A invenção da bioética

AutorGerson Neves Pinto
CargoDoutorado em Philosophie Médiévale, Ecole Pratique Des Hautes Etudes (2011), mestrado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1998)
Páginas211-227
211
DOI: 10.5433/2178-8189.2014v18n2p211
* Doutorado em Philosophie
Médiévale - Ecole Pratique
Des Hautes Etudes (2011),
mestrado em Filosofia pela
Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (1998). Gradu-
ado em Ciencias Juridicas pela
Universidade do Vale do Rio
dos Sinos (1985), e profes-
sor adjunto da Universidade
do Vale do Rio dos Sinos.
gerson.p@terra.com.br
SCIENTIA IURIS, Londrina, v.18, n.2, p.211-227, dez.2014 | DOI: 10.5433/2178-8189.2014v18n2p211
A invenção da bioética
THE INVENTION OF BIOETHICS
* Gerson Neves Pinto
Resumo: A Bioética está em permanente expansão no que se
refere às novas questões morais e jurídicas, mas ainda é incipiente
em sua fundamentação jurídico- filosófica. A noção de bioética
apresenta-se como uma ética nova para um novo homem, onde
as noções da ética clássica parecem não justificar as exigências
das novas questões colocadas pela bioética. Este trabalho aborda
a questão das novas tecnologias e de seus limites éticos e
jurídicos. Para tanto, avalia-se as contribuições de dois dos mais
importantes jus-filósofos contemporâneos sobre o tema, Jürgen
Habermas e Ronald Dworkin, e um possível diálogo destes dois
últimos com aquele que foi um dos fundadores da ética clássica,
Aristóteles.
Palavras-chave: Ética; Bioética; Genética; Contingência e
princípios.
Abstract: The Bioethics is in permanent expansion as regards
the new moral and legal issues, but it is still incipient in his legal
philosophical reasoning. The concept of bioethics presents itself
as a new ethics for a new man, where the notions of classical
ethics do not seem to justify the requirements of the new issues
raised by bioethics. This work deals with the issue of new
technologies and their ethical and legal limits. For both, it
evaluates the contributions of two of the most important
contemporary philosophers about the theme, Habermas and
Dworkin, and a possible dialog of these last two with him that
was one of the founders of classical ethics, Aristotle.
Keywords: Ethics; Bioethics; Genetics; Contingency and
principles.
212
GERSON NEVES PINTO
SCIENTIA IURIS, Londrina, v.18, n.2, p.211-227, dez.2014 | DOI: 10.5433/2178-8189.2014v18n2p211
1 A INVENÇÃO DA BIOÉTICA
No início do século XX Freud provocou a maior estupefação no meio
médico de então, ao afirmar que a sexualidade infantil é algo constitutivo da
neurose humana e que esta descoberta não deveria ser algo tão surpreendente
e repulsiva, pois, na realidade, ele simplesmente estava recuperando aquilo que
os gregos já sabiam há muito tempo e que está maravilhosamente narrado na
tragédia de Sófocles, Édipo Rei: o destino inelutável do ser humano. Do mesmo
modo, pode-se imaginar que, nos dias de hoje, com o advento da bioética,
estejamos, novamente, diante de uma nova irrupção daquilo que os gregos já
haviam prefigurado: a “caixa de pandora”, aquilo que simboliza, uma vez aberta,
a causa das maiores catástrofes, pois que nela se encontravam todos os males
da humanidade. Para muitos a bioética se constitui numa “caixa de Pandora”
às avessas, pois seria a redenção do ser humano no que diz respeito aos segredos
da vida e, sobretudo, à possibilidade de transcender o humano, enquanto mortal,
atingindo assim, o pós-humano ou o pós-natural.
Seja como for, a bioética é uma realidade e ela diz respeito a todos
os setores da atividade humana: o início e o fim da vida, a engenharia genética,
a biotecnologia moderna, a medicina e os medicamentos, etc. Enfim, a “caixa
de Pandora” já foi aberta, para o bem ou para o mal. Isto é, a bioética está no
nosso presente e estará, sem dúvida, no nosso futuro. O desafio agora é saber
como devemos nos conduzir para uma adequada utilização destes
descobrimentos e ter a consciência de que a bioética é que deverá tratar dos
problemas atuais e futuros de ordem ambiental e éticos que, fundamentalmente,
dizem respeito às liberdades individuais. É uma discussão, portanto, que
transcende o plano meramente técnico e científico, dizendo respeito ao conjunto
da sociedade que se vê frente à possibilidade de sofrer benefícios e malefícios.
O primeiro autor que, nos Estados Unidos, utilizou o vocábulo “bioética”
foi Van Rensselaer Potterquien. Em 1970 ele usou a combinação Bio-Ethik,
expressão que é composta das palavras gregas bios (vida) e ethos (ética) para
designar o estudo da moralidade das condutas humanas no domínio das ciências
da vida. Nesta nova abordagem acerca das condutas adotadas nas ciências
biomédicas, temos sempre presente uma tensão entre o desenvolvimento técno-
científico e a questão ética dos limites que devem ser observados por estas
novas tecnologias. Temos duas tendências aparentemente contraditórias
envolvendo os avanços da bioética: estes desenvolvimentos técno-científicos
ora emergem como melhorias das condições materiais da existência humana,

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT