MARCHA DAS VADIAS: CONEXÃO TORONTO-RECIFE

AutorDavi Barboza, Maria Eduarda Antonino
Páginas119-141
GÊNERO|Niterói|v.18|n.1| 119|2. sem.2017
MARCHA DAS VADIAS: CONEXÃO TORONTO-RECIFE
Davi Barboza1
Maria Eduarda Antonino2
Resumo: Este artigo faz algumas reflexões sobre o ativismo transnacional e o
uso de redes virtuais na contemporaneidade a partir da Marcha das Vadias. A
Marcha é abordada aqui com foco na (I) identidade do grupo, nas (II) maneiras como
promovem discussões e mobilizam pessoas e no (III) processo de transnacionalização.
Para a realização da pesquisa, houve um acompanhamento das fanpages da Marcha
de Toronto, onde o movimento surgiu, e de Recife - capital, de acordo com o Mapa
da Violência, de um dos Estados com maiores índices de feminicídios do Brasil.
Palavras-chaves: Marcha das Vadias; SlutWalk; ativismo transnacional; feminismo; facebook.
Abstract: This article makes some reflections on the transnational activism and
the use of virtual social networks in the contemporaneity from the SlutWalk. The
SlutWalk is approached here focusing on (I) the group’s identity, (II) the ways
in which they promote discussions and mobilize people and (III) in the process of
transnationalization. To carry out the research, there was a follow up of the fanpages of
SlutWalk Toronto, where the movement emerged, and Recife - capital, according to the
Map of Violence, from one of the states with the largest indexes of feminicides in Brazil.
Keywords: Marcha das Vadias; SlutWalk; transnational activism; feminism; facebook.
Introdução
A Marcha das Vadias (SlutWalk), movimento social que luta pelo espaço de
reconhecimento e liberdade das mulheres, é uma das expressões mais significativas
do feminismo contemporâneo. A Marcha, que teve a sua primeira manifestação
em abril de 2011, em Toronto, Canadá, originou-se em contraponto ao discurso
do policial Michael Sanguinetti (MCNICOL, 2012) de que as mulheres poderiam
evitar ser estupradas se não se vestissem comosluts - termo que no português
pode ser traduzido para “vagabundas”, “putas” ou “vadias” (RUSH, 2011). Em
protesto a esse ato, e devido a pessoas de outras regiões do globo se identificarem
1 Doutorando em Ciência Política na UFPE. E-mail: davi.barboza@hotmail.com.
2 Doutoranda em Ciência Política na UFPE. E-mail: duda.antonino@gmail.com.
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com tal reivindicação/pauta – fator essencial para a viabilidade da ação coletiva
(MELUCCI, 1996), a Marcha rapidamente se espalhou pelo mundo com outras
denominações: Marcha das Galdérias/Ordinárias, em Portugal, Marche des
Salopes, França, SlutWalk, em países de língua inglesa, e Marcha de las Putas, na
Espanha e em países de língua espanhola (GALETTI, 2014). A transnacionalização
aconteceu através de dinâmicas de comunicação em rede.
No Brasil, o movimento cresceu principalmente com ênfase no enfrentamento
à violência doméstica e, em 2012, mais de 20 cidades organizaram a primeira
“Marcha Nacional das Vadias”, percorrendo capitais como Brasília, Salvador,
Fortaleza, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte, Recife e Vitória.
Nesses protestos, mulheres foram às ruas vestidas como “vadias” - de salto alto,
roupas provocantes, fantasias sexuais, lingeries etc. - para protestar contra a
crença de que mulheres que são vítimas de estupro são responsáveis pelo crime.
Diante do crescimento e relevância da Marcha no mundo e no Brasil, o intuito
deste estudo é compreender de forma mais completa como se dá o ativismo
transnacional da Marcha das Vadias. Para isso, o presente trabalho acompanhou
durante quatro meses a fanpage oficial da Marcha de Toronto, onde o movimento surgiu,
e realizou comparações de ações, discursos e formas de mobilização com a Marcha de
Recife, também pela fanpage oficial do coletivo. Dessa forma, criou-se uma linha de
análise de dois grupos (em relação a aspectos sociais, geográficos e políticos) que têm
em comum o desejo de transformar a realidade machista, que é global.
Assim, a pergunta que norteia todo este trabalho é: quais as principais
semelhanças e diferenças entre as Marchas do Recife e Toronto no que se refere
à identidade desses movimentos e às formas de atuação? Para respondê-la, dois
objetivos específicos/caminhos foram traçados e aplicados. O primeiro foi (a)
investigar aspectos que caracterizam as Marchas de Toronto e Recife, identificando
como esses grupos se definem (o discurso deles) e quais as principais pautas propostas
em suasfanpages; o segundo foi (b) analisar as postagens das duas páginas com ênfase
na dinâmica e nas formas sugeridas de mobilização (estratégias). Para auxiliar essa
análise das fanpages uma ficha pré-codificada3 foi utilizada – contemplando aspectos
como (I) o tema dos posts, (II) o número de postagens no período acompanhado, (III)
3 Outra maneira de levantar informações de fanpages é utilizando softwares como o R ou o Netvizz.
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