Justiça como princípio, virtude ou vida? Uma análise a partir do liberalismo, comunitarismo e franciscanismo

AutorPlínio Valente Ramos Neto
Ocupação do AutorPossui graduação em Direito pela Universidade Federal do Piauí(1997)
Páginas245-268
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JustiÇa coMo PrincíPio, virtudE
ou vida? uMa anÁlisE a Partir
do libEralisMo, coMunitarisMo
E FranciscanisMo
Plínio Valente Ramos Neto1
introduÇÃo
Diante da pretensão do iluminismo de libertar os homens do medo2
por meio da dominação da natureza, a humanidade recaiu em uma nova
dominação, já que “[...] a própria razão tornou-se mero instrumento auxi-
liar do aparato econômico que tudo abrange”, como assenta Adorno.3
Jonas retoma esse tema da escravidão que o progresso contínuo do
ideal baconiano de dominação da natureza gerou na sociedade atual, algo
de tal magnitude que ameaça a própria existência da humanidade4.
1 Possui graduação em Direito pela Universidade Federal do Piauí(1997), especiali-
zação em Direito Processual pela Universidade Federal de Santa Catarina(2000) e mes-
trado em Direito pela Universidade Católica de Brasília(2013). Atualmente é Professor
do Instituto de Ciências Jurídicas e Sociais Professor Camillo Filho e Procurador da
Tribunal de Contas do Estado do Piauí.
2 ADORNO, eodor. O conceito de iluminismo. In: FLORIDO, Janice (Coord.)
ADORNO. São Paulo: Nova Cultural, 2005, p. 17.
3 Ibidem, p. 48.
4 JONAS, Hans. O princípio responsabilidade: ensaio de uma ética para a civiliza-
ção tecnológica. Tradução Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Con-
traponto: Ed. PUC – Rio, 2006, p. 235.
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ESTUDOS CONTEMPORÂNEOS DE FILOSOFIA DO DIREITO
Sustenta, ainda, que a humanidade está subjugada diante do po-
der gerado pelo saber e que é necessário “[...] um limite, um poder sobre
o poder [...]”5.
No âmbito da ética, Jonas explica que a razão neutralizou a na-
tureza no sentido axiológico, para depois neutralizar o próprio homem,
gerando um vácuo ético6. Inserido nesse contexto, Jonas dá um exemplo
do grande êxito econômico, que produziu uma enorme quantidade de
bens, elevando o bem-estar da sociedade, mas, ao mesmo tempo, geran-
do um risco de esgotamento de recursos naturais7.
Apel, da mesma forma, vê com preocupação a pretensa neutrali-
dade valorativa da ciência, tendo em vista os efeitos imponderáveis da
ação humana na natureza, resultando em um paradoxo para os tempo
atuais: se, diante da possibilidade de a humanidade deixar de existir em
razão das graves conseqüências das ações e conitos humanos, tem-se a
necessidade urgente de uma ética intersubjetivamente vinculatória ba-
seada na responsabilidade, ao mesmo tempo, há uma diculdade para
que oresça uma ética de superação de conitos, pois a pretensão de
neutralidade da ciência reduziu o discurso ético a uma mera questão de
ponto de vista ou ideologia8.
Não foi somente a ciência que procurou se desvencilhar da captu-
ra moral, pois, desde Maquiavel, já se defende o denominado realismo
político, que consiste em livrar os atos políticos de qualquer avaliação
ética, levando à “[...] dissociação entre a vida privada e a vida pública, ou
também à fragmentação do homem real entre indivíduo e cidadão, que
caracteriza a sociedade moderna”9. Essa fragmentação não passou des-
percebida por Rawls, quando, ao tratar da distinção entre razão pública
e razão não pública, vericou “[...] o risco de que o discurso público se
5 Ibidem, p. 237.
6 Ibidem, p. 65.
7 Ibidem, p. 235.
8 APEL, Karl-Otto. Estudos de moral moderna. Tradução de Benno Dischinger.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1994, p. 126-161.
9 VÁZQUEZ, Adolfo Sánches. Ética. 23. ed. Tradução João Dell’ Anna. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2002, p. 95.

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