O imposto sobre propriedade territorial rural (ITR) e o agronegócio

AutorLeonardo Furtado Loubet
Ocupação do AutorAdvogado. Especialista e Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP. Professor- Conferencista do IBET ? Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (nacional)
Páginas363-428
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CAPÍTULO 4
O IMPOSTO SOBRE PROPRIEDADE TERRITORIAL
RURAL (ITR) E O AGRONEGÓCIO
4.1
Critérios jurídicos para se tributar a propriedade imo-
biliária: divisor entre imóvel rural e imóvel urbano
Há, na Carta Constitucional, um catálogo recheado de fa-
tos que o constituinte entendeu representarem manifestação
de riqueza por parte das pessoas, razão pela qual os colocou
sujeitos à possibilidade de tributação. São diversas as hipóte-
ses tributáveis, como a importação, a exportação, a renda, a
industrialização, as operações financeiras, a transmissão de
bens por herança, as operações mercantis, a prestação de ser-
viços, a transmissão de imóveis inter vivos, o faturamento, a
receita, dentre outros.
Um fato-signo presuntivo de riqueza que não poderia fi-
car de fora desse rol é a propriedade. Realmente, talvez não
haja situação jurídica mais objetiva para caracterizar a capa-
cidade contributiva do indivíduo do que a propriedade, por-
que esse direito representa a incorporação ao acervo jurídico
da pessoa, que dele poderá usar, gozar e dispor. Além disso, a
propriedade é avaliável economicamente, de tal sorte que so-
bre esse direito é perfeitamente possível recair o tributo. Foi
com essa convicção que o constituinte conferiu competência à
União para tributar a propriedade territorial rural (ITR), aos
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LEONARDO FURTADO LOUBET
Estados e ao Distrito Federal para gravarem a propriedade
de veículos automotores (IPVA) e aos Municípios e ao Distri-
to Federal para onerarem a propriedade predial e territorial
urbana (IPTU).
O cerne das preocupações agora é, justamente, o “im-
posto sobre propriedade territorial rural”, capitulado como de
competência federal no art. 153, VI, do Texto Magno.
Dado o corte metodológico empreendido no início deste
estudo, que se lançou a identificar, demarcar e sistematizar a
tributação que incide sobre o agronegócio, não haveria como
o imposto que recai sobre a propriedade imobiliária nesse se-
tor deixar de ser investigado. Muito embora nem todos os pro-
prietários de imóveis rurais dediquem-se, necessariamente,
às atividades rurais (pois podem empreender no ecoturismo,
por exemplo), a verdade é que aqueles que exploram o seg-
mento econômico do agronegócio o fazem em imóveis rurais,
justificando, pois, a perquirição dessa figura tributária.286
Diante disso, é fundamental fixar as bases científicas que
permitam identificar os critérios jurídicos para tributação so-
bre a propriedade imobiliária, divisando imóveis rurais de ur-
banos. Essa é uma empreitada inicial de que não se pode abrir
mão, haja vista que a Constituição outorgou competência tri-
butária para exigência de imposto sobre propriedade imobi-
liária rural à União e sobre propriedade imobiliária urbana
aos Municípios, recomendando, pois, uma análise acurada em
torno desse tema, a fim de se evitar conflitos de competên-
cia. A propósito, o IPTU e o ITR são dos poucos tributos que
apresentam esse aspecto problemático no critério espacial da
regra-matriz de incidência tributária, o que, por sua vez, re-
percute na própria fixação da competência tributária.287
286. Não é demais lembrar que, para fins de imposto sobre a renda, o indivíduo
pode se sujeitar ao IRPF ou ao IRPJ incidentes sobre a atividade rural, mas isso
não significa que, necessariamente, suas atividades sejam desenvolvidas em imóvel
rural, como já destacado neste estudo.
287. Sobre o histórico da competência sobre a tributação de “imóveis rurais” e
“imóveis urbanos”, vide Aires Barreto. Curso de direito tributário municipal. São
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TRIBUTAÇÃO FEDERAL NO AGRONEGÓCIO
Sobremais, não se pode deixar de registrar – com o devi-
do respeito – que tem havido uma considerável dose de con-
fusão nessa matéria em certos setores da doutrina e também
em precedentes dos Tribunais. Portanto, antes de partir para
análise da materialidade, da sujeição passiva e do critério
quantitativo do ITR, é o caso de averiguar adequadamente a
própria competência tributária.288
O art. 153, VI, da Constituição Federal limita-se a prever
que compete à União instituir impostos sobre “propriedade
territorial rural”. Não há, na Carta da República, um enuncia-
do que defina o que deve ser entendido por “imóvel rural”. De
outra parte, o art. 156, I, da Constituição prescreve caber aos
Municípios e ao Distrito Federal criarem impostos sobre “pro-
priedade predial e territorial urbana”. Também não há na Lei
Fundamental um dispositivo conceituando “imóvel urbano”.
De fato, não aparece na Constituição Federal o conceito
de “imóvel rural”, nem muito menos de “imóvel urbano”. Não
há esse conceito e nem deveria existir mesmo. É que a Carta
Constitucional – isso já foi dito neste trabalho – não é um texto
lexicográfico, que necessite de um glossário para ser adequa-
damente compreendido.
Há um mínimo de significação nas palavras usadas pela
Constituição, um núcleo semântico básico que não pode ser
desprezado pelo exegeta. Ninguém há de questionar que uma
Paulo: Saraiva, 2009, p. 175/178.
288. É voz corrente na doutrina que o ITR é um imposto pouco estudado. Nesse
sentido são as palavras de Misabel Derzi no prefácio à obra de Luciano Dias Bica-
lho Camargos: “Em primeiro lugar, a literatura jurídica se ressente da ausência qua-
se total de estudos sistemáticos relacionados ao Imposto Territorial Rural. Coinciden-
temente, o desinteresse da Dogmática Jurídica por tal espécie de imposto coincide ou
é evidência sintomática de sua utilização deficiente e pouco eficaz. Dá-se um círculo
vicioso, que é preciso romper”. In: “O imposto territorial rural e a função social da
propriedade”. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. XII. A anemia jurídica sobre essa
matéria talvez se explique porque a própria União não tem dado mostras de que se
preocupa muito com o ITR. Tanto assim é que a fiscalização e a arrecadação do im-
posto, de acordo com a ordem jurídica em vigor, podem até mesmo ser delegadas,
conforme será visto adiante. Contudo, a verdade é que há muito a ser dito sobre
esse imposto.

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