A impossibilidade de decretação, de ofício, da prisão preventiva em um processo penal parametrizado pelo sistema acusatório

AutorLenio Luiz Streck - Jorge Bheron Rocha - Gina Ribeiro Gonçalves Muniz
CargoUniversidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, RS, Brasil. Doutor em Direito do Estado - Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil. Doutorando em Direito Constitucional - Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal. Mestre em Ciência Jurídico Criminais
Páginas139-156
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A IMPOSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO, DE OFÍCIO,
DA PRISÃO PREVENTIVA EM UM PROCESSO PENAL
PARAMETRIZADO PELO SISTEMA ACUSATÓRIO
THE IMPOSSIBILITY OF DECREE, EX OFFICIO, OF PREVENTIVE
DETENTION IN A CRIMINAL PROCESS PARAMETERIZED BY THE
ACCUSATORY SYSTEM
Lenio Luiz StreckI
Jorge Bheron RochaII
Gina Ribeiro Gonçalves MunizIII
Resumo: O presente artigo visa discorrer sobre a influência
do sistema acusatório nas prisões preventivas previstas
no processo penal brasileiro. Para além de reconhecer a
relevância do sistema acusatório, impõe-se hoje o desafio
de garantir a efetividade da diretriz constitucional dele
emanada e evitar que ranços inquisitórios conduzam a um
processo penal autoritário e repressivo. Utilizou-se o método
fenomenológico-hermenêutico, que procura revolver o chão
linguístico acerca do objeto aqui estudado, buscando explorar
um debate jurídico, a fim de interpretá-lo e contextualizá-lo.
Também, revisitou-se bibliografias para sustentar o argumento
principal: A decretação de prisão preventiva ou qualquer
outra medida cautelar sem requerimento do Ministério
Público (parte acusadora/investigadora) ou mesmo sem
representação da autoridade policial (parte investigadora)
caracteriza resquício do sistema inquisitório, pois traz ínsita
a ideia da aposta na “boa escolha” do magistrado, maior e
melhor e melhor que as partes.
Palavras-chave: Penal. Processo Penal. Sistema acusatório.
Prisão decretada de ofício.
Abstract: is article aims to discuss the influence of the
accusatory system in the preventive prisons provided for in
the Brazilian criminal process. In addition to recognizing the
relevance of the accusatory system, the challenge today is to
guarantee the effectiveness of the constitutional guideline
emanating from it and to prevent inquisitorial rancidity
from leading to an authoritarian and repressive criminal
process. e phenomenological-hermeneutic method was
used, which seeks to revolve the linguistic ground about
the object studied here, seeking to explore a legal debate in
DOI: http://dx.doi.org/10.31512/rdj.v22i42.412
Recebido em: 24.05.2021
Aceito em: 22.12.20221
I Universidade do Vale do Rio dos Sinos,
São Leopoldo, RS, Brasil. Doutor em
Direito do Estado.
II Escola Superior da Magistratura do
Estado do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil.
Doutorando em Direito Constitucional.
III Universidade de Coimbra, Coimbra,
Portugal. Mestre em Ciência Jurídico
Criminais.
140 Revista Direito e Justiça: Reflexões Sociojurídicas
Santo Ângelo | v. 22 | n. 42 | p. 139-156 | jan./abr. 2022 | DOI: http://dx.doi.org/10.31512/rdj.v22i42.412
order to interpret and contextualize it. Also, bibliographies
were revisited to support the main argument: e decree of
preventive detention or any other precautionary measure
without the requirement of the Public Ministry (accusing
/ investigating party) or even without representation from
the police authority (investigating party) characterizes the
inquisitorial system, because it brings with it the idea of
betting on the “good choice” of the magistrate, bigger and
better and better than the parties.
Keywords: Criminal. Criminal Proceedings. Accusatory
system. Prision decree by office.
1 Considerações iniciais
O
presente artigo visa discorrer sobre a influência do sistema acusatório nas prisões
preventivas previstas no processo penal brasileiro. Para além de reconhecer a
relevância do sistema acusatório, impõe-se hoje o desafio de garantir a efetividade da diretriz
constitucional dele emanada e evitar que ranços inquisitórios conduzam a um processo penal
autoritário e repressivo.
Para assegurar o pleno desenvolvimento da atividade jurisdicional do Estado, o
ordenamento permite que se prive alguém de sua liberdade. Por estar em xeque a proteção a
um direito fundamental, é necessário delinear com precisão os termos em que tal instrumento
acautelatório será cabível, de modo a harmonizar as finalidades do processo penal dentro de uma
perspectiva constitucional (DIAS, 2004, p. 74 e ss), convencional (HASSAMER, 2003, p. 114)
e humanitária (LOPES JR, 2014, p. 13).
A regra é responder ao processo em liberdade e a prisão preventiva ser uma exceção, que
somente deve ser aplicada com fins endoprocessuais e em caráter subsidiário, ou seja, quando
a questão não encontrar guarida em outra medida cautelar e for estritamente necessária para a
privação da liberdade.
Com efeito, na dialética que se estabelece entre os fundamentos para uma prisão provisória
e para a manutenção da liberdade individual, percebe-se que “a garantia e o exercício da liberdade
individual não necessitam de qualquer legitimação, em face de sua evidência” (TAVARES, 2003,
p. 162). Vislumbra-se, entretanto, no cotidiano judicial brasileiro, uma verdadeira banalização
das prisões preventivas, aplicadas muitas vezes com cariz de pena antecipada, para suprir
a ineficiência estatal no seu papel de garantir a segurança pública da sociedade e combater a
criminalidade.
Tão importante quanto a existência do processo penal, é a forma como ele é concretizado.
Não se pode vislumbrar o processo penal apenas como meio de defesa e restabelecimento

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