Multiprofessional residency in health and social work: dilemmas in formation and professional work/Residencia Multiprofissional em Saude e Servico Social: dilemas na formacao e trabalho profissional.

AutorSilva, Luciana da Conceicao e

Introducao

Neste artigo objetiva-se discutir a implementacao do programa de Residencia Multiprofissional em Saude (RMS) (1) no ambito do Sistema Unico de Saude (SUS), bem como a insercao do Servico Social, compreendido como uma importante categoria, protagonista do reforco para a perspectiva critica da Reforma Sanitaria na construcao das RMS. No entanto, esse momento de implementacao das residencias em saude, em suas diversas modalidades, esbarra em realidade avessa ao SUS e ao trabalho nesta area.

Partimos, assim, do pressuposto de que o contexto de implementacao das RMS no pais, diante das contrarreformas no SUS, e cercado pelo conflito entre os projetos em disputa na saude. Da mesma forma, pressupomos que o Servico Social--inserido nesse processo epermeado por tensoes e disputas-e uma profissao com potencial critico, capaz de contribuir para a formacao, de acordo com o projeto sanitarista.

Daremos especial atencao a politica de saude, pois analisaremos a construcao da politica de formacao de recursos humanos dentro do SUS, assim como os desafios e as possibilidades de fortalecimentodo perfil profissional voltado para o sistema, cujos principios basilares sao: cidadania, universalidade e integralidade. Fundamentais, estes principios se contrapoem a uma realidade de desresponsabilizacao do dever do Estado (expressa no atendimento as demandas sociaiscom consequente perda de direitos do cidadao) e de crescente focalizacao e fragmentacao das politicas.

Consideramos importante pesquisar os aspectos relacionados a formacao e ao trabalho em saude, na modalidade de residencia, a fim de compreender seus limites e possibilidades para o fortalecimento do SUS, dentro de uma realidade que, em contradicao ao modelo proposto por esse sistema, privatiza os servicos e focaliza as necessidades sociais da populacao. Nesse sentido, houve interesse em nos aproximar da particularidade da formacao em saude, nos moldes de Residencia Multiprofissional.

A RMS e uma modalidade de formacao com enfase pratica, desenvolvida em instituicoes que, apesar de sofrerem repercussoes diretastanto da crise na saude, quanto na educacao--, sao espacos potenciais para o ensino e a assistencia em saude, possuindo, como sujeito formador, os proprios profissionais que atuam nos servicos. Nesse contexto, cabem alguns questionamentos a respeito das iniciativas politicas do Ministerio da Saude (MS) para a formacao de profissionais de saude, tendo em vista o atual enfraquecimento da politica de saude, em contraposicao ao principio norteador da politica de formacao, que e o de fortalecer o SUS constitucional.

No atual contexto de fragilizacao da seguridade social brasileira e da proposta constitucional de 1988, encontramos acoes de resistencia por parte de sujeitos que ocupam essas politicas. Nesse sentido, na saude, alem da materialidade legal, com os principios que norteiam a propria politica de saude e que sao totalmente avessos a concepcao neoliberal, temos profissionais que trabalham no SUS e sao considerados intelectuais potenciais; promotores de pensamentos, acoes e proposicoes contra-hegemonicas a atual fase do capitalismo.

Assim, quando os profissionais estao envolvidos, tendo em vista as condicoes teoricas que dificultam a critica da administracao da coisa publica na sociedade capitalista, estes acabam tendo grande chance de reforcar as reformas neoliberais, contribuindo para fortalecer propostas de desmonte do Estado e de centralidade do mercado, como criterio de organizacao da sociedade, ou seja, propostas que enfraquecem e desqualificam o SUS.

Pensando nisso, todas as modalidades de Residencia em Saude sao especializacoes e devem pensar, criticar e propor sua correlacao com o desenvolvimento do sistema de saude em nosso pais. Diante do enfrentamento de uma politica de contrarreformas, a afirmacao de um projeto profissional e politico-pedagogico, voltado para uma formacao critica, reflexiva, teoricometodologica, tecnico-operativa e etico-politica, e de extrema importancia a formacao dos profissionais para o fortalecimento do SUS.

Consideramos que, no contexto avesso ao SUS universal e de qualidade, e como alternativa para resistir aos ditames do capital, e importante que se formem profissionais e/ou intelectuais criticos vinculados aos principios e diretrizes do SUS, para que a relativa autonomia reservada aos profissionais de formacao superior possa ser aproveitada a favor da luta pela saude coletiva. Entendendo o protagonismo dos intelectuais/profissionais da saude dentro da contradicao da sociedade, nesta pesquisa, os preceptores (profissionais formadores) serao os sujeitos-chave para a analise das expressoes de sua atuacao junto aos residentes, como um modo de interrogar o objeto de estudo por meio dos sujeitos que dele participam.

Dentre as profissoes envolvidas com a RMS, destaca-se a existencia consolidada do Servico Social, representando a terceira maior categoria em numero de bolsas financiadas pelo Ministerio da Saude (BRASIL, 2006, p. 15). Neste artigo, pretendemos tambem nos aproximar do Servico Social e das especificidades dessa categoria, na construcao do seu atual Projeto Etico Politico Profissional e dos desafios da materialidade na formacao e exercicio profissional. Compreendemos que a insercao do assistente social nas RMS se integra ao desafio de consolidacao da formacao e exercicio critico da profissao (o que, tambem, pode contribuir na formacao de profissionais de outras areas).

Perspectivas na politica de Saude: por que valorizar politicas de formacao de profissionais dentro do proprio SUS?

Os resultados da pesquisa de Vasconcelos (2010) (2) revelaram existir entre a maioria dos profissionais de saude um desconhecimento sobre o SUS, bem como um reforcodo modelo privatizante na saude e um afastamento dos espacos de controle social. Tendo em vista que estes profissionais, alem de atuarem no sistema, estao formando outros profissionais, a tendencia e que o que vem se reproduzindo seja um perfil profissional que desconhece a relevancia do SUS e seus espacos politicos. Dessa forma, esses profissionais podem nao se mostrar engajados na defesa da universalidade e da integralidade em saude, nao sendo capazes de democratizar, junto aos usuarios, informacoes para alem dos aspectos clinicos e biomedicos. Assim, segundo a pesquisa desenvolvida pela referida autora, ha uma fragilidade na formacao de profissionais que saibam fazer saude coletiva de protecao e promocao. Entretanto, a mesma pesquisa destaca uma particularidade na formacao dos assistentes sociais que pode influenciar no exercicio profissional.

Segundo os dados parciais da pesquisa, ao analisar a concepcao de saude dos profissionais, observou-se que a maioria das categorias e demais profissionais optam pelo conceito da Organizacao Mundial de Saude, enquanto que a maioria dos assistentes sociais referencia sua pratica com o conceito de saudedo projeto da Reforma Sanitaria (3). Os dados mostram que a concepcao de saude abstrata da OMS continua orientando a pratica de muitas profissoes, em detrimento da discussao sobre os determinantes sociais e economicos da saude. Excetuando a categoria dos assistentes sociais, verificamos que a maioria dos demais profissionais tomam como diretriz o conceito de saude ampliada, com base na Constituicao Federal de 1988.

Seguindo a mesma perspectiva, constatou-se, na pesquisa de Vasconcelos (2010), que 45% dos profissionais de outras categorias afirmam desconhecer a contribuicao do Movimento de Reforma Sanitaria. Isso significa, por conseguinte, que quase metade do total de entrevistados nao reconhecem a importancia deste movimento para a Saude brasileira, ao passo que entre a categoria dos assistentes sociais todos reconhecem o Movimento de Reforma Sanitaria como fundamental para a questao de saude no Brasil.

Em estudo (4) realizado no ambito do Nucleo de Estudo, Extensao e Pesquisa em Servico Social (Neeps/Uerj) (5), nota-se que a fratura que ocorre entre o exercicio profissional e as possibilidades de pratica critica existentes na realidade relaciona-se tanto com o ensino das profissoes de Saude (ja que em suas diretrizes curriculares ha um esvaziamento de conteudos essenciais para um projeto de profissao), quanto pela necessidade de ampliacao e fortalecimento da discussao sobre politicas publicas de Saude. A partir disso, observou-se ocorrer um discurso de louvacao do SUS, que nao altera a logica do ensino e as diretrizes curriculares das profissoes de Saude. Essas diretrizes, por sua vez, nao tendem a fortalecer o projeto de Reforma Sanitaria, mas se resumem a apontar conteudos genericos, focalizadores, gerando uma fragmentacao do ensino (AGUIARet al, 2008).

Nessa logica, este processodeixa de garantir conteudos minimos referentes a politicas sociais publicas de Saude, capazes de garantir um perfil profissional critico, formador de intelectuais e nao apenas de tecnicos. Dessa forma, a diversidade da formacao em Saude pode demonstrar as possibilidades e os limites dos profissionais para a realizacao de acoes que levem em conta, antes de tudo, os principios socializantes do SUS e as reais necessidades sociais de Saude da populacao.

A partir dos dados e reflexoes do relatorio da Conferencia Nacional de Recursos Humanos de 1993, assim como das diretrizes apresentadas pela Norma Operacional Basica de Recursos Humanos para o Sistema Unico de Saude (NOB/RH- SUS), verificou-se que o perfil dos profissionais formados nao e adequado o suficiente para uma atuacao na perspectiva da atencao integral a Saude e de praticas que contemplem acoes de promocao, protecao, prevencao, atencao precoce, cura e reabilitacao.

Uma das estrategias para o enfrentamento dessa constatacao foi implantacao de cursos de especializacao na area de Saude, direcionados ao fortalecimento de politicas publicas, pratica habitualmente utilizada pelo Ministerio da Saude. Nessa mesma linha, os cursos de especializacao e RMS foram concebidos para dar suporte...

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