MC 14.561/BA e o princípio da intervenção mínima na atividade empresarial: a intervenção judicial na empresa como medida executiva atípica, mas excepcional e subsidiária, para efetivação de decisões estruturais

AutorFredie Didier Jr. e Rafael Alexandria de Oliveira
Páginas249-265
MC 14.561/BA E O PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO
MÍNIMA NA ATIVIDADE EMPRESARIAL:
A INTERVENÇÃO JUDICIAL NA EMPRESA COMO
MEDIDA EXECUTIVA ATÍPICA, MAS EXCEPCIONAL
E SUBSIDIÁRIA, PARA EFETIVAÇÃO DE DECISÕES
ESTRUTURAIS1
Fredie Didier Jr.
Pós-doutorado pela Universidade de Lisboa. Livre-docente pela USP. Doutor em
Direito pela PUC/SP. Mestre em Direito pela UFBA. Professor-associado da Univer-
sidade Federal da Bahia, nos cursos de graduação, mestrado e doutorado. Membro
da Associação Internacional de Direito Processual, do Instituto Iberoamericano de
Direito Processual, do Instituto Brasileiro de Direito Processual e da Associação Norte
e Nordeste de Professores de Processo. Advogado e consultor jurídico.
Rafael Alexandria de Oliveira
Mestre em Direito Público (UFBA). Especialista em Direito Processual Civil (Fac. Jorge
Amado/JusPodivm). Membro da Associação Norte e Nordeste de Professores de Pro-
cesso (ANNEP). Procurador do Município do Salvador/BA. Advogado.
1. O JULGAMENTO DA MC 14.561/BA: A INTERVENÇÃO JUDICIAL NA
GESTÃO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA É MEDIDA EXCEPCIONAL
Há importante – e antigo – precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
que está assim ementado:
Medida cautelar. Pedido de atribuição de efeito suspensivo a recurso em mandado de segurança.
Afastamento de sócio majoritário da administração da sociedade.
– Enquanto pende de decisão, na Corte Especial do STJ, a pacicação quanto ao cabimento de
mandado de segurança para impugnar a decisão que indefere o pedido de efeito suspensivo
formulado em agravo de instrumento (decisão essa reputada irrecorrível pela nova redação do
art. 527 do CPC), convém, nos pedidos de medida liminar, manter o posicionamento anterior da
Terceira Turma, no sentido do cabimento da medida.
– As discussões judiciais acerca administração de sociedades limitadas deve caminhar, via de
regra, não para a intervenção judicial na empresa, que só ocorrerá em hipóteses excepcionais,
mas para a responsabilização do administrador improbo, para a anulação de negócios especí-
cos que prejudiquem a sociedade ou, em última análise, para a retirada do sócio dissidente ou
dissolução parcial da empresa.
1. Este artigo é resultado do grupo de pesquisa “Transformações nas teorias sobre o processo e o direito
processual”, vinculado à Universidade Federal da Bahia e cadastrado no Diretório Nacional de Grupos de
Pesquisa do CNPq (dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/7958378616800053). Esse grupo é membro fundador da
“ProcNet – Rede Internacional de Pesquisa sobre Justiça Civil e Processo contemporâneo” (http://laprocon.
ufes.br/rede-de-pesquisa).
EBOOK COLETANEA EXECUCAO.indb 249EBOOK COLETANEA EXECUCAO.indb 249 04/11/2021 10:56:3204/11/2021 10:56:32
FREDIE DIDIER JR. E RAFAEL ALEXANDRIA DE OLIVEIRA
250
– A atuação do Poder Judiciário em causas que versem sobre a administração das sociedades
deve pautar-se sempre por um critério de intervenção mínima. A Lei permite o afastamento de
sócio majoritário da administração da sociedade, mas isso não implica que ele perca os poderes
inerentes à sua condição de sócio, entre os quais está o poder de nomear administrador. Todavia,
na hipótese em que o sócio separou-se de sua ex-esposa, sem elementos que deem conta da
realização de partilha, todo o patrimônio do casal permanece em condomínio pró-indiviso, de
modo que é razoável a interpretação de que a ex-esposa é detentora de direitos sobre metade das
quotas detidas pelo marido. Isso, em princípio, retira do sócio afastado a maioria que lhe permitiria
a nomeação de novo administrador.
– Com isso, a melhor solução para a hipótese dos autos é a manutenção da decisão recorrida.
Medida liminar indeferida, com as ressalvas acima.
(STJ, Terceira Turma, MC 14.561/BA, rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 16.09.2008, DJe 08.10.2008)
O caso subjacente versava sobre a administração de sociedade por quotas limitadas.
Havia uma disputa entre o sócio majoritário, detentor de 70% das quotas sociais, e a
sócia minoritária, detentora de 30% das quotas sociais. A pedido desta última, o juízo
de primeira instância afastou, provisoriamente, o sócio majoritário da administração
da sociedade, mantendo apenas a sócia minoritária no exercício dessa função.
O sócio majoritário interpôs agravo de instrumento, mas lhe foi negado o efeito
suspensivo. Contra essa decisão, tomada ainda na vigência do Código de Processo
Civil de 1973, quando não havia previsão de recurso contra o indeferimento de efeito
suspensivo em agravo de instrumento (CPC-1973, art. 527, III e parágrafo único),
impetrou mandado de segurança.
O mandado de segurança foi liminarmente indeferido pelo tribunal local, o
que levou o sócio majoritário a interpor agravo interno. Mantida, pelo colegiado,
a decisão de indeferimento da petição inicial, o sócio majoritário interpôs recurso
ordinário ao STJ e, objetivando dar ao recurso efeito suspensivo, def‌lagrou medida
cautelar, distribuída para a Terceira Turma do STJ.
O STJ, em decisão colegiada, negou o efeito suspensivo pretendido, mas registrou
importante premissa para o julgamento de casos semelhantes: “o princípio que deve
nortear o julgador em todas as ações [que] versem sobre administração de sociedades
é o da intervenção mínima”.
Na sequência, assim dispôs:
Quanto à sociedade, decidem seus sócios. O destino do empreendimento a eles pertence. São
eles que decidem o montante do capital social, os investimentos a serem feitos na consecução dos
ns sociais, o objeto da sociedade e a forma de sua administração. Essa regra vale para quaisquer
tipos societários, desde as sociedades não personicadas, até as sociedades por ações.
Nos termos do acórdão em análise, a interferência judicial na vida societária,
especialmente em seus atos de gestão, embora possível, deve ser algo restrito a situ-
ações extremas – algo excepcional, pois.
O efeito suspensivo buscado foi negado por uma questão circunstancial, ape-
nas. Nos termos da decisão, “não há elementos que permitam concluir de maneira
EBOOK COLETANEA EXECUCAO.indb 250EBOOK COLETANEA EXECUCAO.indb 250 04/11/2021 10:56:3204/11/2021 10:56:32

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT