Pregão - Limitação ao âmbito da União - Inconstitucionalidade manifesta - Dever de extensão imediata a todas as unidades da Federação

AutorProf. Elísio Augusto Velloso Bastos
CargoProfessor da Escola Superior de Administração Fazendária.
Páginas1-16

Professor da Escola Superior de Administração Fazendária. Procurador do Estado do Pará.Pós-Graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Estácio de Sá - RJ. Pós-Graduando em Direito Tributário pela Universidade Estácio de Sá - RJ. Advogado.

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1. Introdução

De há muito sabem, com maior nitidez, os que atuam na área jurídica a verdadeira compulsão legislativa adotada por nossas autoridades com o mister de resolver problemas de diversas ordens.

Promove-se, então, uma verdadeira e veloz alteração, nem sempre para melhor, em nossos institutos jurídicos antes mesmos que estes possam ter a chance de ser utilizados em todo seu potencial. Se há falhas neste ou naquele processo, se houve danos neste ou naquele procedimento, busca-se alterar o texto normativo que lhe dá sustentação, para que o dano ou as falhas possam cessar. Page 2

Todavia, observamos que as mesmas falhas, os mesmos danos, por vezes com outra roupagem, voltam a ocorrer mesmo em face das novas modificações, e, assim, altera-se a lei novamente na eterna busca pelo ordenamento jurídico perfeito, e, novamente, com a leve e refrescante sensação de que algo está sendo feito.

Pouco se percebe que o grande problema das leis não está em sua fonte, mas sim em seu destinatário, em seu intérprete, nos profissionais ou burocratas a quem cabe o nobre mister de efetivar e cristalizar seu conteúdo.

Exemplo nítido de tal experiência encontramos nos procedimentos que envolvem a contratação de bens ou serviços pela administração pública, onde as grandes falhas causadoras dos maiores danos ao erário público são, certamente, originadas da deficiente aplicação dos textos normativos correlatos e, em especial, da lei 8.666/93.

Peca-se, ainda hoje, muitíssimo não só na fase externa da licitação, mas, e mormente, na fase interna 1, onde há, em grande quantidade de casos, uma deficiente definição do objeto a ser licitado, e na fase de execução do contrato, onde a fiscalização por parte da administração pública é, em muitos casos, deficitária e, por vezes, inexistente.

Assim, mais uma vez2 buscou-se alterar a chamada lei geral de licitações e contratos administrativos, desta feita para criar uma nova modalidade de licitação denominada pregão, a qual estaria, em face de interpretação literal de dispositivos dos textos normativos que tratam da matéria, restrita ao âmbito da União.

Parece-nos, entretanto, que a mudança, na prática, foi positiva, isto se pudermos olvidar por um curto período de tempo que seja, a forma obtusa com que foi colocada no mundo jurídico, e esta é a missão mais árdua para os que pensam que os fins nem sempre justificam os meios, especialmente quando se trata do cumprimento de dispositivos constitucionais.

2. Delimitação do tema

O presente estudo terá por objetivo principal a análise da possibilidade da utilização, imediata, pelos demais Entes Políticos Federais da nova modalidade de licitação, denominada pregão. Page 3

Isto porque tanto os arts. 1º, caput, e 2º, caput, da Medida Provisória No. 2.182, que, em 23 de agosto passado recebeu sua 18ª reedição, quanto os arts. 1º e 3º, caput, do Regulamento Federal aprovado pelo Decreto No. 3.555, de 08/08/2000, que trata desta nova modalidade almejam, se procedermos a interpretação literal, limitar sua incidência tão somente ao âmbito da União.

Tal limitação de tema, imperiosa sob o enfoque científico que aqui se almeja fazer, ao ponto em que nos exige uma rápida reflexão sobre as vantagens de tal procedimento, em cotejo com as demais modalidades previstas no art. 22, da Lei 8666/93 3, não nos permite abordar, ao menos amiúde, outros questionamentos de ordem constitucional que brotam já do instrumento legislativo que conduziu o pregão ao ordenamento jurídico brasileiro 4.

3. Vantagens na utilização do pregão

Temos por relevante a abordagem deste tópico no presente estudo tendo em vista que, quanto maiores as vantagens cristalizadas com a adoção do pregão, maior o interesse dos Estados, Municípios e Distrito Federal, em se utilizarem, de pronto, de tal modalidade.

De início cabe frisar a considerável economia de tempo, e, quase sempre por via de conseqüência, de custos, com a adoção deste procedimento. Tal economia de tempo5 deve-se a vários fatores tais como a redução de prazos, o maior grau de informalismo e, principalmente, a inversão das fases procedimentais, sendo que a habilitação será feita após a abertura e classificação das propostas. Page 4

A economia de custos 6 também pode ser obtida com a possibilidade de disputa verbal e direta entre os licitantes, e a realidade obtida com a prática do pregão tem demonstrado resultados surpreendentes neste sentido.

Somente na ANATEL, no universo de 52 licitações celebradas entre 1998 e 1999, obteve-se uma redução de 34% nos preços inicialmente propostos pelos licitantes, sendo que tal Agência esperava gastar R$36,4 milhões na execução dos contratos advindos destes 52 pregões, que receberam proposta de R$36,5 milhões por parte dos fornecedores ou prestadores.

Ao cabo de tais licitações, e após as fases de lances verbais, tais valores, entretanto, totalizaram R$27,1 milhões, ou seja, R$9,3 milhões abaixo das estimativas iniciais da ANATEL 7.

É bem verdade que tais dados estatísticos, como qualquer outro, podem ser alterados ou distorcidos, todavia é imperioso constatar que a sistemática do pregão, certamente, induz uma real possibilidade da administração pública obter melhores preços em face do contato direto e imediato com o fornecedor e, mormente, em face da possibilidade da disputa direta e de viva voz entre os participantes do certame.

Outra vantagem passível de ocorrer através da adoção do pregão é o aumento da competitividade entre os licitantes, tendo em vista a redução da documentação necessária para participar do certame, eliminação de certos ritos, isto para ficar, tão somente, no pregão presencial, sem falar-mos no eletrônico.

Outro fator que nos parece ser de elevada importância é a possibilidade desta nova modalidade, em face das vantagens supra mencionadas, em especial da simplicidade, agilidade e economicidade, ser responsável por uma verdadeira redução na elevada8 quantidade de contratações celebradas por Page 5 dispensa e inexigibilidade de licitação 9.

Estas, a nosso ver, as maiores e consideráveis vantagens algumas já constatadas, outras passíveis de ocorrer através da utilização escorreita desta nova modalidade de licitação. Tais vantagens, sem dúvida, fazem nascer ou aumentar o grande interesse dos demais Membros da Federação em utilizá-la. Seria isto, atualmente possível ?.

Esta é a pergunta que passaremos a responder doravante.

4. A possibilidade dos estados, municípios e distrito federal utilizarem o pregão a quando da realização de certame licitatório

Chegamos ao ponto fulcral do presente estudo, no sentido de que aqui desenvolveremos, de forma mais específica, a questão acerca da possibilidade dos demais Entes Federados se utilizarem do pregão na contratação de obra e serviços, antes, porém, mister relatar, de forma bastante panorâmica, como a melhor doutrina vem tratando a matéria.

4. 1 - Síntese de posições doutrinárias acerca do tema

Em verdade a doutrina pátria diverge sobre a presente questão, ora sustentando a possibilidade de extensão desta nova modalidade aos Estados, Municípios e DF, ora negando tal possibilidade. Vejamos alguns destes posicionamentos doutrinários:

Para MARCELLO RODRIGUES PALMIERI 10, não é possível a imediata utilização, por parte dos outros Entes Políticos Federais, sem que haja a alteração, por parte da MP que instituiu o pregão, do art. 22, da Lei 8666/93, inserindo, portanto, de forma expressa, uma nova modalidade de licitação. Enquanto isto não for feito, a MP supra mencionada não pode ser considerada norma geral e, portanto, não poderá ser estendida aos Estados, Municípios e DF.

Tal posicionamento, de igual modo, é adotado e sustentado11 pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e gestão, através de sua Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação. Page 6

CARLOS COELHO MOTTA 12 também nega a possibilidade de aplicação do pregão pelos demais Entes Federados, pelo menos até que a MP seja convertida em Lei, passando, apenas a partir daí, a ser norma transitiva direta, imediatamente extensiva a todos.

Admitindo a extensão do pregão e utilizando-se de argumentos interessantes, TOSHIO MUKAI 13 entende que modalidade de licitação não é norma geral, eis que se trata de procedimento licitatório, que refere-se a norma particular, de minudência operativa. Em sendo assim, afirma que os demais Entes Políticos Federativos podem criar, no âmbito de suas competências, por via de lei, e com fulcro no art. 37, XXI, da CF/88, a modalidade licitatória ora sob comento.

Em acurada análise, JESSÉ TORRES PEREIRA JÚNIOR 14, afirma que a MP que instituiu o pregão no âmbito da União é norma geral, e como tal pode ser utilizada, porém não de forma compulsória, pelos Estados, Municípios e DF, os quais poderão, de igual modo, editar regulamentos com "pormenores procedimentais", desde que não conflitantes com o texto da MP 2182/00. Tal posicionamento é compartilhado por GINA COPOLA 15.

Para o...

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