Jurisdição no controle difuso de constitucionalidade e instrumentos conexos.

AutorRafael Pandolfo
Páginas163-198
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6. JURISDIÇÃO NO CONTROLE DIFUSO DE
CONSTITUCIONALIDADE E INSTRUMENTOS
CONEXOS
6.1 Recurso extraordinário e repercussão geral
A positivação do controle difuso de constitucionalidade
no ordenamento jurídico brasileiro tem como ponto de parti-
da o preceito contido no art. 102, III, da Constituição Federal.
Segundo esse dispositivo, além de assegurar parcela da uni-
dade normativa infraconstitucional, dissipando incompatibi-
lidades existentes entre a lei local e a lei federal,373 compete
ao STF analisar as violações contra a Carta Maior presentes
em decisões judiciais, julgadas em única ou última instância,
contra as quais foi interposto recurso extraordinário.
Afora os requisitos recursais genericamente exigíveis, o
recurso extraordinário apresenta alguns específicos, quais se-
jam: causas decididas e prequestionamento. Esses requisitos
funcionam como mecanismos destinados a bloquear o exces-
sivo encaminhamento de recursos ao STF.
A autorização prevista no art. 1.029, § 3º, do CPC/2015, por
meio da qual o STF pode desconsiderar vício formal de recurso
373. Após a Emenda Constitucional n° 45, de 30 de dezembro de 2004.
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RAFAEL PANDOLFO
tempestivo ou determinar sua correção (desde que não o repute
grave), não se aplica às causas decididas, ao prequestionamen-
to nem à repercussão geral, requisitos expressamente exigidos
pelo legislador constituinte no inciso III do art. 102 e seu § 3º.
O prequestionamento não constitui mero rigorismo formal
que pode ser afastado pelo julgador, mas decorre da necessida-
de de obediência aos limites impostos ao julgamento das ques-
tões submetidas ao STF, cuja competência, outorgada pelo art.
102 da Constituição Federal, veda a apreciação originária de
temas não debatidos nas instâncias recursais antecedentes.374
O prequestionamento exige que a questão constitucional
tenha sido enfrentada pela decisão recorrida”. Eventual omis-
são deve ser sanada via embargos de declaração, interpostos
pelo recorrente.375
As causas decididas correspondem ao esgotamento re-
cursal ordinário. Conforme a Constituição, o STF somente
pode analisar os recursos interpostos contra decisões proferi-
das em única ou última instância.
Além da definitividade e do prequestionamento, a averi-
guação prévia pelo STF da relevância do tema ventilado no
recurso extremo sempre foi debatida nos meios acadêmico e
político brasileiros. Segundo a corrente majoritária, a análi-
se da abrangência e da significância jurídica e social do tema
submetido ao STF deveria ser incorporada ao ordenamento
brasileiro, seguindo o caminho trilhado por outros países.
No direito norte-americano, o juízo de relevância do
tema ocorre através do writ of certiorari, mecanismo também
dotado de larga subjetividade e utilizado com a finalidade de
fazer com que a Corte Suprema ocupe-se apenas de questões
constitucionais importantes para a sociedade.376
374. Nesse sentido, vide AI 836821 AgR, Relator: Min. LUIZ FUX, Primeira Turma,
julgado em 18.10.2011, D.J.U. 07.11.2011.
375. Súmula STF nº 356: o ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos
embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o
requisito do prequestionamento.
376. UNITED STATES OF AMERICA. Rules of The Supreme Court of The United
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JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIA
A convicção sobre a necessidade de um crivo de relevân-
cia exercido pelo STF na análise dos recursos extraordinários
resultou na aprovação da Emenda Constitucional 45, de 30 de
dezembro de 2004, a qual, acrescentando ao art. 102 da Cons-
tituição o § 3º abaixo reproduzido, introduziu o instituto da
repercussão geral do direito brasileiro:
§ 3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar
a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no
caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a ad-
missão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifes-
tação de dois terços de seus membros. (Incluída pela Emenda
Constitucional nº 45/2004)
Segundo André Ramos Tavares, deve-se compreender como
repercussão geral” a temática que afete um grande número de
pessoas; que trate de “assuntos significativos”; que possua um
significado geral, socialmente relevante; que transcenda os in-
teresses egoísticos e pessoais das partes processuais envolvidas;
que tenha “repercussão considerável sobre o conjunto do orde-
namento jurídico e político”. Ou, ainda, as causas quando envol-
vam (i) aspectos econômicos de monta; (ii) temas já amplamente
debatidos, mas ainda pendentes em diversas instâncias judiciais,
com decisões contraditórias; (iii) assuntos intrinsecamente rela-
cionados a causas pendentes de julgamento no STF.377
A Lei nº 11.418/2006 regulamentou, no plano infraconsti-
tucional, a repercussão geral, que foi inserida no art. 543-A do
antigo Código de Processo Civil. O conteúdo do comando le-
gal há pouco referido foi mantido e aprimorado pelo art. 1.035
do CPC/2015, abaixo reproduzido:
States. Rule 11. Certiorari to a United States Court of Appeals before Judgment: “A
petition for a writ of certiorari to review a case pending in a United States court of
appeals, before judgment is entered in that court, will be granted only upon a sho-
wing that the case is of such imperative public importance as to justify deviation from
normal appellate practice and to require immediate determination in this Court. See
28 U. S. C. § 2101(e)”. Disponível em: https://bit.ly/2lH5y7f Acesso em: 09 set. 2019.
377. TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 8. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2010. p 368.

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