Intimidação sistemática (bullying): conhecendo e combatendo

AutorRosilaine Cristina Silva
Páginas357-386

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Apresentação

Este estudo objetiva conhecer e propor o combate ao fenômeno bullying ou intimidação sistemática, como é sugerido na Lei Federal n. 13.185/2015. A abordagem, por meio de revisão bibliográfica, busca saber como surgiu o bullying, sua forma de ação, quem são os personagens, como intervir e combatê-lo, além de breve análise da legislação existente a respeito do tema. A importância deste estudo reside na necessidade de se intervir para que as agressões, físicas ou psicológicas, que sempre ocorreram no ambiente escolar, e que nos últimos anos tiveram crescimento assustador, possam cessar. A definição e a divulgação da palavra bullying e os estudos sistemáticos a seu respeito exteriorizam que houve uma mudança no olhar para os problemas existentes dentro do ambiente escolar e fora dele também, principalmente no que tange os aspectos da violência e das relações interpessoais que envolvem crianças e adolescente, passando-se a dar maior importância e visibilidade ao fenômeno bullying, deixando de tratá-lo como uma simples "brincadeira de criança". O que estamos propondo é a busca da raiz do problema, no caso a violência escolar, e o combate às suas causas, evitando a intervenção tardia ou apenas das consequências, que podem acarretar diversos problemas para a vida dos indivíduos envolvidos. Como método de estudo, utilizou-se a análise da literatura existente, sendo os autores Cleo Fante, Lélio Calhau e Gabriel Chalita as principais referências

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para este artigo. Buscou-se analisar as reflexões destes autores e trazer as informações necessárias aos professores, alunos, pais e a sociedade, numa tentativa de propor soluções para que haja o respeito mútuo e se combata essa prática tão maléfica presente no meio escolar. Assim, espera-se colaborar para a tomada de consciência da existência do bullying, dentro e fora do ambiente escolar, promover a elaboração de programas de intervenção e combate ao mesmo, além de buscar a promoção de uma educação em e para Direitos Humanos, promovendo a cultura de paz e do respeito à dignidade da pessoa humana.

1 Introdução

O aumento da criminalidade e a maior visibilidade nas mídias de ocorrências de crimes violentos, principalmente os que ocorrem no ambiente escolar envolvendo crianças e adolescentes em situações de bullying, fazem com que o sinal de alerta seja soado em todos nós que participamos do processo educacional. Alguns casos famosos que tiveram repercussão no mundo inteiro, e por anos, chocaram o mundo por terem sido cometidos por ou contra crianças e adolescentes, e o que mais choca são os motivos que levaram a tais crimes. Vejamos alguns exemplos. "Em 1999, no Instituto Columbine (colorado, EUA), Eric Harris e Dylan Klebold, vítimas de Bullying, entraram na escola e passaram a disparar contra professores e colegas. Após matar doze colegas e um professor, eles se suicidaram"1.

No Brasil, caso parecido aconteceu, a Chacina de Realengo, em que "um homem de 23 anos entrou em uma escola municipal na Zona Oeste do Rio na manhã desta quinta-feira (7), atirou contra alunos em salas de aula lotadas, foi atingido por um policial e se suicidou"2. Em ambos os casos, as vítimas de bullying retornaram ao seu local de agressão e se vingaram, no primeiro, adolescente que ainda sofria as ações da violência; e no segundo, um jovem retorna a escola anos mais tarde para se vingar, tirando a vida de inocentes que nada tinham haver com a situação de bullying vivenciada no passado.

Casos como estes ocorrem no mundo inteiro, alguns com maior, outros com menor repercussão, e nos perguntamos: por que isto acontece? O que leva o indivíduo a tentar com contra o seu próximo? Por que perseguir e menosprezar o diferente, o mais fraco? Segundo Calhau, "vivemos em uma sociedade extremamente individualista e capitalista, onde o ser humano, para

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muitos, deixou de ser o próximo e passou a ser apenas um meio para que possa alcançar sua ‘felicidade’, que é apenas juntar dinheiro e adquirir bens"3.

Pensando sobre esses casos e sobre as situações que levam à prática de Bullying, este artigo tem por finalidade analisar o fenômeno bullying ou a intimidação sistemática. Esta análise parte desde a etimologia da palavra, passando pelos primeiros estudos sistemáticos realizados pelo professor Dan Owels na Noruega, que pesquisou e estudou a fundo o problema, propondo programas de combate ao bullying que serviram de modelo para países da Europa e América do Norte. Analisamos, também, como o fenômeno começou a ser estudado no Brasil, com os professores Cleo Fante e Gabriel Chalita, e o Promotor de Justiça Lélio Calhau, os estudos destes propuseram programas eficazes no combate a esta violência escolar. Trazemos algumas definições importantes a respeito do bullying, como a sua forma de identificação, tipos de bullying, personagens, causas, consequências, a prevenção e intervenção ao bullying. E abordamos a respeito da criação da Lei Federal n. 13.185, de 06 de novembro de 2015, que traz definições a respeito da intimidação sistemática (bullying), e a obrigatoriedade das instituições criarem programas de combate a este tipo de violência, além de outras legislações que permeia o tema.

A metodologia utilizada foi à análise de obras de autores que abordaram o tema e trouxeram reflexões a respeito do bullying, definindo bem o que é este fenômeno, quais são suas implicações e consequências, os envolvidos no processo da intimidação sistemática, e por fim as propostas de intervenção e prevenção. O nosso trabalho se baseou em orientar a respeito da prevenção e intervenção de combate ao bullying, alertando sempre sobre a responsabilidade da escola, dos profissionais da educação, dos pais e dos próprios alunos nessa luta.

Percebemos que o fenômeno bullying existe há muito tempo e a questão principal na atualidade é a forma como ele é tratado. Acreditamos que o bullying deve ser visto como um problema social, que possui graves consequências e que precisa ser combatido a todo instante. O objetivo deste trabalho é que os programas de combate saiam do papel e passem, de fato, a existir nas escolas, clubes, associações, dentre outros. Propomos que haja discussões nas salas de aula entre os alunos a respeito do tema, que estes estejam engajados na luta de combate a violência, assim como toda a comunidade escolar, que a visão seja em prol da redução de tais práticas e que a escola se torne um ambiente de paz, onde o respeito à diversidade

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seja uma premissa, e que este seja refletido na sociedade, visando de forma geral o bem-estar do indivíduo, a sua liberdade e garantindo a dignidade da pessoa humana.

2 Conceitos e processo histórico do bullying

O termo bullying é originário da língua Inglesa, advindo da palavra bully, tendo como tradução para o Português as palavras "brigão", "tirano", "valentão". Já a palavra bullying tem como tradução as palavras "tiranizar", "amedrontar", "oprimir"4. O bullying pode ainda ser conhecido como assédio moral, mobbing (Noruega e Dinamarca), mobbining (Suécia e Finlândia), hanassment (Estado Unidos) e acoso (Espanha)5.

O bullying é definido pela Lei Federal n. 13.185, de 6 de novembro de 2015, no art. 1º, § 1º, como "[…] todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivação evidente, praticado por indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la ou agredi-la, causando dor e angústia à vítima, em uma relação de desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas". Assim, atos como de tocar, bater, zombar, oprimir, denegrir, que ultrapasse o limite do respeito ao indivíduo, em suas diferenças sociais, econômicas, raciais, étnicas, religiosas políticas dentre outras, são considerados atos de bullying.

Podemos dizer que o bullying é um fenômeno novo e ao mesmo tempo antigo, mais até que a própria escola, tendo em vista que este fenômeno sempre foi percebido no ambiente escolar e fora dele também, sempre houve os "valentões" que oprimiam e ameaçavam suas vítimas por motivos banais. Fante diz que o bullying é uma das formas de violência que mais cresce no mundo, este fenômeno cresce de forma descontrolada e alarmante, pois é visto por muitos como algo inofensivo ou como simples brincadeiras corriqueiras entre crianças e adolescentes6.

De forma bastante clara, Fante define o termo,

[...] bullying é um conjunto de atitudes agressivas, intencionais e repetitivas que ocorrem sem motivação evidente, adotado por um ou mais alunos contra outro (s), causando dor, angústia e sofri-

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mento. Insultos, intimidações, apelidos cruéis, gozações que magoam profundamente, acusações injustas, atuação de grupos que hostilizam, ridicularizam e infernizam a vida de outros alunos levando-os à exclusão, além de danos físicos, morais e materiais, são algumas das manifestações do comportamento bullying.7

Portanto, bullying é um comportamento cruel que ocorre nas relações interpessoais, em que o mais forte se diverte com o sofrimento do mais fraco, por meio de "brincadeiras" que escondem a real intenção do autor que é de intimidar, amedrontar, maltratar e oprimir sua vítima. Como diferenciar o bullying de "simples brincadeiras". "Inicialmente deve prevalecer o bom senso nessa avaliação, lembrando que não existem brincadeiras quando uma pessoa está sofrendo"8. Portanto, quando há sofrimento de uma das partes não é mais brincadeira e sim bullying, e por se tratar de um fenômeno complexo, acaba sendo banalizado dentro da escola, e por vezes confundido com indisciplina ou agressão.

O fenômeno bullying começou a ter notoriedade em 1970, sendo...

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