História do Direito e História da Sociedade: Questões de Método e Problemas de Pesquisa

AutorMario Sbriccoli
CargoUniversità di Macerata, Macerata, Itália
Páginas288-312
Recebido em: 17/07/2019
Revisado em: 23/05/2018
Aprovado em: 29/07/2019
http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2019v41n82p288
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História do Direito e História da Sociedade –
Questões de Método e Problemas de Pesquisa*
Legal History and History of Society – Methodological Issues and Research
Problems
Mario Sbriccoli1
1 Università di Macerata, Macerata, Itália
Resumo: Conferência pronunciada em abril de
1985 no contexto das discussões em torno das
relações entre história e ciências sociais promo-
vida pela chamada escola dos Annales. Como
construir pontes entre a história do direito e a
história da sociedade em termos de métodos e
problemas de pesquisa? Entendendo o direito
como a dimensão jurídica de fenômenos so-
ciais, Sbriccoli defende que o direito não pode
ser algo subsidiário em certas pesquisas sobre
práticas sociais e que os historiadores do direi-
to não podem se isolar, desdisciplinarizando-se,
embora mantendo a autonomia da área, para
dialogar com a história da sociedade, de modo
que possa acontecer um efetivo intercâmbio.
Em suma, “é preciso se tornar bilíngue para vi-
ver e operar em um mundo que é estruturalmen-
te bilíngue”.
Palavras-chave: História do Direito. História da
Sociedade. Escola dos Annales. Metodologia.
Abstract: This is a conference held in April
1985 in the context of the discussions on
relationships between history and social
sciences promoted by the so-called Annales
school. How can we build bridges between
legal history and history of society in terms of
research methods and problems? Understanding
law as the juridical dimension of social
phenomena, Sbriccoli argues that law cannot
be subsidiary in certain research on social
practices and that legal historians cannot isolate
themselves, they should desdisciplinarize
themselves, while maintaining the autonomy
of the area, in order to dialogue with history
of society, so that an effective exchange can
take place. In short, “it is necessary to become
bilingual to live and operate in a world that is
structurally bilingual”.
Keywords: Legal History. History of Society.
Annales School. Methodology.
*Storia del diritto e storia della società. Questioni di metodo e problemi di ricerca”,
publicado originalmente em GROSSI, Paolo (a cura di). Storia sociale e dimensione
giuridica$WWLGHOO¶LQFRQWURGLVWXGLR)LUHQ]H$SULOH0LODQR*LX൵Uq
p. 127-148. Tradução da língua italiana, resumo e palavras-chave por Ricardo Sontag.
Colaboração no ajuste das notas de rodapé: João Paulo Mansur.
1 In memoriam (1940-2005).
Seqüência (Florianópolis), n. 82, p. 288-312, ago. 2019 289
Mario Sbriccoli
1 Introdução
Quero dizer de imediato que, apesar do que possa parecer prome-
ter o título um pouco escolar que eu dei para estas minhas reflexões, que
não são congeniais a mim (e nem tão familiares assim) os discursos sobre
método. Eu devo lembrar a mim mesmo, inclusive, que eu nunca acreditei
muito neles, acrescentando que atravessamos um momento que deveria
nos induzir a crer pouquíssimo neles: aventurar-se em uma nova tentati-
va de apontar métodos significa, provavelmente, correr o risco de chegar
atrasado a um lugar do qual todos já foram embora há tempos.
Abordarei, então, algumas das questões de método colocadas por
outros, mas não serei eu a dizer o que deveria ser feito. Todo o meu dis-
curso servirá somente para advogar em favor de uma convicção que eu
tenho, e que talvez nem seria necessário defender, se considerarmos a sua
substancial obviedade. Refiro-me à convicção segundo a qual seria bom
realizar uma conexão mais forte entre história jurídica e história da socie-
dade, celebrando entre elas uma espécie de matrimônio de interesses, por
comodidade recíproca. Seria instituída, com isso, uma instrumentalidade
de mão dupla entre esses dois níveis, em uma relação de aproveitamento
recíproco perfeitamente equilibrado, no qual cada um deles dependeria,
em parte, dos préstimos do outro: excelente situação – para além do res-
tante, se não erro – para uma solidariedade duradoura, que me parece pos-
sível e que julgo necessária.
Paolo Grossi lamentou justamente a ausência do direito no elenco
das ciências sociais credenciadas e reconhecidas pela ‘nouvelle histoire’,
sublinhando o incompreensível paradoxo que vê essa corrente historio-
gráfica trabalhar praticamente todas as ciências do homem, exceto uma
única – o direito – que não é, certamente, nem a última e nem a menos
importante. Concordando inteiramente com o seu lamento, eu vou insistir,
igualmente, no descontentamento oposto, já que grande parte da historio-
grafia jurídica não esqueceu uma só das ciências sociais, mas acreditou
que podia prescindir de todas. Entre os historiadores do direito, é possível
constatar com frequência certa frieza em relação à ideia de prestar contas
com a história social (ou, como eu prefiro dizer, história da sociedade) e
alguma rigidez em relação à tarefa de fazer (também) história da socieda-

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