O modelo brasileiro de assistência jurídica estatal gratuita

No Brasil, o legislador constituinte fez a adoção expressa do salaried staff model, incumbindo a Defensoria Pública de realizar a assistência jurídica integral e gratuita dos necessitados (artigo 134 da CF).

Com isso, formalizou-se a opção pela criação de organismo estatal destinado à prestação direta dos serviços jurídico-assistenciais, com profissionais concursados, titulares de cargos públicos efetivos e remunerados de maneira fixa diretamente pelo Estado, sob regime de dedicação exclusiva (artigo 134, parágrafo 1º, da CF).

Embora custeada por recursos públicos, a Defensoria Pública encontra-se desvinculada dos poderes estatais, podendo livremente exercer os serviços de assistência jurídica gratuita aos necessitados, “inclusive contra as Pessoas Jurídicas de Direito Público” (artigo 4º, parágrafo 2º, da LC 80/1994). Com isso, resta assegurada a independência funcional do defensor público na tomada de decisões polêmicas e protegida a instituição de ataques políticos nos casos mais controversos.

Além disso, o artigo 134 da CF c/c artigo 4º, VII, VIII, X e XI, da LC 80/1994 c/c artigo 5º, II, da Lei 7.347/1985 permitem que a Defensoria Pública exerça a mais ampla defesa dos interesses das pessoas necessitadas enquanto classe, estando a instituição legitimada a propor ações coletivas, na sua mais ampla concepção (ação civil pública e ação coletiva).

De acordo com o artigo 4º, parágrafo 5º da LC 80/1994, o serviço jurídico-assistencial gratuito mantido pelo poder público deverá ser exercido com exclusividade pela Defensoria Pública, sendo vedada qualquer outra forma de custeio ou fornecimento de assistência jurídica estatal. Nesse sentido, inclusive, já teve a oportunidade de se manifestar o Supremo Tribunal Federal, durante o julgamento da ADI 4.163/SP, in verbis:

É dever constitucional do Estado oferecer assistência jurídica gratuita aos que não disponham de meios para contratação de advogado, tendo sido a Defensoria Pública eleita, pela Carta Magna, como o único órgão estatal predestinado ao exercício ordinário dessa competência. Daí, qualquer política pública que desvie pessoas ou verbas para outra entidade, com o mesmo objetivo, em prejuízo da Defensoria, insulta a Constituição da República (STF – Pleno – ADI 4.163/SP – relator min. Cezar Peluso, decisão: 29/2/2012)[1].

Seguindo a mesma linha de raciocínio, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade da LE/RS 8.865/2006, que previa a obrigação de a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte prestar serviço de assistência judiciária durante os finais de semana aos necessitados presos em flagrante delito. Além de violar a autonomia universitária (artigo 207 da CF), a referida lei estadual previa o pagamento de remuneração para o estudante que prestasse assistência judiciária durante o plantão, violando as diretrizes traçadas pela Constituição Federal no que tange à destinação de recursos à Defensoria Pública como instituição responsável pela prestação da assistência jurídica estatal gratuita. De acordo com o voto proferido pelo relator, ministro Dias Toffoli, in verbis:

“O escopo da legislação [LE/RS nº 8.865/2006] é o suprimento parcial da deficiência do poder público em assegurar aos hipossuficientes o direito à assistência judiciária integral e gratuita (art. 5º, LXXIV, CF/88) e o amplo acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, CF/88). Desse modo, ao invés de o Poder Público desempenhar esse dever fundamental por intermédio da Defensoria Pública, a teor do art. 134 da Constituição Federal, procurando, ao máximo, mitigar as deficiências dessa instituição permanente e essencial à Justiça, o legislador potiguar, em substituição, impôs, nos casos de ausência de defensor público constituído, que essa atividade fosse desempenhada por estudantes da universidade estadual, a qual, frise-se, tem por objetivo precípuo as atividades de ensino superior, mas que, aos finais...

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