Imobiliário

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CONDOMÍNIO NÃO PODE UTILIZAR MEDIDAS NÃO PECUNIÁRIAS PARA PUNIR CONDÔMINO DEVEDOR

Superior Tribunal de Justiça

Recurso Especial n. 1.564.030/MG Órgão Julgador: 3a. Turma

Fonte: DJ, 19.08.2016

Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze

EMENTA

Recurso especial. Restrição imposta na convenção condominial de acesso à área comum destinada ao lazer do condômino em mora e de seus familiares. Ilicitude. Reconhecimento. 1. Direito do condômino de acesso a todas as partes comuns do edifício, independente

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de sua destinação. Inerência ao instituto do condomínio. 2. Descumprimento do dever de contribuição com as despesas condominiais. Sanções pecuniárias taxativamente previstas no código ci-vil. 3. Idôneos e eficazes instrumentos legais de coercibilidade, de garantia e de cobrança postos à disposição do condomínio. Observância. Necessidade. 4. Medida restritiva que tem o único e espúrio propósito de expor ostensivamente a condição de inadimplência do condômino e de seus familiares perante o meio social em que residem. Desbordamento dos ditames do princípio da dig-nidade humana. Verificação. 5. Recurso especial improvido. 1. O direito do condômino ao uso das partes comuns, seja qual for a destinação a elas atribuídas, não decorre da situação (circunstancial) de adimplência das despesas condominiais, mas sim do fato de que, por lei, a unidade imobiliária abrange, como parte inseparável, não apenas uma fração ideal no solo (representado pela própria unidade), bem como nas outras partes comuns que será identificada em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio (§ 3º do art. 1.331 do Código Civil). Ou seja, a propriedade da unidade imobiliária abrange a correspondente fração ideal de todas as partes comuns. A sanção que obsta o condômino em mora de ter acesso a uma área comum (seja qual for a sua destinação), por si só, desnatura o próprio instituto do condomínio, limitando, indevidamente, o correlato direito de propriedade. 2. Para a espe-cífica hipótese de descumprimento do dever de contribuição pelas despesas condominiais, o Código Civil impõe ao condômino inadimplente severas sanções de ordem pecuniária, na medida de sua recalcitrância. 2.1 Sem prejuízo da sanção prevista no art. 1.336, § 1º, do Código Civil, em havendo a deliberada reiteração do comportamento fal-toso (o que não se confunde o simples inadimplemento involuntário de alguns débitos), instaurando-se permanente situação de inadimplência, o Código Civil estabelece a possibilidade de o condomínio, mediante deliberação de ¾ (três quartos) dos condôminos restan-tes, impor ao devedor contumaz outras penalidades, também de caráter pecuniário, segundo gradação proporcional à gravidade e à repetição dessa conduta (art. 1.337, caput e parágrafo único - multa pecuniária correspondente até o quíntuplo ou até o décuplo do valor da respectiva cota condominial). 2.2 O art. 1.334, IV, do Código Civil apenas refere quais matérias devem ser tratadas na convenção condominial, entre as quais, as sanções a serem impostas aos condôminos faltosos. E nos artigos subsequentes, estabeleceu-se, para a específica hipótese de descumprimento do dever de contribuição com as despesas condominiais, a imposição das sanções pecuniárias acima delineadas. Inexiste, assim, margem discricionária para outras sanções, que não as pecuniárias nos limites da lei. 3. Além das sanções pecuniárias, a lei adjetiva civil, atenta à essencialidade do cumprimento do dever de contribuir com as despesas condominiais, estabelece a favor do condomínio efetivas condições de obter a satisfação de seu crédito, inclusive por meio de procedimento que privilegia a celeridade. 3.1 A Lei n. 8.009/90 confere ao condomínio uma importante garantia à satisfação dos débitos condominiais: a própria unidade condominial pode ser objeto de constrição judicial, não sendo dado ao condômino devedor deduzir, como matéria de defesa, a impenhorabilidade do bem como sendo de família. E, em reconhecimento à premência da satisfação do crédito relativo às despesas condominiais, o Código de Processo Civil de 1973, estabelecia o rito mais célere, o sumário, para a respectiva ação de cobrança. Na sistemática do novo Código de Processo Civil, aliás, as cotas condominiais passaram a ter natureza de título executivo extraju-dicial (art. 784, VIII), a viabilizar, por conseguinte, o manejo de ação executiva, tornando a satisfação do débito, por meio da incursão no patrimônio do devedor (possivelmente sobre a própria unidade imobiliária) ainda mais célere. Portanto, diante de todos esses instru-mentos (de coercibilidade, de garantia e de cobrança) postos pelo ordenamento jurídico, inexiste razão legítima para que o condomínio dele se aparte. 4. A vedação de acesso e de utilização de qualquer área comum pelo condômino e de seus familiares, independentemen-te de sua destinação (se de uso essen-cial, recreativo, social, lazer, etc), com o único e ilegítimo propósito de expor ostensivamente a condição de inadimplência perante o meio social em que residem, desborda dos ditames do princípio da dignidade humana. 5. Recurso especial improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 09 de agosto de 2016 (data do julgamento).

MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:

Condomínio do Conjunto Residencial Maria Stella interpõe o presente recurso especial fundado na alínea a do permissivo constitucional em contrarie-dade ao aresto proferido, à unanimidade de votos, pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim ementado:

Apelação cível. Ação declaratória c/c indenizatória. Condômino inadimplente. Sanções pecuniárias previstas

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em lei. Restrições à utilização de área comum. Impossibilidade. Majoração de honorários advocatícios.

- É ilícita a prática de privar o condômino inadimplemente do uso de áreas comuns do edifício destinadas ao lazer, eis que os meios de coerção ao cumprimento da obrigação de adimplir a taxa condominial são estritamente aqueles pecuniários previstos em lei.

- Em ações de cunho condenatório, os honorários advocatícios devem ser arbitrados no patamar de 10 e 20% sobre o valor da condenação, mediante apreciação equitativa do juiz, observa-dos o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a nature-za e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado, bem como o tempo exigido para o seu serviço, na forma do art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil.

Subjaz ao presente recurso especial ação declaratória com pedido indenizatório promovida, em 20/11/2011, por (...) contra Condomínio do Conjunto Residencial Maria Stella, tendo por propósito seja "o condomínio demandado compelido a cessar com os procedimentos humilhantes e degradantes impostos por ele na cobrança das taxas condominiais de 2008 e 2009, pois, como já dito, ele tem as vias judiciais para cobrá-las, requerendo ainda, seja declarado o direito da autora (e de seus familiares) de usar o clube do condomínio, especialmente porque ela está em dia, reitere-se, com as taxas vincendas e que tal proibição não tem amparo le-gal, requerendo finalmente seja o con-domínio condenado em indenizá-la em R$ 100.000,00 a título de danos morais, dada a gravidade dos fatos, com juros e correção monetária" (e-STJ, fis. 1-4).

Citado, o condomínio infirmou in totum a pretensão posta na inicial. Aduziu que o período de inadimplência é maior do que reconhecido pela demandante (2006/2008). Argumentou, outrossim, a licitude da proibição pre-vista no regimento interno, assim como no regimento do clube, de o condômino inadimplente e seus dependentes frequentarem a sede social e suas dependências, bem como de participar das reuniões sociais, esportivas e demais promoções. Argumentou, no ponto, que, "além de possuir caráter punitivo, a imposição de restrição a condômino inadimplente visa a compelir que o mesmo efetue todos os pagamentos devidos, de forma a saldar todos os débi-tos em aberto e ficar em dia com as suas obrigações condominiais". Insurgiu-se contra o pedido de indenização por danos morais, pois "em nenhum momento a cobrança das taxas condominiais foi vexatória ou discriminatória, tendo o condomínio réu observado atentamente a lei e ainda o disposto em seu Regimento Interno, conforme comprova, inclusive, a Notificação Extrajudicial Conciliatória juntada pela mesma à...

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