Grindadráp: uma análise da caça de baleias-piloto nas ilhas feroe à luz dos direitos humanos e do direito animal

AutorSébastien Kiwonghi Bizawu - Pedro Henrique Moreira da Silva
CargoDoutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas) - Mestrando em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela Escola Superior Dom Helder Câmara (ESDHC)
Páginas31-47
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Revista Brasileira de Direito Animal, e-issn: 2317-4552, Salvador, volume 14, numero 02, p. 31-47, Mai-Ago 2019
Sébastien Kiwonghi Bizawu e Pedro Henrique Moreira da Silva
Resumo: A pesquisa objetiva analisar o direito à cultura e às tradições como um Direito Huma-
no e abordar com pertinência a questão dos animais não humanos como sujeitos de um Direito
Animal, tendo em vista a garantia da dignidade de todos os seres no planeta. Buscar-se-á contex-
tualizar nesse trabalho a questão da caça de baleias-piloto nas Ilhas Feroe que, segundo debate
internacional, ocorre de forma predatória, cruel e sem ns especícos. Nesse sentido, por meio
do método hipotético-dedutivo e da pesquisa bibliográca – o estudo questiona os limites entre
o Direito Humano às particularidades culturais e o Direito Animal dos cetáceos em tela. Referida
reexão se possibilita e se justica nas perspectivas e conceitos de alteridade, compaixão e da
urgente construção de uma cultura de harmonia entre Homem e Meio Ambiente.
PalavRas-chave: Direito Animal. Direitos Humanos. Caça às baleias. Grindadráp.
abstRact: The research aims to punctuate the right to culture and traditions as a Human Right,
at the same time as non-human animals as subjects of an Animal Law - whose objective is to
guarantee the dignity of all beings on the globe. From this, the question of pilot whale hunt
in the Faroe Islands is contextualized, which, according to the international debate, occurs in a
predatory, cruel and non-specic way. In this sense, through the hypothetical-deductive method
and the bibliographical research - the study questions the limits between the Human Right to the
cultural particularities and the Animal Right of cetaceans in question. This reection is possible
and justied in the perspectives and concepts of alterity, compassion and the urgent construction
of a culture of harmony between Humans and the Environment.
Key woRds: Animal Rights. Human Rights. Whale Hunting. Grandadráp.
sumáRio: Introdução. 1. Meio Ambiente, Cultura E Tradição Como Direito Humano. 2. O Grin-
dadráp: A Caça Tradicional De Baileias-Piloto Nas Ilhas Feroe. 3. A Questão Da Tratativa Animal
Nas Dimensões Éticas E Morais Da Sustentabilidade. 4. Direitos Humanos Vs Direito Animal.
Considerações Finais. Notas.
GRINDADRÁP: UMA ANÁLISE DA CAÇA DE BALEIAS-PILOTO NAS ILHAS
FEROE À LUZ DOS DIREITOS HUMANOS E DO DIREITO ANIMAL
Grindadráp: an analysis of the hunting of pilot whales in the feroe’s islands
under the perspectives of human rights and animal law
Recebido: 12.06.2019 Aceito: 26.06.2019
Sébastien Kiwonghi Bizawu
Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universida-
de Católica de Minas Gerais (PUC-Minas). Pró-Reitor do
Mestrado da Escola Superior Dom Helder Câmara (ES-
DHC). Advogado. Professor na graduação e na pós-gra-
duação da Escola Superior Dom Helder Câmara (ESDHC).
E-mail.: bizki2011@gmail.com. Lattes: http://lattes.cnpq.
br/6761226562065950. ORCID: https://orcid.org/0000-
0003-2814-3639
Pedro Henrique Moreira da Silva
Mestrando em Direito Ambiental e Desenvolvimento
Sustentável pela Escola Superior Dom Helder Câmara
(ESDHC). Bacharel em Direito pela Escola Superior Dom
Helder Câmara (ESDHC). Professor na pós-graduação
do Centro de Atualização em Direito (CAD). E-mail.:
pedroadvdireito@gmail.com. Lattes: http://lattes.cnpq.
br/5242432989474760. ORCID: http://orcid.org/0000-
0002-8217-2169
Revista Brasileira de Direito Animal, e-issn: 2317-4552, Salvador, volume 14, numero 02, p. 31-47, Mai-Ago 2019
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intRodução
A caça de baleias-piloto nas Ilhas Feroe – o Grindadráp – é um evento mundialmen-
te conhecido, seja por suas peculiaridades, seja pelo escândalo que o abate de dezenas de
cetáceos causa na comunidade de ambientalistas. Trata-se, todavia, de uma prática milenar
herdada pelo povo da cultura medieval Viking.
Quando pautada a discussão acerca da prática, a sociedade feroense alega que o
Grindadráp é parte de sua cultura e integra a identidade tradicional. Dessa forma, a caça dos
mamíferos na baía do arquipélago constituiria direito de ordem humana – portanto, inques-
tionável sem uma controversa sólida suscitável.
Não obstante, a pesquisa se propõe a discutir as medidas éticas e morais em se pro-
mover o Direito Humano à tradição e à identidade cultural às custas do sofrimento e da
morte animal. Para viabilizar referida resposta, são elencados objetivos chave, quais sejam,
a explicitação do meio ambiente, da cultura e da tradição como direitos de ordem humana,
a contextualização do Grindadráp, o debate acerca da gênese da tratativa animal, a discus-
são a respeito dos conceitos de alteridade em Emmanuel Lévinas – enquanto a superação
do “Eu”, a responsabilidade pelo sofrimento do “Outro” e a construção de uma visão do
“Nós”1 – e compaixão com as “bestas” e a explanação sobre a urgência da construção de
novos modos de relacionamento com a Pachamama e todas suas criaturas.
Para almejar os objetivos traçados, utilizar-se-á o método hipotético-dedutivo, com
a suscitação de hipóteses a partir da pesquisa bibliográca e documental, considerando os
atos internacionais, as convenções e tratados, bem como os textos cientícos e a reexão
crítica de lósofos que dedicaram suas abordagens aos temas que se propõe. Nesse sentido,
justica-se a pesquisa pela contribuição no enriquecimento de uma percepção inovadora do
Meio Ambiente, pautada na compaixão e no respeito – em uma lógica não mais antropocên-
trica, mas biocêntrica.
2 meio ambiente, cultuRa e tRadição como diReitos humanos
Os Direitos Humanos e a noção de desenvolvimento se consolidam na humanidade
na primeira metade do Século XX, como paradigmas para afastar os fantasmas da segunda
guerra mundial – apesar de ensaios anteriores no próprio Direito Canônico e na Revolução
Francesa. Esses princípios impulsionaram os fundamentos das Nações Unidas e reforçaram
os processos de descolonização.2
Nesse sentido, em 1948, foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos Huma-
nos, acompanhada do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e do Pacto Interna-
cional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais em 1966. A partir dali, foi delimitado
um padrão de dignidade mínimo, “inerente a todos os membros da família humana e dos
seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz
no mundo.”3
Símbolo da defesa da condição humana em face da opressão e da tirania, a Declara-
ção supra, aliada aos Pactos que se seguiram, expressou direitos que, em um contexto utó-
pico, são inquestionáveis, tais quais a vida, a liberdade, segurança pessoal, personalidade
jurídica, igualdade, garantias processuais, privacidade, locomoção e, por interpretação, a
cultura e a tradição como garantias de preservação da própria identidade humana.

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