Minas--Rio Project: impacts, violations, conflicts and struggles: Interview with Ana Costa e Eduardo Barcelos /Projeto Minas--Rio: impactos, violacoes, conflitos e lutas: Entrevista com Ana Costa e Eduardo Barcelos.

Autorde Melo, Ana Ines Simoes Cardoso
CargoENTREVISTA - Entrevista

Tendo em vista a tematica "Lutas, Cidadania e Direitos Humanos", proposta para o dossie desta edicao n. 34 da Em Pauta: teoria social e realidade contemporanea, convidamos os pesquisadores Ana Costa e Eduardo Barcelos para compartilharem sua experiencia junto ao "Projeto Minas-Rio", tratando dos impactos socioambientais vis-a-vis a sua implantacao.

Consideramos, em especial, a importancia de conhecer e socializar a agenda dos sujeitos sociais e coletivos envolvidos, em torno da discussao e mobilizacao frente as questoes socioambientais vinculadas ao desenvolvimento dos "grandes empreendimentos" e sua incidencia sobre as condicoes e modos de vida das populacoes direta e/ou indiretamente envolvidas.

Temos por referencia na proposicao desta entrevista as relacoes entre as lutas sociais e os direitos humanos, aqui explicitados em sua relacao com a experiencia do projeto ao qual nossos (as) entrevistados (as) se vinculam e que se relacionam com as politicas de desenvolvimento implementadas e implantadas em nosso pais no atual contexto da sociedade brasileira.

Com a palavra, portanto, os nossos entrevistados....

Em Pauta--Incialmente, solicitamos que comentem os antecedentes deste projeto, suas motivacoes e vinculos com os diferentes sujeitos envolvidos. Ana Costa--Esse processo vivenciado junto aos camponeses e pescadores do Acu iniciou-se, em 2010, com as preocupacoes identificadas pelos assentados da reforma agraria do maior assentamento do Estado do Rio de Janeiro, o Zumbi dos Palmares/MST, quando noticiado, na imprensa local, que a duplicacao da BR-101, a chamada variante da BR, cruzaria, a leste da cidade de Campos, as terras da antiga Fazenda Sao Joao, hoje pertencentes ao assentamento.

Os assentados, entao preocupados com esta noticia e ao mesmo tempo com os impactos provocados pela LLX, empresa responsavel pela implementacao do Complexo Industrial-Portuario do Acu, em Sao Joao da Barra se mobilizam. Naquele momento, a implantacao do complexo ja estava atingindo de forma violenta os camponeses e pescadores do Acu. Em funcao das obras do corredor logistico e da mudanca do tracado da BR 101, que entao passaria dentro do Zumbi dos Palmares, um conjunto de familias das areas acima citadas procuraram a Associacao dos Geografos Brasileiros (AGB) e a Universidade Federal Fluminense (UFF) de Campos, por intermedio da sua Coordenacao de Extensao, solicitando espaco para se reunirem e tambem apoio em suas lutas.

Essa mobilizacao envolveu um conjunto de entidades, dentre elas, outras Universidades; sindicatos de trabalhadores; movimentos sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); a Comissao Pastoral da Terra (CPT) e a Associacao de Produtores e Imoveis do Municipio de Sao Joao da Barra (ASPRIM). Esta ultima, criada tambem em 2010 buscou reunir as familias em resistencia as obras do porto, desde pequenos agricultores, comerciantes, pescadores artesanais e moradores do Acu/V distrito de Sao Joao da Barra/RJ. Eles buscavam garantir suas reivindicacoes e fortalecer a luta que, naquele momento se conformava pelo conflito socioambiental, envolvendo a destruicao da restinga e a iminencia das desapropriacoes. Os encontros entre essas organizacoes foram fundamentais para dar visibilidade as questoes trazidas pelos assentados, que tem uma trajetoria de mais de quinze anos de organizacao e conquistas importantes na regiao. Buscou-se formar, assim uma rede de resistencias e denuncia aos impactos e efeitos profundos causados pelo Porto.

Esses encontros contribuiram para a ampliacao dos sujeitos coletivos envolvidos com as questoes e demandas por eles ali trazidas e discutidas, como a violencia e violacoes que estavam sofrendo e para que tivessem mais visibilidade. Tambem contribuiram para que as Universidades deixassem de ser apenas interlocutoras a distancia desses camponeses, pescadores e suas familias e atuassem mais diretamente. Esse foi o caso de alguns pesquisadores da UFF de Campos, que realizaram as suas primeiras aproximacoes aquele territorio, denominado de Acu e consequentemente aos seus moradores atingidos pelos impactos sociais, economicos, ambientais, do megaempreendimento.

Em Pauta--Voces poderiam apresentar uma caracterizacao do Projeto Minas-Rio e de sua implementacao.

Eduardo Barcelos--O Projeto Minas Rio e considerado o maior projeto minero-portuario do mundo. Ele preve a exploracao de 26 milhoes de toneladas anuais de minerio de ferro em Conceicao do Mato Dentro e Alvorada de Minas, ambos localizados na Serra do Espinhaco, em Minas Gerais; um mineroduto de 525 km de extensao para o escoamento do minerio, cruzando 32 municipios de Minas e do Rio de Janeiro; um terminal portuario privativo de uso misto para cargas solidas e semissolidas, o chamado Porto do Acu e um distrito industrial na retroarea do porto, ambos em Sao Joao da Barra/RJ. Trata-se, na verdade de um grande projeto de integracao regional-global que unifica a cadeia ferro--aco, a industria pesada e o setor de petroleo e gas. E um projeto intersetorial e transnacional voltada a exportacao e a economia global de commodities (minerio, petroleo, aco). Sua implantacao teve inicio no ano de 2006, a partir do licenciamento ambiental e dos atos desapropriatorios dos governos de MG e RJ, embora seja mais antigo a intencao de se implementar o Projeto. A implantacao, desde o inicio foi marcada pela ausencia de dialogo com os moradores dos territorios das montanhas em Conceicao de Mato Dentro e dos municipios proximos, assim como com os moradores dos mares em Sao Joao da Barra e especificamente do Acu. O empreendimento foi licenciado de forma fragmentada, ora pelo orgao federal, ora pelos orgaos estaduais de meio ambiente, levando especificamente a vulnerabilizacao da avaliacao de impactos, em especial aqueles de carater cumulativo e de sinergia. Ao passo da continuidade das obras, a implantacao se deu com a atuacao da forca policial, das intimidacoes das empresas de seguranca privada, sobretudo durante as desapropriacoes e da destruicao generalizada das restingas, no Acu, e da Serra da Ferrugem, em Conceicao do Mato Dentro.

Em Pauta--Os grandes empreendimentos estao relacionados as politicas de desenvolvimento implementadas por parte do Estado brasileiro. Em relacao a este projeto, especificamente, como voces vem o seu significado em relacao ao desenvolvimento economico regional e nacional?

Ana Costa--Enquanto os representantes do capital comemoram, do outro lado, trabalhadores e atingidos pelas violacoes e violencias provocadas por estas empresas so tem a denunciar e lamentar a devastacao da natureza, a expropriacao de seus instrumentos de trabalho, como a terra de cultivo para a maioria deles, a poluicao das aguas potaveis, a mortandade de peixes, a destruicao de um modo de vida, que tem na terra, nos rios e na natureza de um modo geral, suas referencias, o adoecimento e morte dessas pessoas que convivem no seu dia a dia com o sequestro de suas perspectivas e projetos de vida. Tudo isso em nome do processo de acumulacao capitalista vigente, que alguns ainda insistem em chamar de progresso, de desenvolvimento.

Este "modelo" de desenvolvimento que viola todo o tipo de direitos, sobretudo os direitos humanos, e decorrencia de um sistema que produz e reproduz desigualdade e que tem na transformacao da terra em mercadoria e, por conseguinte na sua concentracao, uma de suas determinacoes centrais, dele decorrem alguns desafios.

Um deles e entender que essa concepcao, em que a negacao e violacao dos direitos humanos na implementacao desses...

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