Inconstitucionalidade de Lei Francesa que Proíbe o Uso da Burca e do Nikab em Espaços Públicos. Um Olhar Sobre a Constituição Francesa e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem

AutorSaddam Harb Mohamad - Pietro Nardella Dellova
CargoPalestino, estudante de Direito da Universidade Federal do Rio Grande, FURG - Judeu, orientador do presente Artigo, é Professor de Direito Civil e de Direitos Humanos
Páginas291-306
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Revista Logos | Edição 1/2015
Inconstitucionalidade de Lei Francesa que proíbe o
uso da burca e do nikab em espaços públicos. Um
olhar sobre a Constituição Francesa e a Convenção
Europeia dos Direitos do Homem1
Saddam Harb Mohamad
Palestino, estudante de Direito da Universidade Federal do Rio Grande, FURG
Pietro Nardella Dellova
Judeu, orientador do presente Artigo, é Professor de Direito Civil e de Direitos
Humanos. Doutoramento (em curso) em Ciências Jurídicas e Sociais (com a
tese A Tessitura dos Direitos Humanos no Direito Civil). Mestre em Direito pela
USP. Mestre em Ciências da Religião pela PUC/SP. Pós-graduado em Direito
Civil e em Literatura. Formado em Direito e em Literatura. Apoiador do Gruppo
Martin Buber (Roma) para o diálogo entre israelenses e palestinos.
Resumo1
A promulgação de uma lei que proíbe as mulheres francesas de usar a Burca e o
Nikab colocou em destaque uma polêmica sobre como deve o Estado agir para garantir
a liberdade, a dignidade e o bem-estar de seus cidadãos. O presente artigo pretende
demonstrar a inconstitucionalidade da aprovação da lei que proíbe o uso da Burca e
do Nikab na França, usando como fontes a própria Constituição Francesa vigente e a
Convenção Européia dos Direitos do Homem e por fim, uma breve análise sob a óptica
dos Direitos Humanos e como que esta lei o viola.
Palavras Chave: Burca, Nikab, Constituição Francesa, Convenção Europeia dos
Direitos do Homem, Direitos Humanos.
Abstract
The recent law that bans women from wearing full-cover veil in France has raised
controversy over the way the State must act to ensure people´s freedom, dignity and
well-being. the present work aims to demonstrate the unconstitutionality of the passage
of the law prohibiting the use of Burca and Nikab in France, using as sources the very
current French constitution and the European Convention of men’s rights and, finally, a
brief analysis from the perspective of Human rights and how this law to violate.
Key words: Burca, Nikab, French Constitution, European Convention on Human
Rights, Human Rights.
1 – O resumo do presente Artigo foi inscrito e aprovado para a 14ª Mostra de produção Universitária - FURG
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Inconstitucionalidade de Lei Francesa que Proíbe o Uso da Burca
e do Nikab em Espaços Públicos. Um Olhar Sobre a Constituição
Francesa e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem
Introdução
Em minha opinião, a história é feita por homens e mulheres, e do mesmo modo ela
também pode ser desfeita e reescrita, sempre com vários silêncios e elisões, sempre com
formas impostas e desfiguramentos tolerados, de modo que o “nosso” Leste, o “nosso”
Oriente, possa ser dirigido e possuído por “nós” ( SAID, 2010, p. 14).
Nos dias atuais, o convívio com a diversidade torna-se cada vez mais frequente. Dessa
maneira, desafios são postos para se lidar com a diferença, principalmente no momento que
visões de mundo se destacam, mas a intimidade corporal e as interações cotidianas as
põem em constante contato. Os muçulmanos da França, por exemplo, mostram-se como
um objeto de estudo extremamente rico. Pois, a França tem uma tradição de pensar sobre
si, de produzir reflexões e explicações ao mundo sobre seus próprios desafios.
Ao falarmos da França, logo vem à cabeça imagens como a guilhotina, a queda
da bastilha e palavras como liberdade igualdade e fraternidade; um país que foi palco de
revoltas por direitos, que inspirou colônias na América a buscarem sua emancipação.
Com toda uma história de emancipação dos povos, estranhamente, agora, promove atos
legais de censura à vestimenta muçulmana feminina como a Burca e o Nikab. É disso
que trata a presente reflexão.
A óptica ocidental em relação ao lugar ocupado pela mulher em uma sociedade
islâmica é completamente equivocada, recheada de julgamentos falaciosos e generalistas,
e que não levam em consideração os valores morais e religiosos da cultura islâmica. A
visão equivocada do Ocidente e, agora, em especial, da França, não permite ver que para
a maioria das muçulmanas, usar a Burca ou o Nikab trata-se de um ato de demonstração
de profundo respeito por sua religião, um ato de vontade, que vai além da submissão às
ordens impostas tanto pelos pais, como pelos parceiros, diferente do que é proposto no
texto legal2 francês.
Em seu trabalho de conclusão de curso, na Universidade Presbiteriana Mackenzie,
Dirceu Alvez da Silva realizou entrevistas com mulheres muçulmanas que freqüentavam as
mesquitas da cidade de São Paulo, uma delas chamada Aisha, que, quando questionada
sobre qual o significado do Hihab para ela, a mesma respondeu: “para mim, e creio eu
que para todas as mulheres muçulmanas, o hihab possui um valor simbólico, que vai
além do aspecto religioso, até a definição da identidade feminina islâmica, passando
por aspectos pessoais”. Quando questionada sobre se ela se sentia reprimida, ou até
mesmo alienada usando o véu, “pelo contrário, o véu não representa um esconderijo para
nós, representa nossa identidade de mulheres muçulmanas, comprometidas com sua
religiosidade, pureza e com sua moralidade”.
2 - Conferir a decisão em: http://s.conjur.com.br/dl/lei-francesa-proibe-uso-burca-nao-fere.pdf

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