O imposto sobre produtos industrializados (IPI) e o agronegócio

AutorLeonardo Furtado Loubet
Ocupação do AutorAdvogado. Especialista e Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP. Professor- Conferencista do IBET ? Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (nacional)
Páginas287-362
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CAPÍTULO 3
O IMPOSTO SOBRE PRODUTOS
INDUSTRIALIZADOS (IPI) E O AGRONEGÓCIO
3.1
Bases constitucionais do IPI: breves considerações
A Constituição da República elencou dentro das sete
competências possíveis para instituição de impostos federais
a criação, no art. 153, IV, de imposto sobre “produtos indus-
trializados”. Esse é o fundamento de validade do denomina-
do IPI. Trata-se de um tributo de grande relevância para a
União Federal, imposto esse que – como quase tudo no direito
– apresenta alguns pontos a serem enfrentados, de modo a ser
bem compreendido.
Nada obstante a forma lacônica com que o constituinte se
referiu a esse imposto, o art. 153, § 3º, estabelece ainda que,
em relação ao IPI, deverá ser observado o seguinte: (i) o im-
posto será seletivo, em função da essencialidade do produto;
(ii) será não cumulativo, compensando-se o que for devido em
cada operação com o montante cobrado nas anteriores; (iii)
não incidirá sobre produtos industrializados destinados ao
exterior; (iv) e terá reduzido seu impacto sobre a aquisição de
bens de capital pelo contribuinte do imposto, na forma da lei.
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LEONARDO FURTADO LOUBET
Essa a roupagem constitucional do IPI. Pelo que se pode
notar dessas palavras iniciais, a exação em análise recai, em
regra, sobre o setor industrial, uma vez que somente os agen-
tes econômicos que se dedicam a essas atividades dão origem
a “produtos industrializados”. Na verdade, o IPI, que veio a
substituir o imposto sobre consumo com a Reforma Tributária
estampada na Emenda Constitucional 18/65 à Carta de 1946,
juridicamente incide sobre a produção de bens manufatura-
dos, isto é, no início da cadeia produtiva, muito embora econo-
micamente repercuta na massa consumidora como um todo.
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O querer da Constituição é que esse imposto – que, como
sua hipótese de incidência sugere, abarca uma considerável
parcela do ciclo econômico – tenha seu peso mitigado, de ma-
neira que a influência do tributo no preço dos produtos seja,
ao menos, controlada pelo Poder Público. Os mecanismos ju-
rídicos para que esse objetivo político-social se concretize são
justamente a tributação seletiva, segundo o caráter essencial
do produto envolvido; o estabelecimento da técnica da não
cumulatividade, para que não ocorra o chamado “efeito cas-
cata”; a imunidade dos produtos industrializados exportados;
e a redução da carga tributária em face da aquisição de bens
de capital a serem empregados pelos industriais.
Acontece, no entanto, que as coisas não são tão simples
como parecem. Cada um desses aspectos mencionados apre-
senta uma peculiaridade a ser devidamente aquilatada, a
começar pela própria materialidade, que reflete na sujeição
passiva, obviamente. Isto porque a definição precisa do que
vem a ser “industrializar produtos” requer um trabalho exe-
gético consistente, sob pena de acarretar a perigosa invasão
248. Talvez por essa razão, Sacha Calmon Navarro Coêlho afirme que “o IPI conti-
nua a ser, financeiramente, imposto sobre o consumo de bens industrializados (...)”.
In: “Curso de direito tributário brasileiro”. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p.
292. Sobre o histórico do imposto sobre consumo, inclusive com farta remissão dou-
trinária, vide ELALI, André. Comentários ao Código Tributário Nacional. Coord.
Marcelo Magalhães Peixoto e Rodrigo Santos Masset Lacombe. São Paulo: MP Edi-
tora, 2005, p. 372/373.
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TRIBUTAÇÃO FEDERAL NO AGRONEGÓCIO
de competência de um ente federado por outro, em especial
no que toca ao imposto sobre serviços (ISS).
Seguindo convictamente a trilha metodológica delineada
no início desta pesquisa, não se terá a pretensão, a todo sentir,
de adentrar em todos os meandros que envolvem o IPI. Isso é
tarefa para trabalho de maior fôlego, tendo o imposto em refe-
rência como propósito privativo.249 O escopo destas reflexões
é trazer os principais aspectos desse imposto, como a mate-
rialidade, a base de cálculo, a sujeição passiva, a seletividade,
a não cumulatividade e a variação de alíquotas, procurando
respondê-los de maneira alicerçada nas bases constitucionais
que regem a tributação brasileira. Esse é um passo indispen-
sável porque o IPI interessa também ao agronegócio, cerne
deste estudo, já que incide sobre as atividades das agroindús-
trias. Destarte, se o IPI e o agronegócio guardam relação, me-
recendo ser investigado, então é fundamental que, antes, se-
jam circunscritos os pontos cardeais desse imposto, para que
somente aí o raciocínio seja direcionado à incidência dessa
exação em face do agronegócio especificamente.
3.1.1 Conotação constitucional: a materialidade e a
base de cálculo possíveis no IPI
Malgrado algumas divergências na doutrina, um exame
atilado dos enunciados constitucionais leva o hermeneuta à
conclusão de que a Carta da República não criou tributos, pelo
contrário, limitou-se a dar competência legislativa aos entes
federados para que, querendo, venham a instituí-los – obvia-
mente que desde que mediante lei. Isso significa que é da pró-
pria Constituição que se deduz o arcabouço tributário brasi-
leiro. Não por outro motivo Roque Antonio Carrazza defende
249. Dentre inúmeros escritos envolvendo o IPI, vale ser citado o trabalho do Prof.
Eduardo Domingos Bottallo, até mesmo pelo prestígio granjeado pela obra junto à
comunidade científica. Fundamentos do IPI: imposto sobre produtos industrializa-
dos. São Paulo: Ed. RT, 2002.

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