Influência da indumentária nas representações jurídicas. Relações de poder e gênero

AutorNatália de Souza Lisbôa - Ana Carolina Silva
CargoDoutora em Direito Internacional (PUCMinas). Professora do Departamento de Direito, Graduação e Mestrado 'Novos Direitos, Novos Sujeitos', Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) - Pós-graduanda em Direitos Humanos, Responsabilidade Social e Cidadania Global pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Páginas147-169
INFLUÊNCIA DA INDUMENTÁRIA NAS REPRESENTAÇÕES
JURÍDICAS  RELAÇÕES DE PODER E GÊNERO
INFLUENCE OF CLOTHING ON LEGAL REPRESENTATIONS  POWER
AND GENDER RELATIONS
Natália de Souza Lisbôa
Doutora em Direito Internacional (PUCMinas). Professora do
Departamento de Direito – Graduação e Mestrado
“Novos Direitos, Novos Sujeitos” – Universidade Federal de
Ouro Preto (UFOP).
Pró-reitora de Assuntos Comunitários e Estudantis – PRACE/UFOP.
Coordenadora do RESSABER – Grupo de Estudos em Saberes Decoloniais (UFOP).
E-mail: natalialisboa@ufop.edu.br;
https://orcid.org/0000-0002-1684-8183
Ana Carolina Silva
ós-graduanda em Direitos Humanos, Responsabilidade
Social e Cidadania Global pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Bacharela em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto.
E-mail: acarolsilva96@gmail.com
https://orcid.org/0000-0001-6079-4672;
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo introduzir a discussão acerca do dano existencial qA
partir da aplicação do método jurídico-dogmático na análise de dispositivos normativos,
que dizem respeito à discriminação de corpos pela moda, entende-se que, enquanto
micro realidade, o ambiente forense replica a organização hierárquica e heteronormativa
da história social da moda. Fundada em bases coloniais de poder e de saber, tal
organização se sustenta em disposições sobre indumentária adequada, encontradas
nos regimentos internos dos Tribunais brasileiros, para acesso ao Judiciário. A adoção
da estética colonial pelos Tribunais, embora tenha por objetivo principal simbolicamente
manter o decoro e dignificar as carreiras jurídicas, enseja em reiterada discriminação
de advogadas e advogados, especialmente no tange a discriminação de gênero e
discriminação racial. O presente trabalho tem como problema desenvolver a noção de
como a dignificação da advocacia pela moda/estética colonial se fundamenta na história
social e ocidental da moda e viola o postulado da liberdade que é intrínseco à profissão e
limita, portanto, o exercício pleno da advocacia. E, a partir de tal percepção, propor uma
leitura epistêmica da indumentária jurídica binária e hierárquica a partir do olhar do Sul
Global pelo feminismo decolonial.
Palavras-chave: História social da moda. Indumentária. Advocacia. Relações de poder.
Feminismo decolonial.
Artigo | Article | Artículo | Article
Recebido: 19/01/2021
Aceito: 006/03/2021
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Revista Direito.UnB |Janeiro – Abril, 2021, V. 05, N.2 | ISSN 2357-8009| p. 147-169
ABSTRACT
From the application of the legal-dogmatic research in the analysis of legal mechanisms
related to the discrimination of bodies by fashion, it is understood that, as a micro
reality, the forensic environment replicates the hierarchical and heteronormative
organization of the social history of fashion. Founded on colonial bases of power
and knowledge, this organization is supported by provisions on adequate clothing,
found in the internal regulations of the Brazilian Courts, for access to the Judiciary.
The adoption of colonial aesthetics by the Courts, although its main objective is
symbolically to maintain decorum and dignify legal careers, it leads to the repeated
discrimination of lawyers and lawyers, especially in terms of gender discrimination and
racial discrimination. The present work intends, therefore, as a problem, to develop the
notion of how the dignification of advocacy by colonial fashion / aesthetics is based
on the social and western history of fashion and violates the postulate of freedom that
is intrinsic to the profession and therefore limits the exercise advocacy. And, based
on this perception, to propose an epistemic reading of this organization of binary and
hierarchical legal clothing from the perspective of the Global South through decolonial
feminism.
Keywords: ESocial history of fashion. Clothing. Advocacy. Power relations. Decolonial
feminism.
1. Introdução
A palavra tradição, enquanto cristalização de universos simbólicos, mostra-se
como elemento social e motivo de orgulho na rotina forense. Em que pese a liturgia nos
Tribunais de Justiça brasileiros deva ser garantida pelo rito processual, basta que se
revisite as notícias para perceber que não somente a exposição dos fatos, do conhecimento
técnico-jurídico e da eloquência argumentativa compõem as audiências. O componente
estético é apresentado como elemento importante no meio jurídico, de modo que os
imperativos exigidos às partes e, especialmente, às advogadas e aos advogados do Brasil
encontrem-se em compatibilidade com dois pilares: decoro e asseio1.
A pesquisa do tema é justificada na necessidade de compreender o formalismo
1 Em agosto de 2018, o TST editou ato 353/18 cujo art. 1º definia que apenas pessoas que se
apresentassem com “decoro e asseio” teriam acesso ao referido tribunal. “Art. 1º O acesso e a permanência
nas dependências do Tribunal Superior do Trabalho serão autorizados somente às pessoas que se
apresentarem com decoro e asseio, devendo ser utilizada vestimenta que observe o devido respeito
ao Poder Judiciário e as disposições deste Ato”. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Ato nº 353, de
2.8.2018, DEJT de 2.8.2018. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/informativos-lp/-/asset_publisher/0ZPq/
document/id/24625794>. Acesso em: 21 ago. 2020.
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