Importância da perícia biopsicossocial como ferramenta na consecução do direito previdenciário à população idosa

AutorAna Paula Fernandes e Anderson G. Ramos
Páginas130-150

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Ana Paula Fernandes92

Anderson Grimminger Ramos93

1. Introdução

O aumento da população idosa repercute mundialmente nos sistemas de Previdência, Assistência e Saúde em razão do elastecimento dos períodos de labor requeridos para concessão de benefícios de aposentadoria. No Brasil, essa tríade de ações é denominada Seguridade Social e visa à proteção do indivíduo nos diversos riscos sociais aos quais este passa a estar exposto ao longo da vida.

A idade avançada é um destes riscos, o qual pode ser experimentado por um segurado conjuntamente com outros, como incapacidade parcial, incapacidade permanente, acidente de trabalho ou, ainda, depois do acidente, a redução de força ou agilidade para desempenho de determinada função.

Se a incapacidade já é um problema grave que atinge a população em geral, o que se diz da incapacidade quando esta atinge a pessoa idosa, já naturalmente mais vulnerável às limitações de saúde e acometimento de doenças sistêmicas.

O presente estudo visa evidenciar esta problemática, apontando os pormenores que o ato perícial deve observar ao analisar esta parcela da população, com a finalidade de atingir o fim social ao qual se destina a proteção dos riscos sociais.

No cenário atual, muitos idosos permanecem no ambiente de trabalho ou retornam para ele a fim de complementar sua renda ou se sentirem ativos na sociedade. Isso nos últimos anos levou a um aumento de idosos buscando benefícios previdenciários. Contudo, há também aqueles que por alguma infelicidade não completaram os requisitos mínimos para concessão de benefícios previdenciários, vindo no fim da vida a depender de benefícios assistenciais.

Tem a perícia biopsicossocial importante tarefa nesta missão, isso porque esta qualidade perícial respeita a interação entre doença, incapacidade laboral, condições mentais, psicológicas e socioambientais.

Contudo, a perícia biopsicossocial ainda enfrenta diversas limitações e resistências por parte tanto do Poder Judiciário, como dos profissionais de perícia médica, os quais nem sempre estão abertos à adoção de inovações na metodologia perícial a ser realizada de modo multiprofissional.

2. Conceito de idoso e o envelhecimento no Brasil

O Brasil passou por uma significativa transformação demográfica nas décadas de 60 e 70. De extensas famílias rurais para pequenas famílias urbanas, cujo número de filhos não é nem de longe suficiente para manutenção do equilíbrio de um sistema previdenciário fundado no pacto Intergeracional.

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A transição demográfica inicia com a redução das taxas de mortalidade e, depois de um tempo, com a queda das taxas de natalidade, provocando significativas alterações na estrutura etária da população (ALVES, 2008).

Assim, o que temos é que o número de idosos cresce vertiginosamente, enquanto o de crianças diminui de modo significativo.

Se, no aspecto sociocultural, o número reduzido de filhos remete a uma população mais madura que planeja o futuro dentro de suas possibilidades, no aspecto previdenciário, é uma bandeira flamejante que aponta para necessárias mudanças, ou seja, o sistema atual em breve não será capaz de atender às suas próprias necessidades.

Mas, para além disso, outro problema exsurge aos olhos da sociedade. O que faremos com tantos idosos? Pergunta esta que se desdobra em duas situações distintas. Tanto aqueles que estão no mercado de trabalho quanto aqueles que se encontram aposentados demandam políticas públicas e reconhecimento social direcionados.

Suas características pessoais advindas da idade avançada, necessidades físicas, psicológicas e biológicas exigem comportamentos e atenção diferenciados por parte do Governo, seja em saúde, em assistência e até mesmo em previdência.

Essas alterações têm ocorrido rapidamente, exigindo uma resposta rápida e adequada que não se realizará sem a intervenção do Estado por meio da implantação e implementação de políticas públicas fundamentais (BRITO, 2007).

O que se observa é que, os textos apresentados até o momento com propostas de reformas à legislação previdenciária aventam a ideia de que o segurado da Previdência deve trabalhar mais, ou seja, por um maior número de competências. Logo, começar a trabalhar jovem não será mais motivo de aposentadoria precoce, uma vez que a implantação da idade mínima no Regime Geral da Previdência Social - RGPS é uma proposta de alteração que vem flertando com o Congresso Nacional há tempos.

Contudo, se até o momento a imposição da idade mínima no RGPS não tinha vingado, agora sob o argumento do déficit do caixa previdenciário ela tem ganhado monta e vem sendo veementemente defendida por muitos legisladores, doutrinadores e economistas de cunho liberal.

Em resumo, quem começa a trabalhar cedo no Brasil, na sua grande maioria integrantes de famílias humildes, cujos filhos iniciam a vida laboral antes mesmo da maioridade civil, vão trabalhar mais tempo sob a pseudopromessa de um coeficiente melhor no cálculo de seu salário de benefício. Lembrando que com número de filhos reduzido estes idosos tendem a arcar sozinhos com sua vulnerabilidade biopsicossocial futura.

A questão aqui é: trabalhar mais significa exercer atividade laboral até idade avançada, mas em quais condições? E neste ponto residem importantes considerações. O ambiente laboral no Brasil é hígido? Há uma efetiva fiscalização no cumprimento das Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde? Ou, ainda, há uma política efetiva e segura de reabilitação profissional? Nossos segurados possuem acesso adequado ao tratamento de suas enfermidades, sejam elas advindas de doenças ocupacionais, profissionais, acidentárias ou orgânicas?

As respostas a todas estas perguntas justificam a preocupação dos juristas, professores, médicos e doutrinadores do Direito Previdenciário, no que se refere à fixação da idade mínima em 65 anos para homens e mulheres (proposta original PEC n. 287) ou 65 anos para homens e 62 para mulheres (substitutivo da Reforma).

A expectativa de vida em alguns estados brasileiros não alcança a marca dos 65 anos. Um dado alarmante demonstra que, embora seja um País de extensão continental, não possui agentes políticos capazes de criar e aplicar políticas públicas que atendam a população com isonomia.

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O fato é que o Brasil e por, consequência, o sistema de Previdência, terá que se preparar para um número muito maior de idosos no mercado de trabalho. Não há dúvida de que eles inspiram medidas diferentes daquelas utilizadas com jovens e adultos.

Essa é uma questão importante a ser analisada para que se mantenha a coerência, a igualdade de oportunidades e a isonomia na aplicação das normas.

Com base nas análises estatísticas, o Brasil será o País com uma das maiores populações mundiais. Segundo Brito (2008):

As projeções indicam que em 2050 "a população brasileira será de 253 milhões de habitantes, a quinta maior população do planeta, abaixo apenas da índia, China, EUA e Indonésia". Terão se passado menos de 40 anos entre 2005, quando a taxa de fecundidade total do país atingiu 2,1 filhos por mulher (nível para se alcançar um crescimento demográfico sustentado nulo) e o período de crescimento verdadeiramente nulo da população brasileira.

O que vemos, portanto, é a confirmação estatística da redução do número de jovens e aumento do número de idosos. E, assim, a preocupação com a qualidade deste envelhecimento começa a figurar nos principais temas de debate acerca de sustentabilidade do sistema previdenciário brasileiro, conforme assevera Kalache (2008):

O envelhecimento populacional traz consigo problemas de saúde que desafiam os sistemas de saúde e de previdência social. Envelhecer não significa necessariamente adoecer. A menos que exista doença associada, o envelhecimento está associado a um bom nível de saúde. Além disso, os avanços no campo da saúde e da tecnologia permitiram para a população com acesso a serviços públicos ou privados adequados, uma melhor qualidade de vida nessa fase. Com isso, é fundamental investir em ações de prevenção ao longo de todo o curso de vida, em virtude do seu potencial para "resolver os desafios de hoje e, de forma crescente, os de amanhã".

Configurar quem é idoso não é tarefa fácil, isso porque o Brasil e o mundo ainda discutem conceitos e enquadramentos acerca desta parcela da população.

Ao conceituar o vocábulo "idoso", deve-se entender que o conceito pode variar de acordo com os parâmetros a serem adotados ou conforme os objetivos a serem buscados. Em sua obra, Brito ressalta a conceituação da pessoa idosa em diversos países:

De acordo com VIEIRA e NASCENTES em 1930, definiam-se como pessoas idosas aquelas que possuíam mais de 50 anos. Em 1945, o demógrafo Alfred Sauvy atribuía tal vocábulo àqueles com mais de 60 anos. Em 1978, na obra "A França enrugada", o termo idoso é destinado àqueles com mais de 75 anos.

Idoso, segundo DINIZ (1998), é aquele que já ingressou na velhice e que já apresenta declínio nas funções físicas emocionais e intelectuais ( DINIZ, 2007, p. 15)

KRAUSE (1994) define idoso o indivíduo na faixa etária de 65 anos e mais. Entretanto, o número crescente de pessoas ativas e sadias, no extremo jovem do espectro de envelhecimento, levou à necessidade de agrupamentos etários mais definitivos. Assim, os grupos específicos de idade, de 65 a 75 anos e de 75 anos e mais, são geralmente mencionados como o de "idoso jovem", e de idoso velho", respectivamente, ou os "envelhecidos" e os idosos" A OMS...

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