A hegemonia do discurso liberal sobre direitos homossexuais no STF

AutorEder Fernandes Monica
CargoProfessor adjunto da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense
Rev. Direito Práx., Rio de Janeiro, V.11, N.2, 2020, p. 1358-1390.
Eder Fernandes Monica
DOI: 10.1590/2179-8966/2020/50211 | ISSN: 2179-8966
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A hegemonia do discurso liberal sobre direitos
homossexuais no STF
The hegemony of liberal discourse on homosexual rights at the STF
Eder Fernandes Monica¹
¹ Universidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail:
ederfm@id.uff.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7645-5912.
Artigo recebido em 17/04/2020 e aceito em 20/04/2020.
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Rev. Direito Práx., Rio de Janeiro, V.11, N.2, 2020, p. 1358-1390.
Eder Fernandes Monica
DOI: 10.1590/2179-8966/2020/50211 | ISSN: 2179-8966
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Resumo
O presente artigo realiza, por meio de dados documentais e de análise de discurso, a
crítica dos votos dos Ministros do STF nas ações de controle de constitucionalidade sobre
direitos homossexuais, tendo por hipótese que dada a tradição liberal do nosso sistema
jurídico, as pautas de direitos homossexuais são absorvidas pela hegemonia liberal,
colonizando e domesticando os discursos críticos e anulando as divergências e a
pluralidade das pautas homossexuais.
Palavras-chave: Hegemonia liberal; Direitos homossexuais; Supremo Tribunal Federal.
Abstract
This article conducts, through documentary data and discourse analysis, the criticism of
the votes of the STF Ministers in the actions of constitutionality control over homosexual
rights, assuming that given the liberal tradition of our legal system, the guidelines of
homosexual rights are absorbed by the liberal hegemony, colonizing and domesticating
critical discourses and nullifying the divergences and plurality of homosexual agendas.
Keywords: Liberal hegemony; Homosexual rights; Supremo Tribunal Federal.
Rev. Direito Práx., Rio de Janeiro, V.11, N.2, 2020, p. 1358-1390.
Eder Fernandes Monica
DOI: 10.1590/2179-8966/2020/50211 | ISSN: 2179-8966
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1. Introdução
Muito se debate sobre a oportunidade que têm os movimentos sociais de esquerda,
geralmente críticos à estrutura liberal que marca o Estado moderno, de produzir
mudanças radicais por ações internas ao próprio sistema estatal. Será que quando esses
grupos realizam algum tipo de solicitação por mudanças político-jurídicas ao Estado, ainda
conseguem guardar o viés crítico e promover mudanças para além do paradigma liberal
ou são absorvidos por esse paradigma hegemônico? Partindo do pressuposto de que
estamos efetivamente diante da hegemonia liberal, compreende-se que a maioria das
ações por mudanças na estrutura do Estado, quando promovidas por intermédio de seus
próprios instrumentos burocráticos, transitarão dentro das possibilidades concedidas
pela própria hegemonia, já que, para ser hegemônico, precisa guardar intacto o seu
núcleo fundante.
Para esse tipo de proposta de pesquisa, po demos realizar análises empíricas e
documentais sobre vários temas, em diferentes instâncias das instituições do Estado.
Entretanto, para fins do presente artigo, limitar-me-ei à análise de algumas ações de
controle de constitucionalidade abstrato sobre direitos homossexuais que foram
analisadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por mei o da metodologia de análise de
discurso. Em que pese alguma impressão de que o movimento homossexual como um
todo foi concorde com o c onteúdo e o modo de operação desses pleitos judiciais, o fato
é que existem muitas discordâncias internas ao movimento sobre o modo como essas
ações são executadas e seus resultados práticos, principalmente em decorrência da
centralidade da influência de homens homossexuais nas pautas do movimento LGBTQI+1.
Uso aqui o c onceito de direitos homossexuais e não o de diversidade sexual justamente
porque quero destacar que estamos diante de uma dinâmica centralizada nos discursos
homossexuais, que são facilmente assimilados pelo padrão liberal e heterossexual de
liberdade sexual, coadunando-se com o modo de produção capitalista.
Por isso, pergunto-me, desde antemão, se a estrutura do sistema jurídico,
sedimentada na tradição liberal, permite outros sentidos políticos que não são
compatíveis com o paradigma liberal, como a proposta de um “duplo fazer” do gênero e
da sexualidade (VIANNA & LOWENKRON, 2017).Segundo as autoras, existe uma relação
1 Utilizo aqui a sigla que julgo mais amplificada a respeito da diversidade de identidades dentro do universo
não heterossexual.

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