Influência do recurso repetitivo (REsp n. 1.230.957) em determinadas contribuições sociais

AutorTheodoro Vicente Agostinho/Marcelino Alves De Alcântara/Marco Dulgheroff Novais
Páginas90-101

Page 90

Inicialmente, cumpre registrar que recurso repetitivo222 trata-se de um dispositivo jurídico que representa um grupo de recursos que possuem teses idênticas, ou seja, teses que possuem fundamento em idêntica questão de direito.

Com a recente alteração do Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), a previsão está contida no art. 1.036, in verbis:

Art. 1.036. Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça.

Significa dizer que um recurso classificado como repetitivo será suspenso no tribunal de origem até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça — STJ sobre a matéria.

O procedimento para admissão do recurso como repetitivo se dá pela seguinte forma:

  1. o presidente ou vice-presidente do tribunal de origem escolherá um ou mais recursos para representar a controvérsia, admitindo-o como recurso representativo de controvérsia;

  2. o andamento dos demais recursos será suspenso e se encaminhará o “recurso representativo (ou recursos) de controvérsia” ao STJ para julgamento;

  3. os recursos suspensos assim permanecerão até o pronunciamento definitivo do STJ sobre o “recurso representativo de controvérsia”;

  4. o ministro relator do processo no STJ poderá determinar a suspensão dos recursos especiais nos tribunais de segunda instância, caso verifique que há jurisprudência dominante sobre a controvérsia ou que a matéria já está afeta ao colegiado;

  5. mantido o acórdão divergente pelo tribunal de origem o processo será remetido ao respectivo Tribunal Superior na forma do art. 1.036, § 1º, do Código de Processo Civil.

Pois bem, nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial (REsp n. 1230957) como repetitivo de incontroversa, de modo que permaneceu o entendimento de que as verbas a título de aviso-prévio indenizado e seus reflexos, terço constitucional de férias (art. 7º, inciso XVII, da CF/1988) e seus reflexos, 15 dias anteriores à concessão do auxílio-doença/acidente, abono pecuniário e seus reflexos, férias indenizadas e seus reflexos e férias pagas em dobro e seus reflexos possuem natureza indenizatória, logo, não incorporam-se ao conceito de remuneração, pois não possuem retributividade. Tudo de forma a não constituir base de cálculo para a incidência das contribuições sociais recolhidas pela empresa aos seus empregados (cota patronal, SAT e entidades terceiras).

Page 91

Neste sentido, no julgamento do REsp n. 1230957, processado nos moldes do art. 1036-C do CPC (recur-so repetitivo), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou entendimento pelo reconhecimento da ilegalidade da exigência das contribuições sociais sobre o aviso-prévio indenizado, terço constitucional de férias e 15 dias anteriores à concessão do auxílio-doença/acidente pelos Ministros Mauro Campbell Marques, Humberto Mar-tins, Benedito Gonçalves, Arnaldo Esteves Lima e Herman Benjamin.

Destarte, restou pacificado que tais verbas não integram o conceito de remuneração, não integrando a base de cálculo da contribuição.

8.1. Do aviso-prévio indenizado

É importante frisar, que a exigência de contribuições sociais sobre a rubrica “aviso-prévio indenizado”, encontra, na percepção do Fisco, respaldo normativo ilegal, ressalta-se, em face da revogação da alínea “f”, do § 9º, do inciso V, do art. 214, do Decreto n. 3.048/1999, pelo art. 1º do Decreto n. 6.727/2009223.

Válido salientar, ainda, que, antes da referida revogação, era expressa a vedação à cobrança da contribuição sobre o aviso-prévio indenizado.

Esse mesmo diploma, em seu art. 2º, determina expressamente que sua vigência irá ocorrer a partir da sua publicação. Destarte, o Decreto n. 6.727/2009 foi publicado no Diário Oficial da União em 13.01.2009.

Assim, desde o dia 13.01.2009, poderia, indevidamente, a Receita Federal do Brasil exigir contribuições sociais sobre a verba “aviso-prévio indenizado”.

No entanto, em nosso ordenamento jurídico, a legalidade tributária em sua feição material, preconizada no art. 150, I, da Constituição Federal, e pelo art. 97 do Código Tributário Nacional, com apoio no princípio da segurança jurídica dos contribuintes, impõe que o fato gerador e a base de cálculo dos tributos sejam deter-minados em lei, que deve prever e qualificar exaustivamente suas características, permitindo assim a perfeita subsunção dos fatos à norma jurídica a ensejar o nascimento da obrigação tributária.

Este delineamento da hipótese de incidência deve, ainda, estar suportado pela norma de competência, ditada de forma expressa pelo Texto Constitucional.

No que toca à contribuição do empregador sobre as remunerações, a regra de competência do art. 195, I, “a”224, da Constituição Federal de 1988, definiu como fato tributável apenas parcelas de natureza remuneratória e não indenizatória.

Logo, conforme explicita o art. 110 do CTN225, não pode a lei ou o seu aplicador alterar tal conceito e, como visto, sendo o aviso-prévio indenizado o pagamento feito pelo empregador que dispensa o empregado de cumprir mais um mês de trabalho, definido como parcela de caráter indenizatório e não remuneratório pela CLT, impossível a incidência da contribuição sobre o mesmo.

Com efeito, o pagamento substitutivo do tempo que o empregado trabalharia se cumprisse o aviso-prévio em serviço não deve ser enquadrado como salário, porque a dispensa de cumprimento do aviso objetiva disponibilizar mais tempo ao empregado para a procura de novo emprego, possuindo nítida feição indenizatória, nos termos do art. 487 da CLT.

Page 92

Vale esclarecer que o aviso-prévio é, em verdade, notificação que uma das partes do contrato de trabalho, seja o empregador, seja o empregado, faz à parte contrária, comunicando-lhe a intenção de rescisão do vínculo, que se dará em data certa e determinada, observado o prazo determinado, atualmente, em lei.

Nesse sentido, é certo que o período que o empregado trabalha depois de ter dado ou recebido o aviso-prévio será remunerado da forma habitual, por meio do salário, sobre o qual incide a contribuição previdenciária, uma vez que esse tempo é computado como de serviço do trabalhador para efeitos de cálculo de aposentadoria.

Todavia, embora o aviso-prévio tenha sido criado com o escopo de preparar a parte contrária do contrato de trabalho para a rescisão do vínculo empregatício, a prática demonstra que, na maioria dos casos, quando a iniciativa é do empregador, tem-se dado preferência pela aplicação da regra contida no § 1º, do art. 487, da CLT, que estabelece que, rescindido o contrato antes de findo o prazo do aviso, o empregado terá direito ao pagamento do valor relativo ao salário correspondente àquele período.

É esse valor que consiste no aviso-prévio indenizado, e que, contudo, não tem natureza salarial, considerando que não é pago a título de contraprestação de serviço, mas a título de indenização pela rescisão do contrato sem o cumprimento de referido prazo.

As verbas indenizatórias não compõem parcela do salário do empregado, posto que não têm caráter de habitualidade; têm natureza meramente ressarcitória, pagas com a finalidade de recompor o patrimônio do empregado desligado sem justa causa e, por esse motivo, não estão sujeitas à incidência da contribuição.

A jurisprudência dos Tribunais consolidou a diretriz no sentido de que as verbas de natureza indenizatória ou compensatória não têm natureza salarial. Logo, não incide sobre elas a contribuição previdenciária.

Inclusive, a matéria é objeto da Súmula n. 09, do extinto TRIBUNAL FEDERAL DE RECURSOS:

Súmula 09. Não incide a contribuição previdenciária sobre a quantia paga a título de indenização de aviso prévio.

Por isso, a jurisprudência pátria sempre se fundou na natureza da verba, e nunca na existência de previsão legal de sua exclusão, restando caracterizada, assim, a não incidência em sentido estrito da contribuição social do empregador sobre a rubrica “aviso-prévio indenizado”, tendo em vista que essa não é fato gerador daquela.

Portanto, todos os pagamentos que não se qualificarem juridicamente como remuneração pelo trabalho, de repercussão nitidamente salarial, não se enquadram na previsão legal que conceitua a base de cálculo da contribuição.

Esse é justamente o caso do aviso-prévio indenizado, que não tem natureza remuneratória, mas sim indenizatória.

Neste sentido, aliás, tem sido a jurisprudência de nossas Cortes Superiores:

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. ART. 557, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO JULGADA MONOCRATICAMENTE. POSSIBILIDADE. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. NÃO INCIDÊNCIA. 1. O art. 557 autoriza o julgamento unipessoal à vista de jurisprudência “dominante”, não sendo, portanto, necessário que se trate de jurisprudência “pacífica”. 2. O fato de o período de aviso ser computado no tempo de serviço para todos os efeitos legais, de acordo com o que estabelece o art. 487 da CLT, não torna o valor da indenização a ele referente passível de incidência de contribuições previdenciárias, já que essa parcela paga em virtude de demissão não se ajusta ao conceito de “salário-de-contribuição”, feita pelo inciso I do art. 28 da Lei n. 8.212/91, que abrange somente os rendimentos pagos como contraprestação pelo trabalho e, “in casu”, trabalho é o que não há. 3. O pensamento externado pelas duas Turmas do STF, que vem ganhando adesão no STJ, finca-se na consideração de que a verba remuneratória do trabalho e sobre a qual deve incidir a contribuição é aquela que vai se perpetuar no salário ou subsídio do mesmo, conforme seja empregado...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT