A geografia do ethos capitalista no cariri cearense

AutorClaudio Ubiratan Gonçalves
CargoClaudio Ubiratan Gonçalves é geógrafo, mestre em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade (CPDA/UFRRJ), doutor em Geografia (Universidade Federal Fluminense), assessor da Comissão Pastoral da Terra (CPT, Diocese de Crato) e professor adjunto da Universidade Federal de Sergipe (UFS, Campus Itabaiana). [birarural@ig.com.br; birauff@zipmail.com.br]
Páginas69-80
A GEOGRAFIA DO ETHOS CAPITALISTA NO CARIRI CEARENSE
CLAUDIO UBIRATAN GONÇALVES *
“Para os índios que habitavam a região, o vale do Cariri cearense já era ‘território
sagrado’, bem antes que os primeiros colonizadores católicos chegassem para a conquista, a
posse e o saque. Foi em defesa dessa terra da fertilidade e da fartura, onde se situava também
o ‘espaço mítico’, que os índios Cariri fizeram guerras contra os invasores brancos e mestiços
colonizadores e, bem antes, contra as tribos dos Sertões que, empurradas pela escassez de
viveres e pelas secas periódicas, tentavam se estabelecer na região. Índios, negros e mestiços
do Nordeste já conheciam o Cariri cearense como ‘terra da fertilidade’, como ‘chão sagrado’,
bem antes das pregações do padre Ibiapina e de Antonio Conselheiro, do milagre da beata
Maria de Araújo e da fama do padre Cícero” (Rosemberg Cariry, 2001)
1. APRESENTAÇÃO
O território é sagrado pela fartura que detém em recursos hídricos,
proporcionando cultivo agrícola e o desenvolvimento de atividades
econômicas. Quando comparada com as demais regiões do Nordeste seco, o
Cariri assume uma posição importante no rol da produção por causa de seu
tipo de solo e fertilidade, além da potencialidade de riqueza que a terra pode
gerar.
O Cariri Cearense (Cariris Novos), ao lado do Cariri Paraibano (Cariris Velhos),
são os mais conhecidos e declamados, seja através dos investimentos
exógenos, que criaram os famigerados planos das agências estatais, como a
Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e o
Departamento de Obras contra as Secas (DNOCS), ou de forma muito
incipiente e superficial, pelo foco científico da Antropologia, Geografia e
História, e ainda pelos causos guardados na memória popular, que citam as
regiões pela prosa e poesia.
Existe na literatura uma diversidade de abordagem por conta das formas
diferenciadas e de compreensão do termo Cariri. Identificamos pelo menos
quatro tipos de abordagens que sofreram variações ao longo do tempo. A
primeira forma aborda o Kariri dos índios. A segunda, a dos coronéis. A
terceira, o Cariri da Igreja Católica e, finalmente, o Cariri do Estado. Após esta
passagem pelos diversos Cariris, fica a questão: é possível falar num único
Cariri? Ou devemos trabalhar com a idéia de pluralidade dos Cariris? Por outro
lado, como se deu a metamorfose dos Kariris para Cariri e a inversão do foco
de interesse dos índios ao lugar?
Neste sentido, tecemos o fio dos acontecimentos que envolveram a complexa
trama da formação territorial do Cariri. A aspereza da escassez de registros
nos obrigou em dado momento a destacar determinados aspectos em
detrimento de outros, mas nada que comprometesse a construção de nosso
raciocínio geográfico. Recorremos a uma leitura que trata os Kariris enquanto
grupo étnico-lingüístico que compõe os indígenas tapuias. Adicionamos relatos
de viajantes, registros de cronistas e informações da tradição oral.

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