Lançamento tributário

AutorMarina Vieira De Figueiredo
Ocupação do AutorMestre e doutoranda em direito tributário pela PUC/SP
Páginas63-105
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ΧΑΠ⊆ΤΥΛΟ ΙΙΙ
ΛΑΝ∩ΑΜΕΝΤΟ ΤΡΙΒΥΤℑΡΙΟ
Sumário: 3.1. A ambiguidade do termo “lança-
mento”. 3.2. A definição do conceito de lança-
mento pelo Código Tributário Nacional. 3.3. A
definição do conceito de lançamento pela dou-
trina em face das disposições do Código Tributá-
rio Nacional. 3.4. Nossa definição do conceito de
lançamento. 3.5. Lançamento e teoria dos atos
administrativos.
De acordo com o art. 3º do CTN, tributo é “toda presta-
ção pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se
possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, insti-
tuída em lei e cobrada mediante atividade administrativa ple-
namente vinculada”.
Essa definição deixa expressa um dos cânones que
informam o regime jurídico tributário, qual seja, o de que
todos os tributos deverão ser instituídos por lei para que
possam ser exigidos (art. 5º, II, da CF/88). Mas, mais do
que isso, é indispensável que todos os elementos essen-
ciais do tributo estejam previstos abstratamente na lei
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MARINA VIEIRA DE FIGUEIREDO
(150, I,123 da CF/88).124
Segundo Paulo de Barros Carvalho, para que uma nor-
ma institua um tributo validamente, deve trazer, no seu ante-
cedente, a previsão de um determinado comportamento (cri-
tério material = verbo + complemento), condicionado no
tempo (critério temporal) e no espaço (critério espacial). Seu
consequente, por sua vez, prevê uma relação jurídica, desig-
nando seus sujeitos ativo e passivo (critério pessoal), bem
como o seu objeto (critério quantitativo = base de cálculo +
alíquota).125
Uma vez instituído o tributo, por meio da fixação dos
critérios suprarreferidos – ou seja, positivando-se a regra-
-matriz de incidência tributária126 – surge a possibilidade de
exigência concreta do valor do tributo. Todavia, para que se
obrigue alguém a recolher determinado montante aos co-
fres públicos a título de tributo, não basta a previsão geral e
123. Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte,
é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – exigir
ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.
124. “O veículo introdutor da regra tributária no ordenamento há de ser
sempre a lei (sentido lato), porém o princípio da estrita legalidade diz mais
do que isso, estabelecendo a necessidade de que a lei adventícia traga no seu
bojo os elementos descritores do fato jurídico tributário e os dados prescri-
tores da relação obrigacional.” (Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito
tributário, p. 174).
125. Curso de direito tributário, p. 262-263.
126. “Deveras, são numerosos os postulados que regem a atividade impositiva
do Estado, praticamente todos inscritos, expressa ou de modo implícito, na
Constituição. Igualmente, abundantes as regras tributárias que envolvem a
instituição do gravame, tornando possível sua existência como instrumento
efetivo de desempenho do poder político, social e econômico-financeiro.
Todavia, são poucas, individualizadas e especialíssimas as regras-matrizes
de incidência dos tributos. Em princípio, há somente uma para cada figura
tributária [...]. Baseados nessa verificação empírica, nada mais congruente
do que designar por norma tributária em sentido estrito àquela que marca
o núcleo do tributo, isto é, a regra-matriz de incidência fiscal, e de normas
tributárias em sentido amplo a todas as demais.” (Paulo de Barros Carvalho,
Curso de direito tributário, p. 251-252).
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LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO: REVISÃO E SEUS EFEITOS
abstrata.127 É necessária, também, a edição de uma norma in-
dividual e concreta, o que se dá, por vezes,128 mediante o ato
de lançamento – que é, também ele, uma norma.
3.1. A ambiguidade do termo “lançamento”
É por meio do chamado “processo de positivação” – em
que as normas gerais e abstratas fundamentam a produção de
normas individuais e concretas – que o direito regula as con-
dutas intersubjetivas,129 prescrevendo direitos e deveres.
Como destaca Paulo de Barros Carvalho:
[...] a norma geral e abstrata, para alcançar o inteiro
teor de sua juridicidade, reivindica, incisivamente, a
edição de uma norma individual e concreta. Uma or-
dem jurídica não se realiza de modo efetivo, motivan-
do alterações no terreno da realidade social, sem que
127. Como ensina Lourival Vilanova: “Em nossa terminologia, não há rela-
ção jurídica geral (como não há situação jurídica geral, seu equivalente). Da
norma geral não se passa imediatamente para a relação ou situação jurídica
sem interposição de um fato (fato natural ou conduta). Se fato não ocorreu, a
norma geral (ou individual) permanece em seu status proposicional, lógico,
sintático, sem os correspondentes semânticos ou fácticos: o direito-norma
não se realiza, não é realidade sociocultural. (Causalidade e relação no di-
reito, p. 139).
128. Como será melhor demonstrado nos itens subsequentes, adotamos o
posicionamento segundo o qual a constituição do crédito tributário – ou
seja, a aplicação da norma geral e abstrata que institui o tributo e a conse-
quente produção de uma norma individual e concreta – é competência que
pode ser exercida tanto pela Administração Pública quanto pelo particular
(sujeito passivo). Contudo, estaremos diante do fenômeno “lançamento”
apenas quando tal operação for realizada pela Administração, nos termos
prescritos pelo art. 142.
129. “O direito positivo se exprime com locuções como “estar facultado a fazer
ou omitir”, “estar obrigado a fazer ou omitir”, “estar impedido de fazer ou
omitir”. E tais locuções não descrevem como factualmente o sujeito agente se
comporta, mas como deve comportar-se.” (Lourival Vilanova, As estruturas
lógicas e o sistema de direito positivo, p. 68).

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