Litisconsórcio

AutorRodrigo Klippel
Páginas349-369
CAPÍTULO 8
LITISCONSÓRCIO
1. LITISCONSÓRCIO – CONCEITO
Como aponta José Carlos Barbosa Moreira, em obra clássica,1 o litisconsórcio
é o fato processual de mais de uma pessoa ou ente, simultaneamente, f‌igurarem no
mesmo polo do processo. É a pluralidade de autores e/ou de réus.
O processo se torna muito mais complexo quando tiver início por meio de de-
manda que englobe cumulações objetivas e/ou subjetivas (pluralidade de causas de
pedir, pedidos e/ou de partes). Verif‌icam-se certas dif‌iculdades quando qualquer das
duas formas de cumulação (objetiva ou subjetiva) ocorre, visto que surgirão dúvidas
que não se observam nas demandas de estrutura simplif‌icada (um só autor dedu-
zindo um só pedido em face de um só réu). Por exemplo, será necessário investigar
qual a relação que existe entre as pessoas que participam do mesmo polo da relação
processual (litisconsortes); qual a relação entre os pedidos, etc.
Vários dos mais sérios problemas relacionados ao processo civil situam-se na
esfera do estudo das cumulações, sendo exemplo o tema do litisconsórcio necessário,
estudado mais abaixo neste capítulo.
Por isso é tão importante destrinchar as muitas peculiaridades e variações do
litisconsórcio. Para tanto, uma vez identif‌icado o que o litisconsórcio é (pluralidade
de autores e/ou de réus) deve-se pesquisar (i) em quais hipóteses pode-se formar o
litisconsórcio e (ii) quais as classif‌icações que o litisconsórcio pode ter.
2. HIPÓTESES EM QUE É CABÍVEL FORMAR O LITISCONSÓRCIO
O art. 113 do CPC é responsável por demonstrar quais são as situações em que
é possível formar-se o litisconsórcio. Em primeiro lugar, deve-se dizer que o tema
sofre inf‌luência marcante do direito material deduzido em juízo.
Somente há três hipóteses em que se autoriza a formação do litisconsórcio. A
primeira delas é a de “comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide” (art.
113, I do CPC). Os litisconsortes possuem direito ou têm um dever relativo a um
mesmo bem da vida. Veja os exemplos:
CASO 1: A af‌irma que é o verdadeiro proprietário do imóvel que está na posse
de B e C, requerendo, portanto, que o bem lhe seja entregue. A obrigação de B e de C
é, portanto, a de entregar o mesmo bem a A, caso este último tenha razão.
1. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Litisconsórcio unitário. Rio de Janeiro: Forense, 1972, p. 11.
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TEORIA GERAL DO PROCESSO & TEORIA DO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO • RODRIGO KLIPPEL
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CASO 2: X e Y, credores solidários, ajuízam ação de cobrança em face de Z,
demandando-lhe que seja paga a dívida de R$ 200.000,00 que este último tem para
com eles. O direito de X e Y, dessa forma, é o de receber o mesmo crédito.
A segunda hipótese que autoriza a formação do litisconsórcio é a de conexão
entre as pretensões dos litisconsortes (art. 113, II do CPC).
A conexão não é difícil de enxergar quando a semelhança entre as pretensões se
localiza no pedido, visto que basta observar se as partes estão discutindo a titularidade
do mesmo bem da vida (e não de bens parecidos. Lembre de tudo o que estudamos
no Capítulo 5). Todavia, não é essa a espécie de conexão que, na maioria dos casos,
justif‌ica a formação de litisconsórcios por conexão, mas sim a que se relaciona à
identidade entre as causas de pedir.
Para que haja conexão entre as pretensões deduzidas pelos litisconsortes, pela
causa de pedir, é necessário que, pelo menos, um dos elementos fáticos que funda-
mentam os pedidos feitos por eles seja idêntico. Em suma: deve-se pesquisar a causa
de pedir remota e um dos fatos ali descritos deve ser exatamente o mesmo. Assim
ocorre, por exemplo, no caso em que A, B e C cobram de D indenização pelo fato de
este último ter-lhes causados danos materiais decorrentes de acidente de trânsito.
Percebam que na causa de pedir remota de todos eles existe um elemento essencial
e comum: o engavetamento de carros (a batida coletiva) foi provocado por D. O
fato de onde nascem as lesões individuais é exatamente o mesmo. Perceba que não
foram acidentes diferentes, mas semelhantes, os que aconteceram com A, B e C. Foi
exatamente o mesmo acidente. Daí se dizer que parte da causa de pedir de cada um
deles é igual. Logo, há conexão.
A grande dif‌iculdade que os operadores do direito têm é a de diferenciar a conexão
de um outro tipo de relação entre as pretensões, mais tênue e, portanto, fraca, mas
que igualmente permite a formação do litisconsórcio, que é a chamada “af‌inidade de
questões por ponto comum de fato ou de direito(art. 113, III do CPC) .
Os pedidos feitos pelos litisconsortes têm algo em comum, mas se trata de ligação
menos intensa do que a chamada conexão, visto que nenhum dos elementos da causa
de pedir remota será idêntico.
Como visto no Capítulo 5, há af‌inidade de questões de direito quando cada parte
tutela direito autônomo seu – e que não possui nenhum vínculo de fato com o do
outro – com base na mesma tese jurídica. Observe o exemplo:
Duas empresas, X e Y, atuam na mesma área de comércio, sendo concorrentes.
Não realizam qualquer parceria. Seus donos nunca se viram. Comum entre elas é
pagar o mesmo tipo de tributo e ter o mesmo advogado que, certo dia, lhes apresenta
uma tese jurídica tributária, que lhes permitirá não mais pagar certo imposto. É
possível que ajuízem em litisconsórcio a demanda na qual pedirão a exoneração do
dever de pagar o aludido tributo? Sim.
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