Não-cumulatividade do ICMS e do IPI

AutorAndré Mendes Moreira
Páginas169-280
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VII
NÃO-CUMULATIVIDADE DO ICMS E DO IPI
7.1 A EFICÁCIA PLENA DA NÃO-CUMULATIVI-
DADE DO IPI E DO ICMS: DA EC Nº 18/65 AOS
DIAS ATUAIS
A não-cumulatividade tributária foi trazida à balha no Bra-
sil pelo vetusto Imposto de Consumo (IC) – antecessor do hodier-
no IPI – por meio da Lei nº 2.974/56. Restrita aos importadores, a
norma lhes permitia abater o valor do IC recolhido na importa-
ção do imposto devido pela venda de bens no mercado interno.
Quase dois anos depois, adveio a Lei nº 3.520/58, que am-
pliou o alcance da não-cumulatividade no IC ao permitir que
o industrial deduzisse do montante a pagar o valor do imposto
incidente sobre as matérias-primas utilizadas na produção.
As regras contidas nas Leis nºs 2.974/56 e 3.520/58 foram
mantidas na subsequente consolidação da legislação do IC,
operada pela Lei nº 4.502/64.
A Emenda Constitucional nº 18/65 extinguiu o Imposto
de Consumo, substituindo-o pelo IPI. Ao mesmo tempo, criou
o ICM,262 imposto que, tal como o IPI, nasceu não-cumulativo
262. À época da edição da EC nº 18/65, o ICM também podia ser cobrado pelos
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ANDRÉ MENDES MOREIRA
por determinação constitucional.263 Consoante a EC nº 18/65,
o quantum debeatur dessas exações seria obtido “abatendo-
-se, em cada operação, o montante cobrado nas anteriores”.
Entretanto, especificamente no caso do ICM, tal abatimento
se daria “nos termos do disposto em lei complementar”, pre-
visão inexistente para o IPI.
A Carta de 1967 manteve a não-cumulatividade do IPI264
e do ICM265 nos exatos termos da EC nº 18/65, sistemática que
permaneceu a mesma com a EC nº 1/69.266
Municípios, em alíquota não superior a 30% daquela posta pelos Estados.
263. A Emenda foi fruto da primeira grande reforma tributária no Brasil, que racio-
nalizou e sistematizou a tributação nacional. Vale conferir a seção dos “Impostos
sobre a Produção e a Circulação”:
“Art. 11. Compete à União o imposto sobre produtos industrializados.
Parágrafo único. O imposto é seletivo em função da essencialidade dos produtos, e
não-cumulativo, abatendo-se, em cada operação, o montante cobrado nas
anteriores.
Art. 12. Compete aos Estados o imposto sobre operações relativas à circulação de
mercadorias, realizadas por comerciantes, industriais e produtores.
(...)
§ 2º. O imposto é não-cumulativo, abatendo-se, em cada operação, nos termos do
disposto em lei complementar, o montante cobrado nas anteriores, pelo mesmo ou
por outro Estado, e não incidirá sobre a venda a varejo, diretamente ao consumidor,
de gêneros de primeira necessidade, definidos como tais por ato do Poder Executi-
vo Estadual.” (destaques nossos)
264. Art. 22, §4º, da CR/67.
265. Art. 24, §5º, da CR/67.
266. Assim predicava a EC nº 1/69:
“Art. 21. Compete à União instituir imposto sobre:
(...)
V – produtos industrializados (...);
(...)
§ 3º. O imposto sobre produtos industrializados será seletivo em função da essen-
cialidade dos produtos, e não-cumulativo, abatendo-se, em cada operação, o mon-
tante cobrado nas anteriores.” (destaques nossos)
“Art. 23. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
II – operações relativas à circulação de mercadorias, realizadas por produtores, in-
dustriais e comerciantes, impostos que não serão cumulativos e dos quais se abate-
rá, nos termos do disposto em lei complementar, o montante cobrado nas anteriores
pelo mesmo ou por outro Estado.” (destaques nossos)
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A NÃO-CUMULATIVIDADE
DOS TRIBUTOS
A previsão, constante de todos os textos constitucionais
até então, de que o abatimento do ICM se daria “nos termos
do disposto em lei complementar”, levou parte da doutrina a
sustentar que o legislador teria o poder de restringir o alcan-
ce da não-cumulatividade do imposto estadual.267 Já no caso
do IPI, segundo essa mesma corrente, tal medida seria inad-
missível, pois inexistia qualquer restrição constitucional à sua
não-cumulatividade, que seria norma de eficácia plena; já a
do ICM possuiria eficácia contida, admitindo restrições que
poderiam ser impostas pela lei complementar.
Com a devida vênia, não nos parece que seja assim. Da
leitura das normas constitucionais extrai-se que a não-cumu-
latividade sempre foi mandatória para o IPI e para o ICM. To-
davia, como este último exige lei complementar para manter
a unidade da legislação estadual em todo o País (haja vista a
competência dos 26 Estados-membros e do Distrito Federal
para sua instituição), as Constituições pretéritas atribuíam
ao legislador nacional (rectius, complementar) a tarefa de
disciplinar a não-cumulatividade. Contudo, essa delegação
nunca consistiu em uma faculdade para que o legislador im-
plementasse, se e quando quisesse, a não-cumulatividade do
imposto. Tratava-se de um comando peremptório, que devia
ser obedecido pela lei de normas gerais do ICM, sob pena de
inconstitucionalidade.
Corroborando nosso ponto de vista, a jurisprudência do Su-
premo Tribunal Federal, à luz das Cartas anteriores, equiparou
a não-cumulatividade do IPI à do ICM. Interplures, na Sessão
Plenária de 16 de dezembro de 1977, os Ministros do STF foram
unânimes ao afirmar que “o inciso II, do artigo 23 da Constitui-
ção [de 1967-69] estabelece, sem qualquer restrição, o princípio
267. BALEEIRO sustentava que, para o ICM, “o Congresso é livre de estabelecer o
modo e os casos de não-cumulatividade, desde que não o anule”, diferentemente do
IPI, “que não sofre restrições à não-cumulatividade”. (BALEEIRO, Aliomar. Direito
Tributário Brasileiro, 11ª ed. Atualizado por MISABEL ABREU MACHADO DER-
ZI. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 418).

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