Multiculturalismo e a proteção dos direitos humanos

AutorThaysa Prado Ricardo dos Santos Karvat
CargoMestranda em Democracia e Direitos Fundamentais UNIBRASIL
Páginas231-250
MULTICULTURALISMO E A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
MULTICULTURALISM AND THE PROTECTION OF HUMAN RIGHTS
Thaysa Prado Ricardo dos Santos Karvat1
Resumo: O presente artigo tem como objetivo realizar uma análise sobre o c onceito de
multiculturalismo e suas críticas, discorr endo principalmente sobre a sua versão emancipatória. Busca-
se também efetuar u ma análise do multiculturalismo e a proteção dos dir eitos humanos que é imposta a
partir do momento e m que se observam diferent es práticas culturais e política s em um mesmo território
agravadas pelas condições impo stas pelo capitalismo e pela globalização. Por fim, será demonstrado um
caso prático, especialmente quanto à União Eur opeia, em que o governo buscou, visando a u ma
emancipação com a sociedade civil, criar u m rol de direitos a serem protegidos buscando o respeito e a
inserção a culturas marginalizadas que o pró prio sistema vem a criar.
Palavras chave: multiculturalismo, cidada nia global, direitos humanos, União Europeia.
Abstract: The present ar ticle seeks to analyze the concept of multiculturalism and its critics, exploiting
mainly its emancipator version. It also seeks to elaborate an analysis about the multiculturalism and the
protection of human rights that it’ s mandatory since the moment where several di fferent cultural
practices and polices are noticed in the same territory, also aggravat ed by the conditions imposed by the
capitalism and the globalization. In the conclusion, it will be demonstrated a practical case concerning
the European Union, where the g overnment established a charter of rights seeking the emancipation of
the civil society, and the respect and insertio n of marginalized cultures that the system it own creates.
Keywords: multiculturalism, global citiz enship, human rights and European Union.
1 INTRODUÇÃO
Hoje, a discussão s obre os Dir eitos Humanos vem se mostrando cada vez
mais presente como uma preocupação por todo o mundo, principalmente a partir da
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Sendo que, de acordo com
Sidney GUERRA, muitas lesões que são produzidas em relação aos direitos
humanos decorrem da globalização, a qual exige a eliminação das fronteiras
geográficas nacionais e difunde a modernização, a expansão econômica, política,
militar e t erritorial, fundindo ou destruindo identidades n acionais pela imposição
de governos e modos de produção, mundializando a cultura.2
Entretanto, o que se busca apontar é que a cultura, dentro do processo
integracionista, é um valor essencial para o sucesso de qualquer projeto, pois
apenas a partir do momento em que são r espeitadas as diferenças culturais entre os
povos, é que se pode admitir uma integração pautada em valores que r espeitem a
democracia e os direitos fundamentais.
Afirma Eduardo Biacchi GOMES que com a evolução do processo da
globalização, os valores culturais de determinada nação acabam se confundindo
com os valores de outros povos, pois estes passam a conviver dentro do mesmo
espaço. Neste momento, surgem as diferenças, sendo que os imigrantes, minorias
dentro daquela nação, a cabam não exercendo seus di reitos culturais demonstrando
uma clara violação à democracia e aos direitos fundamentais.3
1 Mestranda em Democracia e Direitos Funda mentais UNIBRASIL. Advogada em Prado Karvat
Advogados Associados. Professora na Faculdades do Brasil – UNIBRASIL , nas disciplinas de D ireitos
Humanos, Direito Internacional Público e Dir eito Constitucional. Email: thaysagp@yahoo.com
2 GUERRA, Sidn ey. Direitos humanos na ordem jurídi ca internacio nal e reflexos na ordem
constitucional brasileira. Rio de Janeiro: Lu men Juis, 2008.
3 GOMES, Eduardo Biacchi. União Europeia e Multiculturalismo. O diálogo entre a D emocracia e o s
Direitos Fundamentais. Curitiba: Juruá, 200 8. p. 15.
232 Direitos Culturais, Santo Ângelo, v. 5, n.8, p. 231-250, jan./jun. 2010
Assim, multiculturalismo, justiça multicultural, direitos coletivos,
cidadanias plurais são alguns dos termos criados que procurar relacionar as tensões
entre a diferença e a igualdade, entre a necessidade de reconhecimento da diferença
e de redistribuição que possibilitem a realização da igualdade.4
Em busca da paz e da igualdade, as nações com maior poderio econômico
e bélico, por vezes acabam usurpando de suas competências. Neste sentido,
importante se mostra contestar o próprio conceito de multiculturalismo quando este
utilizado com objetivo de promoção da emancipação entre os povos.
Esta relação entre os direitos humanos e o multiculturalismo implica novas
concepções de cidadania, a qual deve ser reconhecida em um patamar cosmopolita
baseada n o reconhecimento das diferenças culturais e na criação de incentivos e
políticas voltadas para a inserção das culturas marginalizadas e pela redução das
desigualdades.
2 MULTICULTURALISMO: ANÁLISE DE UM CONCEITO
De acordo com Boaventura de Souza SANTOS, originalmente, a
expressão multiculturalismo significava a coexistência de diversas formas culturais
ou de grupos que possuam culturas diferentes em uma sociedade. Entretanto, o
mesmo autor ressalta que o termo passou a ser considerado um “modo de descrever
as diferenças culturais em um contexto transnacional e global”.5
Para melhor compreender a expressão, cabe discorrer sobre o significado
de cultura, a qual, para este autor, possui duas principais concepções. A primeira
está diretamente ligada com as humanidades, definida como o que de melhor foi
pensado e produzido pela humanidade, pode ser considerado um conceito baseado
em critérios de valor, estéticos, morais ou cognitivos, que considerados universais,
demonstram a diferença cultural ou especificidade histórica daquilo que
classificam.6
A segunda concepção reconhece a pluralidade de culturas, “definido-as
como totalidades complexas que se confundem com as sociedades, permitindo
caracterizar modos de vida baseados em condições materiais e simbólicas”7
Esta segunda concepção estaria relacionada de forma mais direito ao
conceito de multiculturalismo, pois ambos permit em a existência de diversas
culturas n o mundo, podendo ainda considerar a possibilidade da coexistência de
diversas culturas no território de um mesmo Estado, e ainda, a relação que podem
ter diferentes culturas para além do Estado. Desta forma, cultura passa a possui um
significado amplo, no sentido de que as fronteiras de um Estado-nação ou o
território de uma sociedade, não são mais requisitos absolutos para a formação de
uma ou outra cultura.
Com o processo da globalização, este ideal nacional e este sentimento de
pertencimento são cada vez mais corrompidos visando a convivência de diversas
culturas e costumes sob o mesmo espaço territorial. Assim, com a diversidade
4 SANT OS, Boaventura de Souza. Reconhecer para Libertar. Os caminhos do cosmopolitismo
multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Bra sileira, 2003. p. 25.
5 N UNES, João Arriscado e SANT OS, Boaventura de Sousa. Introdu ção: para ampliar o cânone do
reconhecimento, da diferença e da igualdade. In: _____, SANTOS, Boaventura d e Souza. Reconh ecer
para Libertar. Os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2003. p. 26.
6 Idem, p. 27.
7 Idem, ibidem.

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