos humanos remonta ao fi-
nal do século XVIII, servindo, inicialmente, como a teoria jurídica que
pretendeu legitimar o processo revolucionário, tanto francês quanto esta-
dunidense.
Os denominados direitos de primeira geração nascem nesse período
revolucionário, são direitos de resistência e oposição frente ao Estado, ins-
pirados nos valores da liberdade, da propriedade e da igualdade formal (de
todos, perante a lei), possuíam o propósito especial de proteger os indiví-
duos do então principal agente lesionador de direitos: o Estado. Esse era o
contexto do Estado que emerge como resultado das Revoluções liberais, do
final dos setecentos e início dos oitocentos.
Contudo, as contradições existentes no seio do Estado liberal, espe-
cialmente as profundas desigualdades sociais, impuseram o seu aprimora-
mento. Desse modo, os direitos sociais vieram a ser o instrumento político
e jurídico a pretender reduzir o déficit democrático perante os sistemas
econômico e social de então.
Desse modo, o Estado Social e Democrático de Direito e seu emba-
samento jurídico, a Constituição Social, pretendem estruturar de forma
diferente, tanto os princípios gerais de atuação e organização do Estado,
quanto as garantias de direitos fundamentais.
Um passo importante que pretende dar o constitucionalismo social é
partir do pressuposto de que as causas da pobreza não seriam exclusiva-
mente individuais, mas, sobretudo, econômicas e sociais, daí que a miséria
não deveria ser objeto de regulação pelo direito penal, mas especialmente
por direitos que pretendessem reduzir tais desigualdades.
Ocorre que a plena garantia de direitos sociais ainda encontra óbices,
isso porque a diferença de momento e contexto histórico de surgimento,
bem como supostas diferenças de natureza, importância e custos de efe-
tivação, fazem com que parte considerável da doutrina aponte diferenças
entre os direitos sociais e os direitos de primeira geração, argumentos que
acabam por negar força normativa a tais direitos e, com isso, sua funda-
mentalidade.
O presente texto tem o objetivo de problematizar acerca da funda-
mentalidade dos direitos sociais, uma vez que considerar os direitos sociais
como fundamentais tem como consequência prática reconhecer que tais
normas são dotadas de características peculiares que facilitam a sua prote-
ção e efetivação.
Elísio Augusto Velloso Bastos
Heloisa Sami Daou
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Desse modo, propõe-se o diálogo com a realidade brasileira, especial-
mente a partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
(CRF/88), que reconhece a fundamentalidade aos direitos sociais, conside-
rando-os como ferramentas para que se torne real e efetivo o princípio elei-
to como razão de ser da própria existência do Estado, qual seja, o princípio
da dignidade da pessoa humana. Afinal, para além de expressar um con-
teúdo moral, os Direitos Sociais expressam um conteúdo jurídico, sendo,
portanto, direitos subjetivos. Perceba-se, ainda, que a fundamentalidade se
cinge a um ordenamento jurídico-constitucional específico.
Em sede de introdução, imprescindível a ressalva de que o diálogo
com a CRF/88 é essencial, pois a fundamentalidade do direito, como se
sabe, é atribuída de acordo com a realidade constitucional de cada país.
As ideias centrais do artigo estarão divididas em três partes. Inicial-
mente a intenção é explorar o surgimento do Estado Social e, desse modo,
dos direitos sociais.
Depois, analisar-se-á a problemática da fundamentalidade dos direi-
tos sociais, a partir da exposição de argumentos divergentes na doutrina
nacional e internacional, tratando-se, ainda, sobre o custo dos direitos,
argumento restritivo à ampla garantia de direitos sociais.
Por fim, com base na realidade brasileira, objetiva-se analisar questões
envolvendo a exigibilidade dos direitos sociais, apresentando-se, na opor-
tunidade, algumas das características desses direitos.
O presente ensaio é uma obra de hermenêutica constitucional, ancora-
da na análise qualitativa e, para atingir os objetivos elencados, a metodolo-
gia empregada será a da revisão bibliográfica de livros e artigos científicos
sobre o tema, ou seja, buscar-se-á suporte teórico necessário na doutrina
nacional e internacional.
2. O Estado Social: análise histórica
O mercado possuía grande importância no final do século XIX, pois, por
meio dele, garantia-se a compra e venda, além da apropriação, circulação
e acumulação de bens considerados essenciais à vida. Assim, predomi-
nava a lógica insculpida na doutrina do Laissez-Faire e na máxima laissez
faire, laissez passer, n’est pas trop de gouverner, que permitia a cada um se
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