Grafias: récorde, estender, remição, remissão

AutorMaria Tereza de Queiroz Piacentini
CargoLicenciada em letras e mestre em educação pela UFSC. Revisora da Constituição de Santa Catarina de 1989
Páginas252-252
252 REVISTA BONIJURIS I ANO 33 I EDIÇÃO 668 I FEV/MAR 2021
Grafias: récorde, estender, remição,
remissão
Recorde ou récorde? A pronúncia récorde
(e daí o acento) é muito mais antiga do que
recorde (tornada oficial relativamente
há pouco tempo), que sempre causa certa
estranheza por nos remeter ao verbo recordar
(recorde = lembre-se).
Nos dicionários atuais, geralmente é preciso
fazer a busca por recorde. Mas o Houaiss
avaliza e registra a forma récorde como
variante. Numa edição anterior havia a
observação de que “pelo menos no Brasil, ocorre
também como palavra proparoxítona: récorde”.
Se os dicionários da década de 1950 registravam
a grafia inglesa “record” é porque a pronúncia
era a mesma do inglês, portanto proparoxítona
para nós. Da língua inglesa importamos este
termo para substituir “registro” na área do
desporto. Um exemplo: “RECORD, s.m. Do ingl.
Ato desportivo, verificado e registrado por
personalidades ou associações desportivas
competentes e que excede tudo o que foi
precedentemente feito no mesmo gênero”
(FREIRE, 1957, p. 4330).
Ver que o ticket foi aportuguesado conforme
absorvido pelos falantes de português, isto é,
como tíquete em vez de tiQUEte. Entendo que,
sendo tão ou mais natural falar récorde, deve
ser oficializada esta grafia como variante ou
alternativa correta.
***
Sendo a origem de estender o latim "extendere",
este verbo deveria ser escrito com x, como
acontece com outras palavras que têm a mesma
origem: extensão, extensivo, extenso, extensor,
extensível etc. Mas a grafia oficial saiu com s,
talvez por equívoco, e assim é que continuamos
respeitando essa forma (estender), apesar de
incongruente.
***
Nem sempre os dicionários deixam patente a
diferença de sentido entre remição e remissão,
duas palavras homófonas; mas cada qual tem
a sua justificativa, podendo no entanto ser
usadas no mesmo contexto, daí a confusão.
Sobre remição, vejamos o que explica
Napoleão Mendes de Almeida (Dicionário
de Questões Vernáculas, 1981:274): “Se em
espanhol existe redimir, em italiano redimere,
em francês rédimer, em inglês redeem,
formas correspondentes ao latim redimere,
em português existem duas formas, redimir
e remir”, as quais se prendem ao sentido de
resgate em face da significação dos verbos
latinos de que se originam. Continua ele:
“Mediante pagamento, resgata-se, liberta-se,
ou seja, reganha-se um prisioneiro, um escravo;
na redenção existe o resgate, ou seja, o preço,
a soma dada para a libertação, para a alforria:
remição dos cativos. Se com seu sangue Jesus
resgatou, libertou o homem, ele operou a
redenção, a remição da humanidade.”
A palavra remissão tem primariamente o sentido
de indulgência, perdão; compaixão, alívio, consolo;
ausência de ação, frouxidão; enfraquecimento,
diminuição ou atenuação temporária dos
sintomas de uma doença; por fim, significa a
ação de enviar para algum lugar. O verbo de que
o substantivo remissão se origina é remittere,
o qual também nos deu duas formas: remeter
e remitir (perdoar). Vindo de remeter, remissão
tem o conhecido sentido de “encaminhar a um
determinado ponto”: um índice é remissivo
quando contém remissão para outros verbetes.
Vindo de remitir, remissão é o ato de considerar
perdoada alguma coisa, sendo agora sinônimo de
afrouxamento: remissão dos pecados.
Sintetizando os dois casos: enquanto uma falta,
uma pena, um crime, um pecado é remitido
(remissão da falta), o faltoso, o pecador é
redimido (remição da pessoa). Sendo assim,
pode-se dizer que, com a remissão do pecado,
Cristo operou a remição do pecador. n
Maria Tereza de Queiroz Piacentini
LICENCIADA EM LETRAS E MESTRE EM EDUCAÇÃO PELA UFSC. REVISORA DA CONSTITUIÇÃO DE SANTA CATARINA DE 1989
linguabrasil@linguabrasil.com.br
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