A interface dialética entre a democracia e a globalização

AutorMaria Beatriz Espirito Santo Mardegan, Artur César de Souza, Walkiria Martinez Heinrich Ferrer
Páginas56-77
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Maria Beatriz Espirito Santo Mardegan • Artur César de Souza • Walkiria Martinez Heinrich Ferrer
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 11, n. 2, p. 56-77, jul./dez. 2020.
ABSTRACT:
The research attempts to unravel the dialectical relationship between democracy and globalization,
in a symbiotic process that involves a series of actors, state and non-state, that interact and
inuence each other. The essay addresses the historical contextualization of the democratic
process, from the direct democracy of greek antiquity, resurging after two thousand years, under
the paradigm of representative democracy, evolving today to semi-indirect democracy. Next, the
study reports the diverse ideological perspectives on democracy, as well as the obstacles faced
in the process of democratization in the globalized society. It analyzes the historical panorama
of globalization, especially from the second half of the 1980s, with the emergence of new
communication and information technologies, the reduction of the costs of means of transport,
the development of the internet and a marked global economic interdependence, when this
phenomenon has gone from a strictly economic dimension to a broader and deeper reality,
which includes science and technology, social, political and cultural relations. Highlights the
possibility of relativizing state sovereignty in the face of the multifaceted interdependence of the
globalization process, concluding that the process of expanding democracy must necessarily be
conditioned to the reduction of social disparities, since democratic principles are too innocuous
when democracy is reduced to the simple political regime. Furthermore, history has shown that
extreme social inequalities work as a limiting factor in the solidifying process of world democracy.
Keywords: Democracy. Globalization. Contextualization. Social Antitheses.
1 INTRODUÇÃO
O estudo objetiva analisar a relação dialética multifacetada entre democracia e a
globalização, a qual é inuenciada por uma variedade de atores, que tanto podem constituir
num fator de estímulo à sua promoção, como um elemento de pulverização e extenuação de
seus caracteres.
Constata-se que as implicações da democracia no processo de globalização têm sido
muitas vezes heterogêneas: ora promovem valores democráticos de estabilidade e pacicação
mundial; ora sugerem desintegração, com práticas políticas, econômicas ou sociais não
alinhadas aos princípios democráticos.
Analisa-se o contexto histórico do processo democrático, desde democracia direta
ateniense, passando pela democracia representativa contemporânea, evoluindo para a
necessidade de uma democracia semi-indireta, com mecanismos de aprimoramento da
representat ividade popular.
Analogicamente, o trabalho perquire o desenvolvimento da globalização, como um
fenômeno de extraordinária interdependência das relações econômicas em nível mundial, de
integ ração social, cu ltural e política entre os paí ses, impul sionado pela redução de cus tos dos
meios de transporte e de comunicação entre os países e pelo desenvolvimento da tecnologia
e da internet.
Afere-se, ainda, que o êxito deste processo global de democratização pressupõe
a somatória de alguns fatores, como o fortalecimento das instituições democráticas e da
sociedade civil, o comprometimento das autoridades políticas com os autênticos fundamentos
de moc rát ico s, a atu açã o di lig ent e das orga ni zaç ões e com un idade s int erna cio nai s, a ex ist ênc ia
de processos eleitorais competitivos e transparentes, a efetiva alternância de poder, o respeito
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A INTERFACE DIALÉTICA ENTRE A DEMOCRACIA E A GLOBALIZAÇÃO
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 11, n. 2, p. 56-77, jul./dez. 2020.
a di reitos e ga rantias funda mentais, de ntre outr os coecient es que at uam como in str umentos
de estabilidade democrática e pacicação social a nível global.
Insta ressalvar, por sua vez, que a função dos Estados Democráticos no cenário
globalizado consiste também em instrumentalizar a conquista da justiça social e respeito a
direitos fundamentais nas suas relações internacionais, minimizando os abismos existentes
referentes às antinomias sociais.
A pesquisa utilizará o método histórico dedutivo, correspondente à extração discursiva
do con hecimento a par tir de pr emissas gera is aplicáve is à temátic a propos ta, com a na lidade
de apresentar possíveis soluções para a problematização que envolve o tema. O estudo se
pauta rá na ampla pesquisa biográ ca, podendo utiliza r-se, ainda, da pesquisa informat izada,
através da Internet, como meio de facilitação do acervo biográco sobre a matéria.
2 DEMOCRACIA: PANORAMA HISTÓRICO
2.1 Democracia Direta da Grécia Antiga
Literalmente signicando “o governo (kracia) do povo (demos)”, a democracia surgiu
no século V a.C. para denotar os sistemas políticos então existentes em Cidades-Estados da
Grécia Antiga, como um regime de governo onde todas as decisões fundamentais à vida em
comunidade eram tomadas em assembleia popular, reunindo todos os cidadãos, que assim
participavam da vida política da polis. É o regime oposto da aristocracia (aristokratia),
traduzida literalmente como “o governo dos melhores”, forma de governo na qual o poder
político era exercido pelos nobres, pessoas de conança dos monarcas ou dos regentes
iniciados, na perspectiva losóca e política de A ristóteles (DAHL, 2001).
Denota-se, contudo, que tais regimes embora opostos, pragmaticamente, revelaram
um paradoxo. No sistema político da Atenas Clássica, por exemplo, a cidadania democrática
abrang ia apenas homens livres, l hos de pai e mãe aten iense s, e maiores de 21 anos . A maior ia
da popul ação, repre sent ada por est rangeir os, es crav os e mul heres era exc luíd a da part icip ação
política. Uma forma direta, mas restritiva e elitista de participação popular, que, já na sua
origem, surge como contradição ao genuíno ideal democrático (CABR AL NETO, 1997).
Assim, a democracia que, teoricamente deveria assegurar a igualdade política a
todos os cidadãos, já em sua gênese evidenciava uma desigualdade substancial, limitando a
participação popular nas decisões política.
Insta observar, no entanto, que a democ racia greg a antiga in augurou um complexo de
instituições que possibilitou consubstanciar, dentro dos limites da época, uma experiência
de relevante expressão histórica. Além da participação direta na gestão pública, o sistema
democrático ateniense continha instrumentos que permitiam scalizar e responsabilizar
todos os ocupantes do corpo político.
2.2 Democracia Representativa Contemporânea
Após a derrota da experiência democrática grega, resultante da guerra desencadeada
entre os anos 431 e 404 a.C., a democracia antiga desvaneceu do panorama político. Por toda a
Idade Média e, sobret udo, a partir do século XV, com o forta lecimento dos idea is absolutistas
os quais acabaram por respalda r os governos déspotas da época, houve um hiato his tórico da
democracia.

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