Modelos alimentares e arranjos produtivos no Vale do Ribeira Paranaense: um estudo sobre os princípios da soberania alimentar

AutorRubia Carla Formighieri Giordani - Daniela Ferron Carneiro - Maisa Santos - Alessandro Donasolo
CargoDoutora em Sociologia pela Universidade Federal do Paraná - Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Segurança Alimentar e Nutricional da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil - Mestranda em Ciência do Solo pela Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil - Engenheiro Agrônomo pela Universidade Federal do Paraná
Páginas156-179
http://dx.doi.org/10.5007/1807-1384.2015v12n2p156
Esta obra foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição 3.0 Não
Adaptada.
MODELOS ALIMENTARES E ARRANJOS PRODUTIVOS NO VALE DO RIBEIRA
PARANAENSE: UM ESTUDO SOBRE OS PRINCÍPIOS DA SOBERANIA
ALIMENTAR
Rubia Carla Formighieri Giordani
1
Daniela Ferron Carneiro
2
Maisa Santos
3
Alessandro Donasolo
4
Resumo:
A relação que se estabelece entre os mecanismos de produção, organização social
e apropriação do espaço geográfico são fundamentais para a compreensão das
práticas alimentares no meio rural. Este artigo traz à luz destas considerações, um
estudo de caso sobre a soberania alimentar entre agricultores caboclos de uma
comunidade situada na área rural do Vale do Ribeira paranaense. O estudo
demonstrou uma relação entre os aspectos organizacionais e econômicos da
propriedade rural e a definição de certos modelos de consumo atestados pelas
possibilidades produtivas. As modificações no perfil de produção agrícola como a
redução do número de hortas, por exemplo, ou pouca variedade produtiva
implicaram na diminuição do consumo de legumes e verduras, leite e carnes. Notou-
se ainda certa monotonia alimentar em parte influenciada pela pouca diversidade na
produção de alimentos, com destaque para as frutas, verduras, raízes e cereais.
Palavras-Chave: Segurança alimentar. Agricultura familiar. Modelos alimentares.
Arranjos produtivos.
1 INTRODUÇÃO
Embora o ato alimentar seja uma necessidade humana básica imprescindível
à sobrevivência e reprodução da vida, o que se escolhe e se define como comestível
ultrapassa o papel biológico do alimento e o seu valor nutricional (FISCHLER, 1995).
A alimentação humana desencadeia processos e relações sociais que forçosamente
tem implicações simbólicas e sociológicas na vida humana (POULAIN, 2013). O ato
1
Doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Paraná e doutora em Etnologia pela Universi
Paris Ouest Nanterre, França. Professora do Departamento de Nutrição da Universidade Federal do
Paraná e pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Sociologia da Saúde/Universidade Federal do
Paraná-CNPq, Curitiba, PR, Brasil E-mail: rubiagiordani@gmail.com
2
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Segurança Alimentar e Nutricional da Universidade
Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil. E-mail: danifercarneiro@gmail.com
3
Mestranda em Ciência do Solo pela Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil. E-mail:
maisa_agro@yahoo.com.br
4
Engenheiro Agrônomo pela Universidade Federal do Paraná. Especialização em Educação do
Campo e Agricultura familar e camponesa pela Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil.
E-mail: adonasolo@hotmail.com
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R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.12, n.2, p.156-179, Jul-Dez. 2015
alimentar necessário à reprodução da energia da vida se repete infinitamente em
toda e qualquer sociedade, entretanto a seu modo, cada grupamento humano
desenvolve processos e concatena atividades com a finalidade nutricional (MINTZ,
2001).
Estas atividades, no caso específico das sociedades capitalistas, tem
evoluído historicamente para confluírem em cadeias produtivas cada vez mais
complexas contando a seu favor com a ciência e a técnica (HERNÁNDEZ, 2005;
PLOEG, 2008; RADOMINSKI, LEAL, 2011; FERREIRA, 2012). Na lógica deste
sistema, o valor do alimento, fetichizado, ultrapassa o valor de uso e todo o
dispositivo e a energia para movimentar as engrenagens do sistema fundamenta-se
na acumulação do capital (OLIVEIRA, 2002; CAMPOS, 2006; CAMPOS, CAMPOS,
2007).
A modernização conservadora no campo e a incorporação do capital
financeiro na agricultura (DELGADO, 2001, 2005) irão provocar progressivamente
intensas modificações territoriais - políticas e sociais -, sobretudo em camponeses
originários, como é o caso das populações caboclas. Esta face do capitalismo no
meio rural brasileiro, a partir da década de 1980, surgiu no modelo do agronegócio
normalmente associado a grande propriedade, à monocultura de commodities,
atrelando à produção um sofisticado conjunto de técnicas e conhecimentos que
envolvem genética e química biológica (ELESBÃO, 2007; MIRANDA ET AL, 2007;
WANDERLEY, 2011; RADOMINSKI, LEAL, 2011; FERREIRA, 2012). O que se
observa no espaço rural brasileiro é que este processo de territorialização do capital
e sua concentração implicaram em acirramento das desigualdades em muitas
regiões, especialmente para os agricultores camponeses descapitalizados e não-
tecnificados que mantiveram-se à margem deste processo (ELESBÃO, 2007;
MIRANDA et al, 2007; WANDERLEY, 2011). Segundo Delgado (2005, p. 68) na
“perspectiva do campesinato ou da agricultura familiar não integrada nas cadeias do
agronegócio - que opera fora de uma estratégia tipicamente capitalista” decorre o
aumento de sua “distância econômica e social entre esse setor e o agronegócio”
(p.69).
Contudo, a agricultura camponesa e familiar, contrasta em sua lógica contra-
hegemônica e os agricultores familiares resistem em cumprir o simples papel de elo

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