Sobre os manuais (de uso, operação, manutenção e garantia)
Autor | Carlos Pinto Del Mar |
Páginas | 466-482 |
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Um dos objetivos da Política Nacional das Relações de Consumo, estabelecido no art. 4º do CDC813, é o da transparência das relações de consumo. Para Cláudia Lima Marques, significa informação clara e correta sobre o produto a ser vendido, sobre o contrato a ser firmado, lealdade e respeito nas relações entre fornecedor e consumidor, mesmo na fase negocial dos contratos de consumo814.
Derivado do princípio da transparência, há o dever de informar o consumidor sobre as qualidades do produto ou serviço e as condições do contrato, seja: (a) por meio da oferta, clara e correta (publicidade ou qualquer outra informação suficiente – art. 30815), sob pena de o fornecedor responder por falha da informação (art. 20816) ou ser forçado a cumprir a oferta nos termos em que foi feita (art. 35817); seja (b) por meio do próprio texto do contrato (arts. 46818 e 54, § 3o 819 do CDC).
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O inciso III, do art. 4º, do CDC, ao conferir o direito à informação, aplica a transparência no mercado de consumo, tal como almejado pelo caput do art. 4º820, mas
a base do dever de informar é o art. 6º, III do CDC, secundado pelo inciso II do mesmo artigo821.
Entre os direitos básicos de informação sobre o produto, assegurados ao consumidor, estão aqueles previstos no art. 6º, do CDC, de: educação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços (inciso II); e de informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem (inciso III). Além desses, o CDC prevê o dever de informar adequadamente sobre riscos anormais do produto (art. 8º) e, em se tratando de produto industrial, informações através de impressos apropriados que devam acompanhar o produto (art. 8°, § único822), bem como o dever de esclarecer as condições da garantia e de entregar, no ato do fornecimento, o manual de instrução, de instalação e uso do produto (art. 50, § único823).
Analiticamente, temos: primeiramente o direito básico à informação do consumidor (art. 6º, III824); depois, nas diversas fases da relação de consumo, temos: arts. 8º e 10
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(informação sobre riscos e periculosidade); arts. 12 e 14 (defeitos de informação); 18 e 20 (vícios de informação); 30, 31, 33, 34 e 35 (eficácia vinculativa da informação, sua vinculação à oferta e proposta, e as consequências da violação do dever de informar); art. 36 (dever de informar na publicidade); art. 46 (ineficácia em relação ao consumidor, das disposições contratuais não informadas); art. 51 (abrangência, pelo conceito de cláusula abusiva, daquelas que não foram suficientemente informadas ao consumidor); arts. 52 e 54 (deveres específicos de informação nos contratos), todos do CDC.825
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Conforme o CDC, a informação deve ser clara e adequada: arts. 12 14, 18, 20, 30, 33, 34, 46, 48, 52 e 54826. Trata-se de elemento que afeta a essência do negócio jurí-
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dico, na medida em que a informação repassada ou requerida integra o conteúdo do contrato (arts. 30, 33, 35, 46 e 54)827.
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Por outro lado, a ausência ou falha das informações prestadas ao consumidor, poderá representar a falha (ou vício) na qualidade do serviço ou produto oferecido, conforme os artigos 18828, 20829 e 35830, do CDC831.
No âmbito do Código Civil (CC), a transparência e o dever de informação estão compreendidos na previsão do art. 422, pois contemplam algumas das funções da boa-fé objetiva, qual seja, um dever de conduta832. Assim, o dever de informar está associado à ideia de lealdade, que acompanha a noção de boa-fé, como um de seus desdobramentos.
O dever de informar apoia-se na premissa de um déficit informacional do consumidor perante o fornecedor, pois é este que detém o conhecimento especializado acerca de dados do processo de produção, fornecimento e uso dos produtos e serviços.
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O dever de informação está presente também no parágrafo único do art. 50, do CDC833, que estabelece a obrigação de entrega ao consumidor, no ato do fornecimento, de termo de garantia acompanhado de manual de instrução, de instalação e uso do produto em linguagem didática, com ilustrações.
Os impressos apropriados referidos no art. 8º, parágrafo único, e o manual previsto no art. 50, parágrafo único, ambos do CDC, se denominam de forma genérica “manuais”, que tanto podem ser de “garantia”, como de “uso, manutenção e conservação de edificações”, com denominações similares (“manual de garantia”; “manual de uso, operação e manutenção”; “manual do proprietário” etc.), tal como a eles se referem a NBR 15575, a NBR 14037, a NBR 5674 e diversas outras normas técnicas.
A NBR 15575:2013 estabelece os requisitos mínimos de desempenho que devem ser atendidos pelas edificações habitacionais e deixa expressos, na sua Introdução (p. XI), os pressupostos da sua aplicabilidade e exigência, a saber: que “os sistemas sejam projetados, construídos, operados e submetidos a intervenções de manutenção que atendam as instruções específicas do respectivo Manual de uso, operação e manutenção”.
Assim consta na Introdução, da Parte 1, da NBR 15575:2013834 :
nbr 15575-1:2013
Todas as disposições contidas nesta Norma aplicam-se aos sistemas que compõem edificações habitacionais, projetados, construídos, operados e submetidos a intervenções de manutenção que atendam as instruções específicas do respectivo manual de uso, operação e manutenção.
O texto é claro e dispensa maiores interpretações: os requisitos de desempenho estabelecidos na Norma pressupõem a operação e as intervenções de manutenção, que atendam os manuais de uso e operação.
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Inclusive, esse conceito vem repetido no Anexo D, da Parte 1, da NBR 15575:2013:
nbr 15575-1:2013
Anexo D (informativo)
D.1 Introdução
O desempenho dos sistemas que compõem o edifício habitacional durante a sua vida útil (VU) está atrelado às condições de uso para o qual foi projetado, à execução da obra de acordo com as Normas, à utilização de elementos e componentes sem defeito de fabricação e à implementação de programas de manutenção corretiva e preventiva no pós-obra835.
No caso de uma edificação habitacional, cabe aos titulares e/ou usuários realizar a manutenção, mediante a realização de serviços ou substituição dos componentes, elementos e sistemas construtivos, por si, ou por meio de pessoas ou empresas especializadas (quando for o caso).
Essa incumbência está assim prevista na NBR 15575:2013:
nbr 15575-1:2013
5.5 Usuário
Ao usuário ou seu preposto cabe realizar a manutenção, de acordo com o estabelecido na NBR 5674 e o manual de uso, operação e manutenção, ou documento similar (ver 3.26)836.
Em outras passagens do texto, a Norma reitera a incumbência dos usuários pela realização das atividades de manutenção:
nbr 15575-1:2013
Anexo C (informativo)
OBSERVAÇÕES abaixo da “Tabela C.4 – Critérios para o estabelecimento da VUP das partes do edifício”
(...)
Aos usuários é incumbido realizar os programas de manutenção, segundo NBR 5674, considerando as instruções do manual de uso, operação e manutenção e recomendações técnicas das inspeções prediais837.
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nbr 15575-1:2013
Anexo C (informativo)
OBSERVAÇÕES abaixo da: “Tabela C.6 – Exemplos de VUP a aplicando os conceitos deste Anexo”
(...)
Para se atingir a VUP, os usuários devem desenvolver os programas de manutenção segundo NBR 5674. Os usuários devem seguir as instruções do manual de uso, operação e manutenção, as instruções dos fabricantes de equipamentos e recomendações técnicas das Inspeções prediais838.
Ou seja, fica exaustivamente claro, no texto da NBR 15575:2013, que a responsabilidade, a obrigação pela realização das atividades de manutenção é dos usuários, como, a propósito, nos parece correto.
Inclusive, sempre que a NBR 15575:2013 faz menção à obrigação dos usuários de realizar a manutenção, indica que deve ser feita conforme recomendado no Manual de Uso, Operação e Manutenção fornecido pelo incorporador ou construtor, que é peça indispensável para essa finalidade.
Com efeito, a manutenção depende da correta informação sobre os procedimentos necessários, que deve ser veiculada, entre outros meios, por manuais elaborados pelos fornecedores – impressos ou em mídias eletrônicas – contendo as instruções necessárias para a sua realização.
E a informação que deve ser dada pelo fornecedor diz respeito, por exemplo: (I) às características técnicas básicas dos sistemas construtivos, para nortear o seu uso correto; (II) aos cuidados no uso; (III) às atividades de manutenção que devem ser realizadas (trocas de componentes, peças, fluidos, serviços etc.) para que o sistema construtivo tenha condições de atingir a vida útil para o qual foi projetado; (IV) aos procedimentos básicos necessários para a realização dessas atividades de manutenção, ainda que remetidos a profissionais ou empresas especializadas para essa finalidade; enfim, os manuais devem trazer as informações necessárias para possibilitar o correto uso do produto e a realização das atividades de manutenção.
Há uma norma técnica específica para orientar a elaboração de manuais de uso, operação e manutenção das edificações, que é a NBR 14037, que apresenta com mais detalhes os requisitos para a elaboração e apresentação do conteúdo dos manuais, como será adiante comentado.
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