Introdução

AutorRafael Marinangelo
INTRODUÇÃO
O período compreendido entre a década de 1980 e a crise f‌inanceira de 2008 foi
marcado pelo triunfalismo de mercado, quando Margaret Tatcher e Ronald Reagan
proclamaram a convicção mútua de que a chave da prosperidade e da verdade estava
nas mãos dos mercados e não dos governos.
Como resultado daquela constatação, a lógica e os valores de mercado ganharam
tamanho protagonismo que as barreiras éticas, necessárias ao seu desenvolvimento
sadio, foram erodidas. Tal movimento ensejou o avanço de vieses utilitaristas em
aspectos da vida social dos quais jamais deveriam se imiscuir, redundando num ocaso
ético sem precedentes e no total aviltamento da pessoa humana em favor do lucro e
da prevalência dos interesses empresariais desmedidos.
A restauração e o reavivamento dos valores mais caros à sociedade exigem a
defesa intransigente da pessoa humana, coibindo-se, em especial, os graves danos
imateriais frequentemente perpetrados para manutenção do sistema mercadológico
desmedido, instaurado em todas as vertentes da vida.
E a responsabilidade civil constitui o instrumento para concretização da defesa
da pessoa humana e para restaurar os prumos sociais ao atribuir ao mercado, o que
é do mercado, e à pessoa humana, o que é da pessoa humana.
No atual contexto da responsabilidade civil, em que doutrina e jurisprudência
titubeiam em reconhecer qualquer outra função que não seja a meramente repara-
tória, esse importante instrumento do Direito não tem alcançado êxito em evitar o
aviltamento da pessoa humana.
As indenizações irrisórias e o apego a conceitos não enquadráveis aos danos à
pessoa – tal como a mensuração da indenização à extensão do dano ou o receio do
enriquecimento sem causa – têm propiciado a manutenção, quiçá o fortalecimento,
de um sistema perverso no qual tudo tem um preço, na quase totalidade dos casos,
baixo ou aviltante.
O presente trabalho surgiu de nosso inconformismo com a situação vigente de
ultraje da pessoa humana em favor do mercado desonesto. Não é mais possível per-
petuar tamanha iniquidade e desprezo à pessoa, tal como se tem visto, há décadas,
por práticas negociais cuja voracidade oprime, ofende, marginaliza e neutraliza a
dignidade da pessoa humana.
O restabelecimento da normalidade das relações sociais, pautados em impe-
rativos éticos, pode ser obtido mediante o incremento de uma das funções outrora
esquecidas da responsabilidade civil: a função punitiva. E o mecanismo a seu serviço
é a indenização punitiva, consistente no arbitramento de valor signif‌icativo e de ca-
ráter punitivo ao agente lesante que age com dolo, culpa grave ou obtém lucro com
o ilícito em detrimento dos direitos extrapatrimoniais da pessoa.
INDENIZACAO PUNITIVA.indb 15INDENIZACAO PUNITIVA.indb 15 17/09/2021 11:11:4117/09/2021 11:11:41

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