LC n. 84/1996

AutorWladimir Novaes Martinez
Ocupação do AutorAdvogado especialista em Direito Previdenciário
Páginas424-430

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A tentativa de nivelar as obrigações pessoais e patronais em relação a todos os trabalhadores, entre subordinados e independentes, nem sempre alcançada, desde 1969, levou o legislador a criar contribuições das empresas em relação a quem lhes prestar serviços.

O processo iniciou-se com o Decreto-lei n. 959/1969, passou pela Lei n. 7.787/1989 e culminou com a LC n. 84/1996 e algumas modificações operadas pela Lei n. 9.876/1999. Finalmente, atualizado com a Lei n. 10.666/2003.

Ainda que revogada pela Lei n. 9.876/1999 e afetada a partir de 1º.4.2003, mantêm-se os comentários.

731. Introdução do assunto - A LC n. 84/1996 restabeleceu a contribuição patronal (historicamente introduzida pelo Decreto-lei n. 959/1969, alterada pela Lei n. 5.890/1973, revista pela Lei n. 7.787/1989 e mantida pela Lei n. 8.212/1991) - objeto da arguição de inconstitucionalidade ADI n. 1.202?2/DF, com exigibilidade suspensa em 12.5.1994, por decisão do STF, sob dois fundamentos:

  1. significado da expressão "folha de salários", constante do art. 195, I, da Constituição Federal, e

  2. necessidade de lei complementar para sua implementação (art. 195, § 4º).

    Olvidando-se do disposto no art. 7º, XXXIV, da Carta Magna, além do empresário e do autônomo, o STF incluiu o avulso naquela decisão, categoria de trabalhador portuário não subordinado, quase empregado ou quase autônomo, regulamentada desde 1926, juntamente com os dadores de serviços, aportando como se empregado dos sindicatos ou dos armadores fosse (não é). Por conseguinte, afetando impropriamente a parte patronal da contribuição gerada por esses segurados.

    Aparentemente, as duas exigências teriam sido atendidas - o instrumento normativo é lei complementar e com amparo no mencionado art. 195, § 4º: "A lei poderá instituir outras fontes" (as usuais constam do seu caput, I a III, para as quais basta lei ordinária), "destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I." Trata-se da competência residual da União, desenvolvida por Valdir de Oliveira Rocha, em que distingue a não cumulatividade ("A Competência residual da União e a contribuição ao Finsocial", in Repertório IOB de Jurisprudência da 1ª quinzena de novembro de 1991, p. 393/96).

    O preceito remetido reza: "A União poderá instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior" (em que arrolados tributos da União), "desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição" (grifos nossos).

    A remissão do art. 195, § 4º, ao mecanismo do art. 154, I, necessariamente não vincula eventual significado estrito à palavra "impostos", e nem por isso classifica a cotização securitária como espécie tributária. O fato gerador da obrigação fiscal individual, do empresário e do avulso (retribuição por serviços prestados exclusivamente à pessoa jurídica), e do autônomo (igual, porém, à física e à jurídica), e, nas hipóteses do art. 3º, §§ 1º e 2º, da lei enfocada, a base de cálculo do salário-base dos contribuintes individuais pessoalmente sopesados, repousam no art. 195, II, do Estatuto Político.

    Alguns estudiosos manifestaram-se sobre a natureza da obrigação em foco e possível inconstitucionalidade.

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    O mesmo Valdir de Oliveira Rocha, cauteloso na defesa das liberdades individuais, a tem com aquele defeito por exigir procedimentos da empresa ao contratar o autônomo, como ter de verificar se inscrito, se contribuindo e qual a sua classe na escala de salários-base. Considera afetada a liberdade de associação, o direito de não ser compelido a associar-se, a livre-iniciativa, a livre concorrência e o livre exercício da atividade econômica ("Direitos Constitucionais à Liberdade e Contribuição de Seguridade Social sobre Pagamentos feitos a Trabalhadores Autônomos", in Revista Dialética de Direito Tributário, de abr./1996, p. 63/70).

    Para Sergio Pinto Martins, é inconstitucional em razão de o fato gerador ser igual ao do ISS (Decreto-lei n. 406/1968). Da mesma forma contrariaria a Carta Magna quando exige 2,5% a mais das entidades financeiras. Capacidade contributiva, para ele, é princípio não aplicável às contribuições sociais ("Contribuição Social Criada pela Lei Complementar n. 84/1996", in Repertório IOB de Jurisprudência. da 1ª quinzena de abr./1996, p. 163/64).

    A observação de Valdir de Oliveira Rocha é excesso de zelo de especialista cuidadoso. Muitíssimas outras obrigações acessórias são cometidas às empresas ou contribuintes, há décadas, até de complexidade superior à imposta pela inovação, sem terem sido contestadas no Judiciário, valendo lembrar a história da exigibilidade em discussão, desde 1969. A intenção do legislador é tentar evitar fraude à CLT e diminuir evasão da receita previdenciária, impondo ônus à contratação de autônomos no lugar de empregados; não chega a exigir a associatividade nem destrói a livre concorrência ou exercício da atividade econômica.

    O ponto de vista de Pinto Martins decorre de filiar-se à majoritária corrente tributária, segundo a qual a exação previdenciária ou é tributo propriamente dito ou é espécie tributária. A partir daí, é lógico concluir no sentido da duplicidade com o ISS, mas esse não parece ser entendimento capaz de esgotar o assunto diante das distinções operadas pela especificidade da previdência social e manifesta no Texto Constitucional.

    A Confederação Nacional da Indústria ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI n. 1.432?3/600. A liminar foi indeferida por unanimidade em 18.4.1996 (in DJ de 26.4.1996, Seção I, p. 13.078), manifestando-se o Consultor Jurídico do MPAS - não obstante filiar-se o parecerista Paulo José Leite Farias à corrente tributarista - favorável à constitucionalidade (Parecer CJ/MPAS n. 552/1996, in DOU de 14.5.1996).

    Os sujeitos passivos são distinguidos, exatamente como sucede com a contribuição patronal e profissional, previstas no art. 195, I (arts. 20 e 22 da Lei n. 8.212/1991), em que igual o fato gerador, mas não a base de cálculo para empregado auferindo acima do limite do salário de contribuição (R$ 4.159,00, em 2013). Num caso, a pessoa jurídica (empresa) e, no outro, a física (segurado).

    Na ementa da lei, é perceptível a preocupação formal do legislador de adequar a norma ao preceituado na Lei Maior (ab initio, o texto alude à manutenção da seguridade social).

    As fontes formais da exigibilidade são os arts. 195, § 4º (a par das contempladas nos incisos I a III, prevê outras fontes de recursos), 154, I (autoriza a criação de impostos não cumulativos e sem fato gerador ou base de cálculo concebido na Carta Magna), 146, III (elenca a atribuição da lei complementar - fixar regras gerais), e 150, II (isonomia exacional), 150, § 6º (distingue exações tributárias das previdenciárias), da Constituição Federal e o Código Tributário Nacional (Lei n. 5.172/1966).

    Não podem ser desprezados o Decreto-lei n. 959/1969 (criou), as Leis ns. 5.890/1973 (modificou), 7.787/1989 (ampliou) e, especialmente, a Lei n. 8.212/1991 (manteve).

    Em nível administrativo, o Decreto n. 1.826/1996, a Instrução Normativa SPS n. 5/1996 e o Parecer CJ/MPAS n. 552/1996.

    Alguma coisa precisa ser regulamentada. O modus operandi das relações de autônomos e empresários com a empresa, no tocante ao salário-base, carece de elucidação, principalmente esclarecer o significado do "estar contribuindo", "distribuição" de importâncias, situação do autônomo não inscrito, dos carreteiros etc.

    732. Sujeito passivo - Os obrigados à exigência são as "empresas e pessoas jurídicas" (inciso I), com destaque para as cooperativas (aliás, quando voltadas ao trabalho, objeto de inciso apartado), quando seria suficiente alusão às empresas. Estas últimas, no dizer do art. 15 da Lei n. 8.212/1991 - cuja remissão é autorizada pelo art. 5º -, são as pessoas jurídicas (per se incluindo as cooperativas). A intenção é desfazer dúvidas sobre empreendimentos não lucrativos lato sensu e instituições (v. g., partidos, igrejas, órgãos de representação estrangeira e o próprio Estado), todos submetidos à norma.

    É incluído o autônomo, com ou sem empregado, quando contrata autônomo; a associação ou fundação; a sociedade civil ou comercial e o condomínio urbano ou rural, horizontal ou vertical. Sem dúvida, também o segurado especial, enquadrado no caput do art. 15 citado.

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