Garantismo penal para quem? O discurso penal liberal drente à sua desconstrução pela criminologia

AutorMarisa Helena D`Arbo Alves de Freitas - Renan Posella Mandarino - Larissa Rosa
CargoUniversidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Franca, SP, Brasil - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Franca, SP, Brasil - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Franca, SP, Brasil
Páginas129-155
Garantismo Penal para Quem? O Discurso Penal
Liberal Frente à sua Desconstrução pela Criminologia
Criminal Guarantees for Whom? The Speech Liberal Criminal Front to this
Deconstruction by Criminology
Marisa Helena D´Arbo Alves de Freitas
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Franca – SP, Brasil
Renan Posella Mandarino
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Franca – SP, Brasil
Larissa Rosa
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Franca – SP, Brasil
Resumo: O presente artigo versa sobre a efe-
tividade das garantias individuais e o reflexo
dessa problemática no acesso à justiça penal
brasileira. Apesar de o discurso garantista apre-
sentar os instrumentos possíveis para defesa dos
acusados e para isonomia de tratamento aos su-
jeitos do processo, a realidade processual indica
que esse discurso é meramente retórico e limita-
do ao plano teórico-abstrato, com dificuldades
de se concretizar no plano prático-reformista.
O trabalho é bibliográfico e desenvolve con-
ceitos relativos à seletividade e às formas de
controle do poder punitivo. Para abordagem do
tema, partiu-se da perspectiva crítica do garan-
tismo penal proposto por Luigi Ferrajoli.
Palavras-chave: Garantismo Penal. Seletivida-
de. Criminologia Crítica.
Abstract: The present article deals with the
effectiveness of individual guarantees and the
reflection of this problem in access to brazilian
criminal justice. In spite of the guarantees speech
present the possible instruments for the defense
of the accused and to equality of treatment to
subjects in the process, the reality procedure
indicates that this discourse is merely rhetorical
and limited to theoretical plane-abstract, with
difficulties to achieve practical-reformist. The
work is bibliographic and develops concepts
concerning the selectivity and the ways of
controlling punitive power. To approach the
subject, it was assumed the critical perspective of
penal guaranteeism proposed by Luigi Ferrajoli.
Keywords: Criminal Guarantees. Selectivity.
Critical Criminology.
Recebido em: 27/03/2016
Revisado em: 29/03/2017
Aprovado em: 31/03/2017
http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2017v38n75p129
130 Seqüência (Florianópolis), n. 75, p. 129-156, abr. 2017
Garantismo Penal para Quem? O Discurso Penal Liberal Frente à sua Desconstrução pela Criminologia
1 Introdução
O presente trabalho buscou abordar a efetividade prática das ga-
rantias individuais invocadas no processo penal diante da postura estig-
matizante e seletiva dos delinquentes na mira do controle penal. Para
compreender a questão, inicialmente se procedeu à análise dos proble-
mas relativos ao conteúdo discriminatório da justiça penal, pontuando a
questão da seletividade pelo controle penal e os fatores preponderantes
que sucumbem o delinquente à discriminação pela justiça criminal e pelas
autoridades repressivas. Examinou-se também a força estigmatizante dos
sistemas de controles penais na construção do estereótipo do “homem de-
linquente” e a forma como essa imagem é retroalimentada pela ideologia1
dominante.
Após discorrer sobre o conteúdo discriminatório da justiça penal,
partiu-se para a abordagem dos crimes de “colarinho branco” com a fina-
lidade de estabelecer o contraponto com os delitos convencionais e me-
1 Oportuno frisar que a palavra “ideologia” utilizada neste trabalho tem como referencial
de análise o materialismo histórico e dialético proposto por Karl Marx e Friedrich Engels.
2WHUPR ³PDWHULDOLVPR´ p D D¿UPDomR GR FDUiWHU VRFLDO FRQFUHWRDWLYR SURGXWLYR GD
existência. A evolução histórica das sociedades ocorre pelos confrontos entre diferentes
classes sociais, decorrentes da exploração do homem pelo homem. O materialismo
KLVWyULFRVXSHUDDPHWDItVLFDHRLQGLYLGXDOLVPRUDFLRQDO¿ORVy¿FRGHIRUPDTXHDKLVWyULD
se perfaz na base econômico-produtiva da sociedade, na materialidade das relações
produtivas. Marx supera a dialética idealista de Hegel e propõe uma dialética pautada
no processo histórico de contradição da realidade, das próprias relações produtivas
e práticas do homem (“negação da negação”). O direito se constitui pela necessidade
histórica de as relações produtivas capitalistas estabelecerem determinadas instâncias
que possibilitem a reprodução do sistema de exploração, ou seja, conforme as demandas
capitalistas se impõem, os instrumentos jurídicos são criados. Nessa perspectiva, nega-
se a neutralidade ideológica do direito. A responsabilização criminal é uma decorrência
natural de certas estruturas econômicas, de maneira que o infrator seria vítima da luta de
FODVVHVPDLV HVSHFL¿FDPHQWHUHVXOWDGR GRGHWHUPLQLVPR VRFLDO HHFRQ{PLFR 3RUWDQWR
as bases ideológicas do direito penal seriam construídas pela classe social dominante.
2FULPH GH¿QLGR SHOD EXUJXHVLDWDPEpP VH PRGL¿FDULD FRPD QDWXUDO WUDQVIRUPDomR
da sociedade. O poder que a classe dominante exerce sobre as pessoas está diretamente
UHODFLRQDGRFRP DHGL¿FDomR LGHROyJLFDTXH HVWD ³HOLWH´FRQVWUyL GHQWURGDV PHQWHV GH
seus dominados, fornecendo sua visão de mundo e transformando-os em objetos de uso
e de exploração.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT