Ir fonte sobre pagamentos sem causa e a beneficiários não identificados: a presunção de um estado mosquito

AutorJosé Roberto Vieira
Ocupação do AutorProfessor de Direito Tributário da Universidade Federal do Paraná ? UFPR e do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários ? IBET (graduação, especialização, mestrado e doutorado)
Páginas645-692
645
IR FONTE SOBRE PAGAMENTOS SEM CAUSA
E A BENEFICIÁRIOS NÃO IDENTIFICADOS: A
PRESUNÇÃO DE UM ESTADO MOSQUITO
José Roberto Vieira1
“Presunção demais, cérebro de menos...”
(ESOPO
2
)
1. As Fábulas
Embora seja tradicional, desde o século XVIII, e majori-
tária, a tríplice divisão dos gêneros literários – que OLEGÁ-
RIO PAZ e ANTÓNIO MONIZ, os especialistas lusitanos, atri-
buem a GOETHE, o poeta e pensador alemão3 – em: épico,
1. Professor de Direito Tributário da Universidade Federal do Paraná – UFPR e do
Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET (graduação, especialização, mes-
trado e doutorado); Mestre e Doutor em Direito do Estado – Direito Tributário
(PUC/SP); Estudos pós-graduados no Instituto de Estudios Fiscales (Madri, Espa-
nha); Ex-membro julgador do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda,
atual CARF (Brasília, DF); Ex-Auditor da Receita Federal (Curitiba, PR);
Parecerista.
2. Fábulas, p. 74-75.
3. Dicionário Breve de Termos Literários, p. 99.
646
IBET - INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
dramático e lírico4; preferimos ficar, contudo, na boa compa-
nhia de MASSAUD MOISÉS, o antigo professor titular de
Literatura da USP, para quem “...somente há dois gêneros: a
‘poesia’ e a ‘prosa’” e “...os gêneros seriam a expressão, a es-
trutura, de dois modos fundamentais de ver o mundo: o voltado
para fora – a prosa, e o voltado para dentro – a poesia”5.
Inexistem, porém, gêneros, ou espécies, ou formas, absolu-
tamente puras. A classificação adotada, como qualquer outra,
é ampla e aberta. Seu próprio autor reconhece e declara: “...a
nossa proposta de classificação dos gêneros deve ser lida na hori-
zontal, na vertical e na diagonal, admitindo toda sorte de associa-
ção”6. Daí as chamadas manifestações híbridas, como o teatro,
a poesia didática, o jornalismo, a oratória, o ensaio, a crônica, a
biografia, a autobiografia, a historiografia, a epistolografia etc.
É exatamente o caso das fábulas, não incluídas entre as mani-
festações especulativas ou destinadas ao registro dos fatos, mas,
sim, entre as utilitárias ou militantes, pela sua vinculação ética7.
Em termos de definição, selecionamos a de NAIR LA-
CERDA: “...uma pequena história... na qual as personagens são
animais, e cujo remate, invariavelmente, tem intenções morali-
zantes”
8
. Cabendo, ainda, o fecho de JEAN DE LA FONTAINE:
“...o corpo é a fábula, e a alma é a moralidade que dela deriva”
9
.
4. MASSAUD MOISÉS, Dicionário de Termos Literários, p. 202; ANGÉLICA SOA-
RES, Gêneros Literários, p. 8.
5. A Criação Literária: Poesia, p. 69.
6. Ibidem, p. 71.
7. MASSAUD MOISÉS, A Criação Literária: Prosa II, p. 153-154.
8. Introdução, in Fábulas do Mundo Inteiro, p. 9. De acordo MASSAUD MOISÉS:
“Narrativa curta... moral, implícita ou explícita... No geral, é protagonizada por ani-
mais irracionais...”Dicionário..., op. cit., p. 184. Também concordam OLEGÁRIO
PAZ e ANTÓNIO MONIZ: “...uma história sobre animais, com estatuto de interve-
nientes racionais, com finalidade didáctico-moral” (sic) – Dicionário Breve..., p. 92. E
inclusive o próprio LA FONTAINE: “Fábula é uma narrativa na qual, sob o véu da
ficção, vai envolta a moralidade, e cujos personagens são, ordinariamente, os ani-
mais”apud NAIR LACERDA, Introdução, op. cit., p. 9.
9. Apud idem.
647
RACIONALIZAÇÃO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO
A fábula aproxima-se do apólogo e da parábola. Para al-
guns, como reporta MASSAUD MOISÉS, a distinção entre es-
sas narrativas, todas curtas e marcadas pelo conteúdo moral,
residiria nas personagens: quando protagonizada por seres hu-
manos, seria a parábola; quando por objetos inanimados, seria
o apólogo; e quando por animais irracionais, seria a fábula
10
.
Etimologicamente, “fabula” é palavra oriunda do latim
“fabula”, com o significado de um tipo de narração alegórica
(ANTÔNIO GERALDO DA CUNHA11). Seu objetivo primeiro,
de conformidade com DEONÍSIO DA SILVA , o etimologista, é
o entretenimento das crianças no momento de dormir; inten-
to vinculado à mitologia romana, na qual, Fábula era uma di-
vindade alegórica, mascarada e magnificamente vestida, filha
de outros dois deuses: o Sono e a Noite12.
A fábula constitui uma forma narrativa “De longeva ori-
gem” (MASSAUD MOISÉS13), “...uma das... mais recuadas no
tempo...” (NAIR LACERDA14); ou, como observa MARCOS
BAGNO, o professor da UnB, as fábulas “...são tão antigas
quanto as conversas dos homens”15.
Com sua provável origem na Índia, que produziu o “Pan-
chatantra”, um conjunto de livros que constituiu o primeiro
fabulário de que se tem notícia16; as fábulas notabilizaram-se,
10. Dicionário..., op. cit., p. 34.
11. Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, p. 346. GABRIEL
PERISSÉ prefere sublinhar, na sua etimologia original, o verbo latino “fari”: falar,
narrar, contar histórias – Palavras e Origens, p. 64. Semelhante é a opção de FRAN-
CISCO DA SILVEIRA BUENO, que acentua a oralidade, apontando o verbo “fabu-
lari”: falar, contar oralmente – Grande Dicionário Etimológico-Prosódico da Língua
Portuguêsa (sic), v. 3, p. 1326.
12. De Onde Vêm as Palavras: Origens e Curiosidades da Língua Portuguesa, p. 417.
Conferir também: ALDO VANNUCCHI, Deus e o Diabo por Trás das Palavras, p. 63.
13. Dicionário..., op. cit., p. 184.
14. Introdução, op. cit., p. 9.
15.
Fábulas Fabulosas, in M. A. FREIRE e R. H. MENDONÇA (org.), Práticas de Lei-
tura e Escrita, p. 51.
16. Do sânscrito, “panch” e “tantra” significam cinco capítulos ou livros – NAIR LA-

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT