Liquidação e execução na Lei 7.347/85

AutorMarcelo Abelha Rodrigues
Páginas417-452
CAPÍTULO 12
LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÃO NA LEI 7.347/85
1. LIQUIDAÇÃO
1.1 Introito
Só é possível promover a execução civil se todos os elementos da obrigação estive-
rem identif‌icados na decisão: se ela é devida, a quem é devida, quem deve e quanto (ou o
que) é devido. Para que seja dado início a atividade executiva é preciso que todos estes
elementos estejam revelados na decisão judicial, pois do contrário torna-se impossível
efetivar a satisfação do direito.
Há casos em que a identif‌icação do quantum ou o que é devido não se dá no mesmo
momento (provimento judicial) em que os demais elementos da obrigação são def‌ini-
dos, permitindo o legislador que esses aspectos sejam aferidos em atividade cognitiva
posterior, numa fase subsequente.
Assim, os provimentos judiciais que impõe uma prestação e que estejam incomple-
tos são chamados de genéricos e falta-lhes elemento essencial para dar início à atividade
executiva. Trata-se, pois, de regra excepcional, pois o ordinário é que a decisão judicial
contenha todos os elementos da obrigação.
1.2 Hipóteses de liquidação
A liquidação é sempre de um provimento judicial e será sempre necessária quando
se pretender promover a execução desse provimento judicial, de forma que não há a pos-
sibilidade de se liquidarem títulos extrajudiciais. Existem no Código de Processo Civil,
totalmente aplicável à ação civil pública ambiental, inúmeras hipóteses de liquidação
de provimentos judiciais, sendo a do art. 509 e ss. a que cuida pormenorizadamente do
instituto, inclusive a que lhe dá o nome (liquidação de sentença).
Entretanto, como se disse, as hipóteses de liquidação do provimento judicial estão
espalhadas no Código, tal como se observa no art. 520, I, no art. 302, parágrafo único,
no art. 356, §4º, no art. 499 etc. em que não se tem propriamente uma liquidação de
sentença, mas sim de um provimento judicial. Há, ainda, situações em que o Código não
revela a necessidade de prévia liquidação judicial, mas isso será inexorável, tal como
ocorre com a sentença penal condenatória, que, normalmente, antes de ser executada,
deve passar por prévia liquidação judicial.1
1. Nada obstante o artigo 515, VI arrolar como título executivo judicial a sentença penal condenatória transitada em julgado, se-
guindo a determinação do artigo 387 do Código de Processo Penal, continuamos a sustentar que a sentença penal condenatória é
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AÇÃO CIVIL PÚBLICA E MEIO AMBIENTE • MARCELO ABELHA RODRIGUES
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Basta imaginar hipótese de ação civil pública ambiental proposta para obter a
restauração ambiental da área suprimida com pedido cautelar paralisação de toda e
qualquer atividade na referida área. Ao proferir a sentença que seria executada proviso-
riamente (art. 14 da LACP) verif‌ica-se que a área suprimida que f‌icou intocada durante
o processo acabou por regenerar-se sozinha, caso em que mostra-se desnecessária a
desaconselhável a restauração se assim for certif‌icada por órgão técnico competente..
Nesta hipótese deve-se aplicar a regra dos artigos 499 e 500 do CPC:
Art. 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a
tutela especíca ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.
Art. 500. A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa xada periodicamente para
compelir o réu ao cumprimento especíco da obrigação.
Observe que não faria nenhum sentido manter o dever de restauração do que já
havia sido restaurado. Nesta hipótese o dever de restaurar – cuja restauração foi obtida
naturalmente pela intocabilidade da área durante todo o tempo de vigência da liminar
que suspendeu a atividade – deverá ser convertido em perdas e danos por meio de li-
quidação que precederá a execução.2
1. Trata-se, na origem, de Agravo de Instrumento interposto pelo ora insurgente contra decisão que indeferiu
pedido de declaração de nulidade da perícia, realizada nos autos da Ação Civil Pública Ambiental 1248-
84.2003.8.26.0587, sob o argumento de que não teria sido intimado da realização dos trabalhos periciais
e, por conseguinte, não pôde seu assistente técnico acompanhá-los.
2. Ocorre que, segundo o que se verica da Petição de s. 488/495, e-STJ, bem assim do sítio do TJSP, a Ação
Civil Pública em tela já teve seu mérito apreciado em sentença datada de 11/11/2008. Eis o dispositivo da deci-
são: “JULGO PROCEDENTE a presente Ação Civil Pública, nos termos do artigo 269, I, do Código de Processo
Civil, para CONDENAR os requeridos na: 1) obrigação de não fazer consistente em cessarem toda e qualquer
atividade degradadora do meio ambiente local (v.g. supressão de vegetação, edicação, introdução de espécies
exóticas), sob pena de multa diária no valor equivalente a R$ 500,00; 2) obrigação de fazer, consistente na
demolição das edicações erigidas, com a retirada de entulho, de espécies exóticas, de aterro, restaurando o
status quo ante, mediante projeto a ser submetido ao DEPRN, no prazo de 120 dias, sob pena de multa diária no
valor equivalente a R$ 500,00. Eventual inviabilidade técnica na recuperação da área implicará na conversão
em perdas e danos, a ser auferida em liquidação de sentença. Carreio aos requeridos o pagamento das custas
e despesas processuais, consignando não haver condenação nos honorários advocatícios por inaplicáveis à
espécie. P.R.I.C. Sã o Sebastião, 06 de novembro de 2008. Guilherme Kirschner Juiz de Direito Custas de Preparo
– Taxa Judiciária R$ 74,40 – Porte de Remessa – R$ 62,88 TOTAL R$ 137,28”. (...) (AgRg no REsp 1532528/SP,
Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 08/09/2015)
Se neste exemplo tivessem sido feitos vários pedidos como restaurar a área, deli-
mitar as áreas adjacentes, informar a população sobre os riscos e cuidados com a área
etc. então teremos a possibilidade de execução imediata de algumas obrigações de fazer
e prosseguimento de liquidação da obrigação de pagar quantia, fruto da conversão do
dever de restaurar.
título hábil à liquidação no juízo cível e não de execução, pois, não nos parece correto que o juízo penal tenha competência para
f‌ixar o quantum indenizatório mínimo, e, tampouco é discutido no juízo penal o dano para f‌ins de reparação. Neste sentido é a
orientação do Superior Tribunal de Justiça.
2. Muitas vezes essa percepção só é feita quando se dá início a execução da obrigação de fazer e no curso dela verif‌ica-se que não é
mais necessária a restauração do que naturalmente foi restaurado.
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1.3 A liquidação da sentença provisória ou denitiva
Apenas as sentenças condenatórias genéricas são passíveis de liquidação para a
apuração do valor devido. A verif‌icação do valor devido pode ser feita antes ou depois
do trânsito em julgado da sentença liquidanda. Será feita antes quando for requerida
a liquidação na pendência do recurso interposto contra a sentença liquidanda, e, por
razões lógicas, deverá ser feita em autos apartados, pois o fascículo principal estará no
juízo ad quem para processamento e julgamento do recurso. Será feita depois se a parte
optar por fazê-lo após o trânsito em julgado da sentença liquidanda, e, neste caso, será
requerida nos autos principais, tal como determinam os artigos 509, §3º e 512 do CPC.
Nas hipóteses de julgamento parcial do pedido (art. 356 do CPC) é possível que
esta decisão seja reconhecedora de uma obrigação líquida ou ilíquida. Nesta hipótese a
parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação reconhecida na decisão que
julgar parcialmente o mérito com fulcro no art. 16 da LACP, e, portanto, independente-
mente de caução, ainda que haja recurso interposto. Se a decisão parcial do mérito tiver
transitado em julgado, então a execução será def‌initiva.
Para permitir uma melhor gestão e organização do processo permite o Código no art.
456, §4º que a liquidação e o cumprimento da decisão que julgar parcialmente o mérito po-
derão ser processados em autos suplementares, a requerimento da parte ou a critério do juiz.
Aplica-se integralmente o art. 356 do CPC às ações civis públicas ambientais, uma
vez que é bastante comum que nelas constem vários pedidos cumulados e em relação
a muitos deles seja possível julgamento antecipado, tal como cumulação de pedido
de anulação de licença (provimento constitutivo), com demolição de construção, com
revegetação de área, com dano moral coletivo etc. Não será incomum a possibilidade de
julgamento parcial do conf‌lito em relação aos três primeiros pedidos e manutenção da
decisão em relação ao seguinte.
1.4 A liquidação autônoma
A liquidação da sentença segundo o artigo 509 do CPC, inicia-se a requerimento do
credor ou do devedor, dando início a um incidente processual cognitivo, pois depende de
requerimento do interessado. Não dá início a um novo processo, pois é apenas uma fase
complementar à condenação genérica. Poderá, contudo, excepcionalmente, não ser apenas
um procedimento ou fase cognitiva anterior ao cumprimento da sentença, dando início a
um incidente autônomo, tal como acontece nas hipóteses do art. 515, §1º, em que a sen-
tença genérica tenha sido formada em juízo diverso do que irá processar a execução civil.
1.5 Objeto e cognição da liquidação da sentença
A liquidação da sentença tem por f‌inalidade tornar líquido um provimento judicial
ilíquido. Portanto, diz respeito, quase sempre, à descoberta do valor devido para a fu-
tura execução por quantia. Neste particular corrobora o que diz o art. 509 que, “quando
a sentença condenar ao pagamento de quantia ilíquida, proceder-se-á à sua liquidação, a
requerimento do credor ou do devedor”.
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