Integralidade e paridade das pensões por morte de servidores públicos pós-emenda Nº 41 e o re Nº 603.580

AutorFernando Ferreira Calazans
Páginas11-18

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Fernando Ferreira Calazans 1

Introdução

O tema deste artigo é o instituto da previdência social. A Previdência Social Brasileira é dividida em dois pilares: o de vinculação obrigatória e o de filiação facultativa, de natureza complementar, conforme previsto, respectivamente, nos arts. 40 e 201 e 202, todos da Constituição Federal de 1988.

O pilar de vinculação obrigatória é constituído por dois tipos de regimes. Os regimes próprios de previdência social (RPPS), que amparam os servidores públicos titulares de cargo de provimento efetivo, e o regime geral de previdência social (RGPS), que protege os trabalhadores da iniciativa privada e os demais agentes públicos não amparados por RPPS.

Este artigo tem por finalidade revisitar a discussão realizada por Calazans (2012)2 – formas de cálculo e reajuste das pensões por morte de servidores públicos vinculados a RPPS – à luz do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nos autos do Recurso Extraordinário (RE) n. 603.5803, julgado pela sistemática da repercussão geral.

Até o julgamento do RE n. 603.580, pairavam dúvidas sobre a aplicação do direito à paridade e integralidade para as pensões de servidores falecidos a partir da Emenda Constitucional n. 41, de 2003, havendo várias correntes de entendimento, conforme descrito por Calazans (2012)4.

Sucede que a Corte Suprema, embalada pelo voto condutor do aresto, que se baseou no artigo ora revisitado, deu parcial provimento ao RE n. 603.580, interposto pela Unidade Gestora do Regime Próprio de Previdência Social do Estado do Rio de Janeiro para inadmitir a integralidade aos pensionistas, autores da ação, mas lhes garantir o direito à paridade.

Diante disso, este artigo tem por objetivo realizar breves apontamentos sobre a tese firmada pelo STF e os seus efeitos no âmbito do direito previdenciário.

O artigo está estruturado da seguinte forma. Após esta introdução, foram descritas as regras de cálculo e de reajuste das pensões de servidores vinculados a regime próprio de previdência social (RPPS), vigentes desde a Constituição Federal de 1988 (Seção 2). Depois, foram descritos os fundamentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do RE n. 603.580, bem como a tese fixada naquele Recurso e a sua aplicação no caso concreto (Seção 3). Em seguida, foram analisadas a teoria da eficácia das normas constitucionais e a teoria da interpretação das normas (Seção 4). Na sequência, analisou-se a aplicação da tese pelo STF naquele caso (Seção 5) para, ao final, apresentar notas finais à guisa de conclusão.

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Regras de cálculo e de reajuste das pensões de servidores públicos vinculados a regime próprio de previdência social

Até a Emenda Constitucional (EC) n. 41, de 2003, a pensão por morte de servidor amparado por regime próprio de previdência social (RPPS) correspondia à integralidade do valor dos seus proventos de aposenta-doria ou à quantia a que teria direito se estivesse aposentado à data do óbito e era reajustada toda vez que o servidor em atividade recebesse aumento. Era a dicção dos §§ 7º e 8º do art. 40 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988):

Art. 40. [...]

§ 7º Lei disporá sobre a concessão do benefício da pensão por morte, que será igual ao valor dos proventos do servidor falecido ou ao valor dos proven-tos a que teria direito o servidor em atividade na data de seu falecimento, observado o disposto no § 3º.

§ 8º Observado o disposto no art. 37, XI, os proven-tos de aposentadoria e as pensões serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em ativi-dade, sendo também estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em ativi-dade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei.

Em 31.12.2003, foi publicada a EC n. 41, que deu nova redação aos §§ 7º (regra de cálculo) e 8º (regra de reajuste), do art. 40 da CF/1988, alterando as formas de cálculo e de reajuste das pensões por morte de servidores amparados por RPPS:

Art. 40. [...]

§ 7º Lei disporá sobre a concessão do benefício de pensão por morte, que será igual:

I – ao valor da totalidade dos proventos do servidor falecido, até o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, acrescido de setenta por cento da parcela excedente a este limite, caso aposentado à data do óbito; ou

II – ao valor da totalidade da remuneração do servidor no cargo efetivo em que se deu o falecimento, até o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, acrescido de setenta por cento da parcela excedente a este limite, caso em atividade na data do óbito.

§ 8º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei.

Como referidos dispositivos constitucionais não foram dotados de eficácia imediata, posto que o texto constitucional remeteu a sua eficácia à edição de lei, em 20.02.2004, foi publicada a Medida Provisória n. 167, convertida na Lei n. 10.887, de 2004.

De acordo com a MP n. 167 e depois, com a redação originária do art. 15 da Lei n. 10.887/2004, “os proventos de aposentadoria e as pensões de que tratam os arts. 1º e 2º desta Lei serão reajustados na mesma data em que se der o reajuste dos benefícios do regime geral de previdência social”, restando omisso quanto ao índice de reajuste a ser aplicado.

Em razão disso, o Ministério da Previdência Social editou a Orientação Normativa n. 03, de 2004. Referida orientação, por seu art. 65, caput e parágrafo único, previu que as aposentadorias e pensões, não amparadas pela garantia da paridade, serão reajustadas para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, na mesma data em que se der o reajuste dos benefícios do RGPS, de acordo com a variação do índice definido em lei pelo ente, e, com fundamento no § 12 do art. 40 da CF/19885, estabeleceu que, “na ausência de definição do índice de reajustamento pelo ente, os benefícios serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do RGPS”.

Em 2005, publicou-se a EC n. 47, que, em síntese, relativamente aos RPPS, não se consubstanciou em reforma previdenciária, mas apenas estabeleceu alguns ajustes, tais como: a manutenção da paridade para os servidores aposentados pelo art. 6º da EC n. 41, a criação de regra de transição para os servidores que ingressaram no serviço público até 16.12.1998 e a retroação dos seus efeitos a 31.12.2003.

Além disso, a EC n. 47/05, com vigência retroativa a 31.12.2003 (cf. o seu art. 6º), criou regra excepcionalíssima de extensão da garantia da paridade (extinta pela EC n. 41/2003) para as pensões derivadas de óbito de servidores aposentados pela regra prevista no caput do art. 3º da EC n. 47/05, adiante transcrito:

Art. 3º Ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas pelo art. 40 da Cons-

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tituição Federal ou pelas regras estabelecidas pelos arts. 2º e 6º da Emenda Constitucional n. 41, de 2003, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até 16 de dezembro de 1998 poderá aposentar-se com proventos integrais, desde que preencha, cumulativamente, as seguintes condições:

I – trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;

II – vinte e cinco anos de efetivo exercício no serviço público, quinze anos de carreira e cinco anos no cargo em que se der a aposentadoria;

III – idade mínima resultante da redução, relativamente aos limites do art. 40, § 1º, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, de um ano de idade para cada ano de contribuição que exceder a condição prevista no inciso I do caput deste artigo.

Mencionada regra excepcionalíssima, contida no parágrafo único do art. 3º da EC n. 47/2005, que ressuscitou a paridade para as pensões de servidores que tenham se aposentado em conformidade com a regra de transição supra, é a que se encontra adiante transcrita:

Art. 3º [...]

Parágrafo único. Aplica-se ao valor dos proventos de aposentadorias concedidas com base neste artigo o disposto no art. 7º da Emenda Constitucional n. 41, de 2003, observando-se igual critério de revisão às pensões derivadas dos proventos de servidores falecidos que tenham se aposentado em conformidade com este artigo.

Alguns anos depois, em 2008, a Medida Provisória (MP) n. 431 supriu a ausência de indicação do índice a ser utilizado pelos RPPS para o reajuste dos seus benefícios não amparados pela garantia da paridade, dando nova redação ao art. 15 da Lei n....

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