Intervenção fiscalizatória. Agência de turismo que efetua operações de câmbio

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REVISTA BONIJURIS I ANO 31 I EDIÇÃO 659 I AGO/SET 2019
ACÓRDÃOS EM DESTAQUE
184 REVISTA BONIJURIS I ANO 31 I EDIÇÃO 659 I AGO/SET 2019
ACÓRDÃOS EM DESTAQUE
659.201 Administrativo
INTERVENÇÃO FISCALIZATÓRIA
AGÊNCIA DE TURISMO QUE EFETUA OPERAÇÕES DE
CÂMBIO É EQUIPARADA A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
E PODE SER FISCALIZADA PELO BACEN
Superior Tribunal de Justiça
Recurso Especial n. 1.434.625/CE
Órgão Julgador: 1a. Turma
Fonte: 15.04.2019
Relator: Ministro Sérgio Kukina
EMENTA
Administrativo. Recurso especial do particular. Agência de
turismo credenciada para atuar em operações de câmbio. Equi-
paração à instituição financeira. Inteligência do art. 17 da lei n.
4.595⁄64 (lei do sistema financeiro nacional). Submissão ao po-
der fiscalizador do Bacen. 1. A teor do art. 17 da Lei n. 4.595⁄64,
“Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da le-
gislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas,
que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, in-
termediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou
de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de
valor de propriedade de terceiros”.
2. A agência de turismo, devidamente autorizada a efetuar
operações de câmbio, enquadra-se, por equiparação, na exegese
mais ampla de instituição financeira, por isso atraindo a regu-
lar fiscalização do Banco Central do Brasil, que a exerce com
base nos arts. 10, IX, e 11, III, da mesma Lei n. 4.595⁄64.
3. Em hipótese assemelhada, mas na seara dos crimes contra
o Sistema Financeiro Nacional, o STJ já teve ensejo de decidir
que “As pessoas jurídicas que realizam operações de câmbio
equiparam-se, pelo art. 1º, inc. I, da Lei nº 7.492⁄86, e para os efei-
tos da lei, às instituições financeiras” (RHC 9.281⁄PR, Rel. Minis-
tro GILSON DIPP, 5ª Turma, DJe 30⁄10⁄2000).
4. Logo, nenhuma irregularidade se verifica na conduta da
entidade credenciante (Bacen), ao fiscalizar as atividades da
agência por ela autorizada a operar no mercado de câmbio.
5. Recurso especial não provido.
termos do voto do Sr. Ministro Rela-
tor. Os Srs. Ministros Regina Helena
Costa (Presidente), Gurgel de Faria,
Napoleão Nunes Maia Filho e Bene-
dito Gonçalves votaram com o Sr. Mi-
nistro Relator.
Assistiu ao julgamento o Dr(a).
Luiz Felipe Horowitz Lopes (Repre-
sentação por força de lei), pela parte
Recorrida: Banco Central do Brasil –
BACEN
Brasília (DF), 09 de abril de 2019
(Data do Julgamento)
MINISTRO SÉRGIO KUKINA
Relator
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO SÉRGIO
KUKINA: Trata-se de recurso espe-
cial interposto por Rudy Constantino
Câmbio e Turismo Ltda., com funda-
mento no art. 105, III, a, da CF, con-
tra acórdão proferido pelo Tribunal
Regional Federal da 5ª Região, assim
ementado (fl. 235):
Processual civil. Administrativo.
Agência de turismo. Operação em
câmbio. Equiparação a instituição fi-
nanceira. Art. 17 da lei n°. 4.595⁄64. Pos-
sibilidade. Multa aplicada por infra-
ção à CNC. Anulação. Impossibilidade.
1. Agência de turismo, credenciada
junto ao Banco Central para operar
em câmbio, enquadra-se perfeitamen-
te no conceito de instituição financei-
ra, mais precisamente naquele conti-
do na Lei n°. 4.595⁄64, equiparando-se
a ela, estando, assim, a atividade de
compra e venda de moeda estrangei-
ra sujeita à regulamentação da Autar-
quia, inclusive à fiscalização e aplica-
ção de penalidades.
2. Infração à norma editada pela
Autarquia Federal que regulamente a
atividade de câmbio, enseja a aplica-
ção de multa, seja o infrator institui-
ção financeira ou a ela equiparada.
Apelação improvida.
Irresignada, a parte recorrente
aponta violação ao art. 17 da Lei n.
4.595⁄64 (Lei do Sistema Financeiro
Nacional). Para tanto, sustenta que
o conceito legal de instituição finan-
ceira compreenderia o seguinte trinô-
mio: coleta, intermediação e aplicação
de recursos financeiros, próprios ou
de terceiros, em moeda nacional ou
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Pri-
meira TURMA do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, negar
provimento ao recurso especial, nos
que disciplina o SFC,
dispõe competir
ao Bacen “atuar
no sentido do
funcionamento regular
do mercado cambial
estrangeira. Desse modo, a agência de
turismo, ao realizar apenas operações
de câmbio manual, não poderia ser
equiparada a instituição financeira,
por isso escapando à atuação fiscali-
zatória do Bacen.
Ao contrarrazoar o especial, o Ba-
cen argumenta que, “Se a recorrente
operava no mercado de câmbio (ati-
vidade acessória), por expressa au-
torização (credenciamento) do Ban-
co Central do Brasil, é evidente que
esta atividade econômica, acessória
e específica, tem que se submeter a
regulamentação legal e infralegal
pertinente, uma vez que a recorrente,
nesta atividade acessória, equipara-se
à instituição financeira” (fl. 286).
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO SÉRGIO
KUKINA (Relator): Registre-se, de
logo, que o acórdão recorrido foi publi-
cado na vigência do CPC⁄73; por isso,
no exame dos pressupostos de admis-
sibilidade do recurso, será observada
a diretriz contida no Enunciado Ad-
ministrativo n. 2⁄STJ, aprovado pelo
Plenário do STJ na Sessão de 9 de mar-
ço de 2016 (Aos recursos interpostos
com fundamento no CPC⁄73 (relativos
a decisões publicadas até 17 de março
de 2016) devem ser exigidos os requisi-
tos de admissibilidade na forma nele
prevista, com as interpretações dadas,
até então, pela jurisprudência do Su-
perior Tribunal de Justiça).
Feita essa observação, tem-se que
o inconformismo da parte recorren-
te, cujo tema se acha devidamente
prequestionado, não comporta êxito,
fazendo-se de rigor a manutenção do
acórdão vergastado.
Como já historiado, controverte-
-se sobre o Banco Central do Brasil
possuir, ou não, atribuição fiscalizató-
ria sobre a recorrente, no que atine às
operações de câmbio manual por ela
realizadas, exclusivamente com pes-
soas sicas (turistas e visitantes), en-
volvendo a compra e venda de moeda
estrangeira em espécie.
No ponto, sustenta a irresignada
agência a impossibilidade de se ver
enquadrada, ainda que por equipara-
ção, no conceito de instituição finan-
ceira, mesmo porque seu credencia-
mento junto ao Banco Central “não
permitia operações de câmbio sacado
(Típica de Instituições Financeiras),
nem a manutenção de posições de
câmbio, ou seja, no final do dia todo o
saldo de moeda estrangeira tinha de
ser vendido a um Banco autorizado a
operar em câmbio” (fl. 250).
Pois bem.
Nos domínios da especializada
doutrina, é verdade, ergue-se a ques-
tão relativa às dificuldades em se de-
linear, com exatidão, o perfil jurídico-
-legal de uma instituição financeira.
Nesse sentido, MARLOS LOPES GO-
DINHO ERLING assinala que “o direi-
to positivo brasileiro não possui uma
definição precisa do que seja uma ins-
tituição financeira, pois a amplitude
semântica do conteúdo da prescrição
normativa do art. 17 da Lei nº 4.595, de
1964, que estabelece os critérios para
a caracterização de uma instituição
financeira sujeita à regulação pelo
Banco Central do Brasil, gera dúvidas
interpretativas desde a sua edição
(Regulação do sistema financeiro na-
cional – desafios e propostas de apri-
moramento institucional. São Paulo:
Almedina, 2015, p. 358).
Por sua vez, SIDNEI TURCZYN sa-
lienta que “Não existe uma tipologia
legal das diversas espécies de insti-
tuições financeiras ‘tradicionais’, ou
seja, aquelas que já existiam por oca-
sião da promulgação da Lei 4.595⁄1964,
mas apenas uma identificação das
atividades que cada uma exerce (...)
A definição de quais modalidades
de operações a instituição pretende
exercer, dentre as diversas possíveis,
permite a definição, pelo Banco Cen-
tral, de quais requisitos objetivos por
ele fixados devem ser atendidos para
obtenção da autorização” (O sistema
financeiro nacional e a regulação ban-
cária. São Paulo: RT, 2015, p. 176).
Entretanto, sem embargo das difi-
culdades assim destacadas, revela-se
plenamente possível, como feito pela
Corte regional de origem, reconhe-
cer, mediante equiparação e para fins
de fiscalização do Bacen, o caráter
de instituição financeira da agência
recorrente, no passo em que atua no
mercado de câmbio, ainda que de for-
ma restrita (operações de câmbio ma-
nual, como antes mencionado).
Aliás, quanto a esse específico seg-
mento de atuação, ligado ao mercado
cambial, o doutrinador Christophe
Yvan François Cadier, analisando os
aspectos relacionados às corporações
vinculadas ao Sistema Financeiro Na-
cional, faz sublinhar que “Dignos de
notas são igualmente as corretoras
de câmbio e os bancos de câmbio que,
como a denominação o indica, atuam
respectivamente na intermediação e
na realização de operações de câmbio
de moeda estrangeira” (Sistema finan-
ceiro nacional – doutrina, jurispru-
dência e legislação. São Paulo: Saraiva,
2011, p. 36-37), em clara e desenganada
sinalização de que tal modalidade de
operação se inscreve no rol de ativida-
des financeiras sindicáveis pelo Bacen.
Pinçadas tais lições do plano dog-
mático, oportuno que se transcreva,
para pronta e melhor visualização,
os regramentos que, na legislação de
regência, cuidam de identificar, não
só os misteres do Bacen, mas também
também os elementos identificadores
das instituições financeiras passíveis
de sua fiscalização.
Nesse sentido, a Lei n. 4.595⁄64,
que disciplina o Sistema Financeiro
Nacional, dispõe competir ao Bacen
“atuar no sentido do funcionamento
regular do mercado cambial...” (art.
11, III), bem como, privativamente,
“exercer a fiscalização das institui-
ções financeiras e aplicar as medidas
previstas” (art. 10, IX).
No âmbito desse mesmo diploma
importa, então, verificar as possíveis
feições de que se podem revestir as
instituições financeiras, conforme
pormenorizadamente descrito nos
arts. 17 e 18, verbis:

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